quarta-feira, 29 de abril de 2009

Atualização

Waheeh Ali e Mohammed Shakil foram condenados a sete anos de prisão há pouco. Eles foram julgados culpados da acusação de conspiração contra a Grã-Bretanha e também por planejar frequentar campos de treinamento terroristas no Paquistão em 2007. 




Grã-Bretanha inocenta suspeitos de ataques de 2005

O julgamento de três suspeitos de terem participado dos atentados de 7 de julho de 2005 em Londres terminou. O resultado causou frustração aos parentes dos 52 mortos e 700 feridos nos ataques. O veredicto – dois considerados culpados por conspiração e que devem ser julgados novamente nesta quarta e mais um declarado inocente – trouxe decepção. A maior investigação da história da Grã-Bretanha até hoje deu água.

 

Acima de tudo, o caso deixa à mostra a enorme dificuldade apresentada por países ocidentais que ainda não aprenderam a lidar com esta categoria de crime hediondo. E, mais ainda, revela como tem sido difícil o embate judicial enfrentado quando se deve dar uma resposta concreta ao terrorismo.

 

Estados Unidos, Inglaterra e Espanha – somente falando de países ocidentais recentemente atingidos por ataques terroristas. Israel já é alvo há muito mais tempo – não sabem o que fazer com pilhas de documentos produzidos a partir das longas investigações. Ou melhor, não sabem como e a quem punir.

 

No caso específico da Inglaterra, três homens foram julgados. Todos conheciam os autores dos atentados e passearam com dois deles por Londres em dezembro de 2004. Mas dar uma volta pela cidade com alguém que mais tarde será um homem-bomba não configura crime. Pelo menos não a princípio.

 

As câmeras de segurança da capital inglesa – uma das cidades mais vigiadas de todo o mundo – flagraram o tal passeio. Além da Roda do Milênio (London Eye), eles estiveram no Museu de História Natural e no Aquário de Londres.

 

A questão é que o tour que os acusados qualificam apenas como um passeio inocente é interpretado de outra maneira pelos promotores; estes garantem que os três homens ajudaram os terroristas a pesquisar os melhores alvos para o ataque. No final das contas, um ônibus e estações do metrô foram os locais escolhidos para as bombas.

 

Está claro como água que a teoria da promotoria – que foi derrotada, diga-se de passagem – é a mais correta. Os acusados compartilham declaradamente da ideologia jihadista. Mais ainda, dois deles foram condenados por terem comprovadamente participado de treinamentos militares comandados por terroristas no Paquistão. 

 

A viagem aconteceu justamente em companhia de Mohammad Sidique Khan, um dos homens-bomba responsáveis pelos ataques de 2005. Prova irrefutável de participação no ataque? Para o júri britânico, não.

 

Enquanto o ocidente continuar a dar veredictos como este, os grupos internacionais de promoção da cruzada fundamentalista terrorista terão terreno fértil por muito tempo. E vão continuar a dar risada às custas do sofrimento de inocentes.

terça-feira, 28 de abril de 2009

À beira do caos

A seguinte declaração da secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, serve de alerta – pelo menos aos que estão dispostos a ouvir:

“Se o pior, o impensável, estiver para acontecer, e o avanço do Talibã com apoio da al-Qaeda e outros extremistas derrubar o governo (do Paquistão) por sua incapacidade de derrotar (os terroristas), então estes terão as chaves para o arsenal nuclear do país”, disse.

A figura política do mais alto escalão de política externa da maior potência do planeta já trabalha com a possibilidade de que um dos oito países conhecidos detentores de tecnologia nuclear seja tomado pelo grupo fanático-religioso do Talibã.

Pouca gente deu atenção às palavras de Clinton. Mas o que fazer diante desta ameaça que, como mencionado no texto desta segunda-feira, torna-se mais concreta a cada dia?

Como não é possível reverter os erros do passado – responsabilidade que em boa parte deve ser creditada ao próprio governo paquistanês –, é preciso agir rápido para conter o avanço do Talibã.

E essa solução passa inevitavelmente pelo deslocamento de tropas americanas do Afeganistão para o noroeste do Paquistão. Se no passado não houve qualquer intervenção internacional a ponto de o caos estar instalado a 96 quilômetros Islamad, é preciso que os Estados Unidos decidam encarar o Talibã.

Se já foram repassados 12 bilhões de dólares a corruptos e incompetentes governantes do Paquistão que preferiram desviar os recursos para uso próprio ou compra de armamentos para se contrapor à Índia, é chegada a hora de dar um basta.

Está claro que a diretriz do governo Obama é tentar a conciliação a qualquer custo e basear suas decisões numa oposição teórica a Bush.  É justo e muitas vezes funciona. Mas impedir que o Talibã tenha acesso ao arsenal de cerca de 60 – ou mais, ninguém sabe ao certo – bombas nucleares do Paquistão é um objetivo mais do que nobre.

Em reunião nesta segunda-feira em Cabul, os chanceleres de Irã, Paquistão e Afeganistão se comprometeram a reforçar os laços mútuos de combate ao terrorismo – também foram discutidos temas como crime organizado e narcotráfico.

É claro que esses países não têm capacidade para implementar quaisquer decisões sem ajuda internacional. No caso do Irã, especificamente, o país envia mensagens no mínimo contraditórias sobre a real disposição de ser um aliado na guerra contra o terror – até porque este conceito é bastante singular na cabeça de Mahmoud Ahmadinejad. 

Por ora, só nos resta esperar e torcer para duas possibilidade remotas: que o exército paquistanês consiga impedir o avanço do Talibã; ou que, se alcançando o arsenal nuclear, os fanáticos-terroristas não façam uso dele ou transfiram para quem estiver disposto a fazer (lembrando apenas que bom senso não costuma ser o ponto forte do Talibã, grupo que condenou uma menina de 17 anos a morte por ter sido vista conversando com um homem com quem não tinha nenhum grau de parentesco). 

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Quanto pior, melhor

O Paquistão, um dos principais aliados muçulmanos dos EUA e pilar fundamental da política externa de Obama, está caindo aos poucos diante do Talibã. Hoje o grupo fanático-religioso-terrorista anuncia que as conversações com o governo de Islamabad estão suspensas até segunda ordem. Tudo porque, depois de muito tempo, as autoridades do país decidiram enviar meia dúzia de soldados para tentar conter o avanço dos milicianos. 
Pra variar, não deu certo. As perspectivas são desanimadoras. O Talibã está a apenas cem quilômetros da capital paquistanesa. O fato é que a situação saiu de controle. E a culpa deve ser creditada em boa parte ao presidente Zardari, que, em fevereiro último tomou decisão mais "acertada" para acabar com o avanço extremista: assinar um acordo cedendo ao Talibã a integralidade de Malakand, importante província da problemática fronteira noroeste. 
A região se transformou num talibastão com direito a punições a mulheres que ousam frequentar escolas e outras atividades consideradas anti-islâmicas pelo grupo. 
Ao contrário do que Islamabad pensava, o acordo serviu apenas para impulsionar as ações dos talibãs. Agora, Malakand é base de diversos grupos terroristas que construíram campos de treinamento e usufruem de um paraíso onde as mulheres não têm quaisquer direitos individuais. E a pouco menos de cem quilômetros da capital do país. 
Toda esta complicação é fruto de três principais fatores: discurso nacionalista das autoridades; da quinta coluna representada pelos serviços de inteligência aliados ao Talibã; e má-administração da ajuda recebida dos EUA. 
A colaboração das ISI (os serviços de inteligência do Paquistão) com o Talibã já foi tema de alguns textos por aqui. Quanto à generosa ajuda americana e à péssima administração dos recursos, vale dizer que os cerca de 12 bilhões de dólares recebidos de Washington nos últimos sete anos foram usados basicamente na compra de equipamentos e treinamentos militares... Contra a Índia! 
Enquanto isso, a decisão de ceder parte do seu território para o Talibã foi a pior possível. Mas o que vem acontecendo serve para ilustrar quais as consequências de acordos firmados com grupos que não estão comprometidos com nada além de espalhar terror e fanatismo. 
Para completar esta espiral – que pode mudar parte da estratégia de política externa dos EUA – o final de semana foi de péssimas notícias também no Iraque, onde se acreditava que a situação estava menos instável; somente em abril, foram 18 grandes atentados ameaçando o cronograma de retirada das tropas americanas, que poderiam começar a deixar o Iraque a partir de junho.
Como num dominó, se o Paquistão cair, Iraque e Afeganistão também serão tomados pelos grupos terroristas. Como agem coordenadamente, o objetivo agora é promover o caos na região. Para o terrorismo, quanto pior, melhor. 

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Pequenos avanços no diálogo entre turcos e armênios

Hoje é o dia em que o mundo recorda – ou melhor, deveria recordar – o massacre de 1,5 milhão de armênios por turcos-otomanos em 1915. O genocídio é considerado o primeiro do século vinte – repleto de massacres a civis inocentes. Mas o assunto ainda é tabu, principalmente para a Turquia, que se recusa a usar o termo “genocídio”.

 

O momento é especial para tratar do tema. Primeiro porque a Turquia pretende ingressar na União Europeia.

 

Apesar de a mea culpa nacional não ser um pré-requisito para aderir ao bloco, aprender a lidar com este fantasma histórico seria considerado um ato positivo pelos países europeus. Se Alemanha e Áustria (o primeiro mais do que o segundo, é bem verdade) fizeram isso em relação ao Holocausto, por que os turcos também não podem admitir a autoria do massacre?

 

Em segundo lugar, o atual governo Obama enxerga na Turquia um importante aliado muçulmano no combate ao terrorismo. Mais do que isso, os turcos podem ser mediadores fundamentais em negociações com o Irã. Como justificar à opinião pública americana que um de seus principais interlocutores no combate ao fundamentalismo se recusa a admitir um erro tão grave de seu passado?

 

O fato é que esta semana foi marcada pela declaração do ministro das relações exteriores da Turquia de que seu país e a Armênia concordaram em estabelecer um cronograma cujo objetivo final seria a reconciliação plena entre ambos.

 

Numa mostra de humildade fora do comum nas relações internacionais, o presidente da Armênia, Serge Sarkisian, disse que o reconhecimento turco da responsabilidade pelo genocídio de 1915 não é um pré-requisito para o estabelecimento de relações bilaterais.

 

Seja como for, o impasse é maior do que simplesmente admitir crimes passados. A Turquia apoia seu aliado muçulmano Azerbaijão na disputa travada com os armênios pelo território de Nagorno-Karabakh, no Cáucaso. E esse dilmea militar-diplomático ainda está longe de terminar.

 

Pelo visto, a fronteira entre Turquia e Armênia – fechada desde 1927 e há mais tempo do que a fronteira entre Coreia do Sul e Coreia do Norte – deve demorar bastante para ser reaberta.


quarta-feira, 22 de abril de 2009

A eficácia da política externa de Obama

Depois de Ahmadinejad discursar na conferência para debater o racismo, de Kim Jong-il lançar seu foguete com canções comunistas pelo espaço (ele jura que isso aconteceu mesmo), de Daniel Ortega, da Nicarágua, descascar os Estados Unidos durante 50 minutos na Cúpula das Américas, de Obama fazer uma reverência real ao rei da Arábia Saudita, de ser abraçado por Chávez, ufa, o mundo quer saber: qual a doutrina que vai reger a política externa da maior potência do planeta nos próximos quatro anos?

Se por um lado fica claro que Washington tem intenções conciliatórias, não se pode chamar esta característica de modelo de política externa. Até porque ela pode ser apenas uma forma bastante pessoal do novo líder americano de tratar de assuntos tão diversos.

A imprensa dos EUA dá muita importância aos pequenos gestos do presidente. A suposta reverência ao ditador saudita (ainda não está claro se foi intencional ou simplesmente um reflexo), o abraço caloroso em Chávez e o tom de conciliação adotado em relação ao Irã têm sido determinantes na polarização das discussões entre analistas.

A fauna de opiniões é bastante diversa porque tais atitudes são levadas a sério na tentativa de elaborar ao menos uma previsão de como será a política externa americana.

Até o momento sabemos apenas que Obama é o que chamamos por aqui de boa praça. Mesmo assim, as interpretações dos gestos de “boa vontade” do presidente são as mais diversas.

“Suponhamos que Obama obtenha sucesso em criar laços de amizade com Chávez, Castro, Ahmadinejad e o Talibã. E depois? Vamos continuar a ser o ‘guia’ da liberdade para o resto do mundo ou vamos ter nos desgastado em nome de objetivos políticos?”, questiona o escritor Shmuley Boteach.

Ao contrário de Boteach, a colunista do The New York Post Kirsten Powers crê na coerência da cordialidade de Obama mesmo em relação a tradicionais adversários externos.

“Mostrar humildade é uma estratégia inteligente, além de um sinal de boas maneiras. Ninguém gosta de uma pessoa que vai a um jantar e diz que sua casa é mais agradável, seu bairro é mais interessante e sua mulher cozinha melhor. O que leva conservadores a crer que europeus e latino-americanos querem assistir a uma palestra do presidente dos Estados Unidos mostrando como nosso país é perfeito?”, diz.

Acho prematuro diagnosticar qual a estrutura da política externa de Obama. E, mais ainda, penso que é impossível prever se ela vai funcionar ou não. Fica claro que por ora o objetivo do novo presidente é se desvincular o máximo possível da imagem do governo Bush.

Entretanto, a tática que vem sendo usada me parece simplista. Pior; arriscada. Os Estados Unidos dão a entender que a corda pode e deve ser esticada. O problema é que as consequências podem ser catastróficas.

Sobre a eficácia deste modelo que vem sendo apresentado pelo governo Obama, tendo a concordar com Clive Crook, colunista do Financial Times.

“A doutrina de política externa somente é testada quando a cooperação em busca de interesses comuns não consegue atingir resultados”, diz.

Só quando chegarmos a este ponto em questões como Irã e Coreia do Norte, saberemos se Obama está certo e, principalmente, qual a estratégia real dos EUA para superar esses desafios.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

ONU legitima circo do ódio na Suiça

Que a segunda conferência contra o racismo patrocinada pela ONU seria sequestrada não era novidade. A dúvida que fica depois do discurso do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, proferido hoje é: se já é fato que a reunião vai ser usada como palco para bombardear Israel e não para discutir o racismo no mundo, por que realizá-la mesmo assim?

Para ser ainda mais inconveniente, Ahmadinejad destilou suas palavras de ódio justamente no data oficial em que Israel recorda o Holocausto. Nada mais apropriado.

É verdade que várias delegações se retiraram do salão onde o líder fazia seu discurso. Mas e daí? Até quando a ONU vai emprestar seu prestígio para a exposição midiática de ideias absolutamente contrárias a seus princípios?

Não é possível que uma reunião que tinha como objetivo a legítima discussão de propostas para acabar com o racismo seja desvirtuada desta maneira. E é asegunda vez que isso acontece – em 2001, em Durban, na África do Sul, os países árabes e islâmicos se esforçaram ao máximo para incluir no texto final do encontro a equiparação de sionismo a racismo.

O objetivo é de uma hipocrisia indescritível. E é covardia deixar os assuntos verdadeiramente importantes de lado.

No ataque verbal da vez, Ahmadinejad conseguiu ser ainda mais retrógrado ao reeditar as premissas dos Protocolos dos Sábios de Sião, farsa criada para colocar sobre os judeus a culpa por todos os males do planeta.

“O povo iraquiano sofreu grandes perdas... a ação militar não foi preparada pelos sionistas do governo americano em cumplicidade com as empresas fabricantes de armas?”, disse.

É público e notório que Ahmadinejad adota este discurso. Portanto, por que convidá-lo a se manifestar numa conferência sobre racismo? Justamente um líder mundial que preside um regime responsável por execuções públicas, que se cala diante da violência contra as mulheres e que se orgulha de que em seu país simplesmente não existe homossexualismo – como se isso fosse possível.

“É o exemplo perfeito de como as Nações Unidas dão aos maiores violadores dos direitos humanos a oportunidade para que eles se passem por pessoas qualificadas a julgar a moralidade alheia”, diz Gerald. M. Steinberg, diretor do Monitor das ONGs e membro dos departamento de ciências políticas da Universidade Bar-Ilan, em Israel.

Até o momento, quem melhor definiu o circo de horrores que está acontecendo na Suíça foi o professor de Harvard Alan Dershowitz.

“Ahmadinejad está tentando transformar os direitos humanos em erros humanos ao excluir da agenda do encontro mais de metade da humanidade: mulheres, bahais, homossexuais, judeus, não-muçulmanos etc”, disse.  

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Israel irá atacar o Irã

Por mais que seja cedo para fazer esta afirmação, ela se torna válida na medida em que os sinais tornam-se cada vez mais evidentes. É muito provável que em algum momento entre o final deste ano e o início do ano que vem Israel bombardeie parte considerável dos 27 pontos de produção nuclear iranianos. O ataque só não irá acontecer se Mahmoud Ahmadinejad for derrotado nas eleições presidenciais de junho.

A medida será concretizada de forma a manter a coerência com o suporte ideológico que rege a área de segurança do Estado Judeu desde sua fundação, em 1948: nenhum país vizinho ou mesmo Estados da região combinados podem alcançar o poder de destruir Israel, mesmo que esta força seja apenas obtida como forma de barganha – o que definitivamente não parece ser o caso do Irã.

Em declaração publicada pelo prestigiado site norte-americano Salon, Ephraim Kam, diretor do Instituto de Estudos de Segurança Nacional de Tel Aviv – e especialista em Irã – explica como a questão está sendo discutida pelas autoridades israelenses.

“Claro que há diferentes opiniões, mas há um consenso geral entre experts na área de segurança e líderes políticos de diferentes ideologias, dos trabalhistas aos direitistas. Este não é um assunto controverso. Se o Irã adquirir armas nucleares, vai nos impor uma profunda ameaça. Será a primeira vez em nossa história que outro país poderá causar nos causar um desastre”, diz.

Enquanto EUA deixam as negociações praticamente em ponto morto e cedem cada vez mais ao lenga-lenga iraniano, Israel prepara sua população para a guerra.

A Frente de Comando Interno das Forças de Defesa de Israel anunciaram o maior exercício da história. Durante uma semana, os civis serão preparados para lidar com ataques de mísseis convencionais e também nucleares. Ao mesmo tempo, desenvolve com sucesso seus sistema de defesa antimísseis, o Arrow II (Flecha II).

No ano passado, o então primeiro-ministro Ehud Olmert já havia pedido autorização do governo americano para realizar os ataques. Segundo o planejamento, a força aérea israelense poderia usar o espaço aéreo iraquiano, ponto considerado vital para o sucesso da empreitada. Bush negou, da mesma maneira que Obama irá negar. O antigo presidente e o atual temem que uma guerra com o Irã cause um grande retrocesso e desestabilização em Afeganistão e Iraque.

Mas, nada garante que o governo israelense só atacará após a permissão dos EUA. É possível que decida agir por conta própria.

Na esteira do impasse com os iranianos – ponto já discutido no texto da última quarta-feira –, os demais países do Oriente Médio se preparam para a guerra iminente.

Segundo reportagem publicada hoje no jornal The Washington Times, os países-membros do Conselho de Cooperação do Golfo – grupo formado por Arábia Saudita, Qatar, Bahrein, Emirados Árabes Unidos e Omã – silenciosamente começam a instalar baterias de mísseis Patriot ao redor de importantes campos de extração de petróleo.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

EUA podem vir a ceder para estabelecer diálogo com o Irã

Ao que parece, as armas nucleares vão ocupar ainda mais a agenda internacional. Principalmente neste ano. As decisões em torno de Coreia do Norte e Irã se sucedem numa espiral que pode decidir o futuro das relações políticas e militares. Enquanto na era Bush o mundo esteve dividido entre o eixo do bem e o do mal, Obama parece perseguir um meio termo que, apesar de ter o real mérito de romper com o maniqueísmo, não resolve o problema de vez.
E é esta a solução que vem se apresentando no caso do Irã. A República Islâmica já declarou inúmeras vezes que não vai interromper o desenvolvimento de seu programa nuclear. A bola continua do lado dos países que pretendem interromper este ciclo, considerado uma ameaça por Estados Unidos e Israel. Mas este jogo está para mudar.
Por maior que seja a boa vontade de Washington, a contradição entre discurso e prática da política externa do país fica mais evidente. Numa semana, Obama declara que quer livrar o planeta de armas nucleares. Mas nesta terça-feira, reportagem do The New York Times revelou uma profunda e significativa mudança de estratégia do time de países capitaneado pelos EUA.
De acordo com o jornal, a administração Obama já considera a possibilidade de permitir que o Irã continue a enriquecer urânio – ao menos nas fases preliminares de negociação. Durante o governo Bush, a diretriz era negociar somente a partir do momento em que os iranianos fechassem toda infraestrutura de desenvolvimento nuclear.
Em entrevista ao jornal, um oficial europeu explicitou a principal razão para envergar a posição de americanos e seus aliados.
“Chegamos à conclusão que isso simplesmente não vai funcionar. A experiência nos ensina que os iranianos não vão ‘comprar’ essa ideia. Vamos começar com passos como este para criar um pouco de confiança”, diz.
É claro que não há dúvidas de que esta é uma abordagem inteligente em relação a um regime que se recusa a responder aos gestos de boa vontade. Mas política não é matemática e não existe qualquer garantia de que, graças a isso, Ahmadinejad irá abrir mão de suas ambições nucleares. Aliás, o presidente iraniano não cansa de repetir que o desenvolvimento de armas atômicas é um ponto central de seu governo. E nada leva a crer que se trata tão somente de, graças a discursos com este conteúdo, elevar seu poder de barganha.
Afinal, o que ele pode exigir em troca? O fim do apoio americano a Israel? Esta não me parece ser uma demanda a que os EUA queiram atender. Esta não é uma carta que está na mesa.
Sendo muito otimista, o objetivo do Irã com seu projeto nuclear é apenas se tornar uma potência regional no Oriente Médio. Sendo muito pessimista, Ahmadinejad usará um armamento de tal magnitude para pôr em prática sua cruzada fanática e religiosa de varrer Israel do mapa, objetivo que ele já propôs inclusive em discurso na ONU. Qual o tamanho da faixa variável entre o mínimo e o máximo é mera especulação.
Enquanto isso, o Irã vai ganhando tempo com uma estratégia muito conhecida: a do morde e assopra. Se morde com discursos duros, assopra afirmando que prepara um pacote de demandas para apresentar aos EUA de forma a aceitar a proposta de negociações diretas, como informa a agência de notícias oficiais do país, a IRNA.
Ao mesmo tempo, o número de centrífugas construídas é estimado em 5.500. Segundo especialistas, é quantidade suficiente para fazer duas armas nucleares por ano.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Enquanto Obama relaxa restrições a Cuba, China anuncia metas sociais

Algumas e significativas alterações realizadas pela gestão Obama em relação a Cuba chegam justamente às vésperas da Cúpula das Américas, cujas discussões foram tema do texto de sexta-feira. Mas outro considerável avanço político passou meio despercebido nesta terça-feira. A China anunciou o que chama de Plano Nacional de Ação em Direitos Humanos 2009-10.

O documento foi divulgado ontem pelo Partido Comunista chinês e propõe o aumento da proteção aos direitos civis, alvo constante de acusações da comunidade internacional que credita ao governo de Beijing sua sistemática violação.

Apesar de sem a menor dúvida o comunicado chinês significar um passo importante das autoridades do país, segundo o The New York Times, entretanto, o documento não prevê qualquer reforma fundamental do sistema político da China baseado na existência de um único partido.

Ainda segundo o jornal, não existe previsão de mudança em outros pontos fundamentais, como a criação de cortes de justiça independentes e desvinculadas do PC.

No caso de Cuba – país que ao lado da China é sempre alvo de polêmicas envolvendo, principalmente, o tratamento dispensado aos dissidentes –, qualquer manifestação do governo americano costuma causar uma onda de discussões apaixonadas. Até porque está localizada a poucos quilômetros da costa dos EUA e os cubano-americanos costumam fazer barulho.

De maneira geral, segundo a edição do jornal O Globo de hoje, a população americana – mesmo os que não são parentes de refugiados ou tenham qualquer ligação com Cuba – apoia o restabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países. De acordo com pesquisa realizada pela CNN, 71% dos americanos são favoráveis à ideia.

Mas há de tudo um pouco entre os que, dos Estados Unidos, defendem o fim do regime de Castro & Castro. Para o colunista do The Washington Post Eugene Robinson, somente a “invasão” monetária pode derrubar o regime.

“Deveríamos acabar com o embargo e também com qualquer restrição às viagens a Cuba. Essas medidas colocariam o ônus no lado cubano, que deveria inventar uma maneira de evitar que hordas de americanos capitalistas invadissem a ilha com perigosas ideias contrarrevolucionárias”, diz.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

As características próprias do caos na Tailândia

A complexidade política que gerou o estado atual de caos na Tailândia é tão grande, que prefiro partilhar com os leitores uma reportagem publicada no site da BBC. Ela explica de forma bastante direta quem são os personagens da crise e as posições de cada um dos lados.

Para ler, clique aqui.

O interessante é notar que, por mais distante física e culturalmente que a Tailândia seja do Brasil, os dilemas enfrentados por lá são bastante comuns aos nossos. Ou melhor, para ser mais exato, qualquer país com imprensa livre, congresso com representação e população com direito a voto está sujeito a este tipo de situação.

Protagonizando esta enorme confusão, os vilões de sempre: acusações de fraude eleitoral, um líder populista amparado pelos setores mais carentes do país, um magnata da mídia, o poder coercitivo das forças armadas e sinais de corrupção. O roteiro é parecido a tantos outros.

A diferença neste caso são os impronunciáveis nomes tailandeses, o tempo que o período de indecisão toma conta do país e o grau de violência dos protestos.

Desde 2006, há uma enorme e apaixonada disputa social envolvendo o cargo de primeiro-ministro e a continuidade da monarquia – embora muitos argumentem que ela não se encontra ameaçada.

Seja como for, os protestos mais violentos já proporcionaram cenas que certamente estarão dentre as mais intensas do ano. Foi o caso do grupo de manifestantes que cercou o carro oficial do primeiro-ministro Abhisit Vejjajiva. A fúria era tamanha que o veículo foi completamente destruído, mesmo que Vejjajiva não estivesse em seu interior.

E se essa moda pega por aqui? Se a população decidisse destruir com as próprias mãos os carros de políticos corruptos?

Numa interpretação própria dos acontecimentos, o jornal inglês The Indepent publica editorial hoje comparando a situação na Tailândia ao já ocorrido no Nepal, onde a questionada realeza foi derrubada numa revolução maoísta que expulsou a monarquia. 

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Promessa de emoção durante a Cúpula das Américas

Há muito tempo a América Latina – e a do Sul especialmente – não experimentava tamanho frenesi às vésperas de um encontro entre seus presidentes. Aliás, a Cúpula das Américas, marcada para a próxima semana em Trinidad e Tobago, tem realmente muitos motivos para gerar tanta expectativa.

Se já não fosse suficiente a simples presença do popstar presidente americano, Barack Obama, o encontro entre os líderes das Américas oferece uma série de oportunidades políticas, econômicas e midiáticas também.

O continente deixou há tempos de ser um mero espaço de experimentação ou desafogo produtivo e especulativo de americanos e europeus. Se as lideranças atuais alcançaram suficiente status para serem ouvidas, na mesma proporção suas posições causam polêmica. E, por tudo isso, a Cúpula das Américas promete. E muito.

O Peru atravessa um momento inédito, com o ex-presidente Alberto Fujimori condenado a 25 anos de prisão por abusos aos direitos humanos, que incluem, dentre outros, a responsabilidade sobre a morte de nove estudantes e um professor da Universidade de Lima. Além é claro de inúmeras acusações de corrupção que já o haviam obrigado a se exilar no Japão.

Hugo Chávez encerra sua excursão mundial tendo declarado que pretende apertar a mão de Obama em Trinidad e Tobago, numa das fotos que certamente estarão na capa de 90% dos jornais do planeta. Depois de anos de basear toda a política externa venezuelana na oposição aos Estados Unidos, o “comandante do socialismo do século 21” disse concordar com os esforços de Obama livrar o mundo da ameaça nuclear.

Ao mesmo tempo, uma das maiores preocupações dos EUA é evitar que Cuba – que sequer participará do encontro da próxima semana – se transforme no principal tema das discussões da cúpula. Tudo por conta da recente visita de membros do congresso americano à ilha que contou, inclusive, com encontros com a dupla Castro & Castro. Não é segredo pra ninguém como os demais países latino-americanos torcem para o fim do embargo dos Estados Unidos a Cuba.

Simultaneamente a isso, o Brasil deve ocupar um papel importante na reunião, principalmente depois dos acontecimentos do G20. O “cara” deve se encontrar com o “cara” de Washington e conversar sobre a aproximação dos EUA com a Venezuela – até porque este já foi tema do diálogo entre Lula e Obama durante a visita do presidente brasileiro à capital americana em março passado.

Para apimentar ainda mais a Cúpula, o presidente da Bolívia, Evo Morales, está em greve de fome cujo objetivo é forçar o congresso do país a aprovar a lei eleitoral que permitirá a realização de um pleito geral em dezembro.

Não faltam atrativos para ficar atento às declarações e resoluções da próxima semana em Trinidad e Tobago
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quinta-feira, 9 de abril de 2009

Na Moldávia, revolta é convocada pelo Twitter

Os protestos que tomaram conta da Moldávia nesta terça-feira foram surpreendentes porque mostram um mundo quase em descompasso com a Europa ocidental.

Mais do que isso, alguns dados impressionam.  Pela surrealidade da situação.

A população está em fúria exigindo novas eleições parlamentares após a vitória do Partido Comunista. Diga-se de passagem, a Moldávia foi o primeiro país a eleger um presidente comunista após o fim da União Soviética.

Entretanto, por maiores que sejam as evidências das causas da revolta que pôs até fogo no parlamento, o pesquisador social Dumitru Minzarari é cético e prefere não apontar motivos específicos para a explosão social.

“Foi um evento espontâneo. As pessoas estavam apenas revoltadas. Elas não foram educadas no regime soviético e por isso não são submissas ou têm medo de protestar nas ruas”, disse em entrevista ao The New York Times.

A natureza dos acontecimentos, porém, dá a entender que a juventude do pais está insatisfeita com a falta de oportunidades e a miséria da Moldávia. Como já ocorreu com Ucrânia, Geórgia e República Tcheca, o país é mais um do lado oriental da Europa a sofrer as graves e práticas consequências da crise financeira.

Como também aconteceu na Grécia no final do ano passado, os jovens são a camada da população que demonstra maior insatisfação. Tanto que, numa das demonstrações mais surpreendentes de mobilização deste século, as manifestações na capital Chisinau foram convocadas pelo Twitter, moderníssima ferramenta de comunicação na internet.

Longe de defender teorias conspiratórias, mas não creio em eventos absolutamente desconexos nas relações internacionais do mundo de hoje. Muito menos em países tão próximos.

No caso específico da Moldávia, a situação fica ainda mais flagrante levando-se em consideração toda a história conjunta com a Romênia, hoje membro da União Europeia.

Moldávia e Romênia formaram um único Estado até 1940. A diferença é que, enquanto os romenos procuraram se aliar ao ocidente em suas escolhas políticas – culminando com a adesão à UE em 2007 –, os moldavos mantêm fortes laços com a Rússia.

E hoje, diante desta crise financeira, os jovens olham para o país vizinho – com o qual compartilham semelhanças culturais e históricas – e percebem que a Moldávia se fecha e as oportunidades, mínguam.

Segundo reportagem do NYT, um dos sinais recentes de descontentamento foi a tentativa do governo comunista de impor uma grade curricular nas escolas do país diminuindo a importância da influência romena. Umas das maiores reclamações atuais é quanto as restrições impostas pelas autoridades moldavas à entrada em território romeno.  

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Visões sobre o Brasil

Depois de Lula ser chamado de “o cara” no encontro do G20 pelo maior dos caras da política atual, o Brasil passou a ser tema importante da agenda internacional. No dia de hoje, especificamente, o país aparece em dois dos maiores e mais respeitados veículos do mundo: reportagem na BBC News e artigo no The Wall Street Journal.

São textos que exaltam a importância do Brasil, mas sob ângulos completamente distintos.

Enquanto a BBC se dedica a comentar o poder econômico, o WSJ lança luz sobre a liderança do país numa aliança que conta com a parceria de Índia e África do Sul.

A BBC recorda o comentário de Obama sobre Lula em Londres – aliás, flagrado por suas câmeras mesmo – como gancho para citar algumas decisões recentes do governo brasileiro, como o plano anunciado por Guido Mantega no mês passado de destinar 34 bilhões de reais para a construção de um milhão de casas para trabalhadores de baixa renda.

“Pela primeira vez, as autoridades estão conseguindo responder a uma crise como um país desenvolvido, estimulando a economia em vez de retraí-la”, diz a reportagem.

No WSJ, Bruce Gilley, professor de Ciências Políticas da Universidade de Portland, defende que a política externa americana deve se preocupar com a atuação internacional brasileira, não dispensar todas as atenções para a China.

Segundo ele, a criação da IBSA (grupo formado por Índia, Brasil e África do Sul), em 2003, mostra que existe uma estratégia internacional coordenada entre esses países cujo objetivo é defender seus interesses nos organismos multilaterais. E vai além: o pacto pode se tornar um porta-voz dos países em desenvolvimento.

“O ímpeto de criar o organismo partiu do presidente Lula. Em junho de 2003, os ministros das relações exteriores dos três países deram início às atividades do grupo, em Brasília, pedindo o fortalecimento das instituições internacionais para que elas passassem a atender os Estados em desenvolvimento em áreas como pobreza, meio-ambiente e tecnologia”, diz.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Obama encanta a Turquia

O discurso de Obama em Ancara foi estrategicamente elaborado. Cada linha, vírgula e até mesmo as pausas para a tradução do intérprete serviram aos propósitos do presidente americano e da nova política externa que o governo dos EUA aos poucos vem tentando implementar. Ovacionado por mais uma plateia encantada com seu carisma, ele reviveu os dias de campanha. Aliás, parece mesmo que esses dias ainda não terminaram. 

O que tem causado um misto de admiração, perplexidade e otimismo no público do planeta é a sensação de que, depois de oito anos de governo Bush, novamente a maior potência do mundo é liderada por alguém que se importa com o destino de quem vive além das fronteiras americanas. Mais do que isso, Obama sabe o poder de cada palavra proferida quando se ocupa a presidência dos Estados Unidos. 

Na capital da Turquia, ele conseguiu acertar com precisão nas bolas de sinuca espalhadas pela mesa do jogo da diplomacia global. Prestou homenagem aos donos da casa, não apenas para retribuir a recepção, mas para conquistar os turcos e levá-los para seu lado num momento tão importante, quando a prioridade é não perder o controle de Afeganistão e Paquistão. 

Já escrevi sobre a Turquia na semana passada, mas não custa repetir os motivos que tornam o país tão fundamental: apesar de enfraquecido por conta do conflito em Gaza, a relação com Israel é considerada boa. Ancara pode atuar como intermediária na costura de um acordo entre israelenses e sírios. Além disso, o país faz fronteira com Iraque e Irã, além de ter grande influência no Afeganistão. 

Obama também acalmou os ânimos dos ouvintes ao dizer que os EUA não abrem mão do compromisso da solução de dois Estados para dois povos no conflito entre israelenses e palestinos. Justamente no momento em que o novo ministro das relações exteriores de Israel, Avigdor Lieberman, dá a entender que o recém-empossado governo não está necessariamente comprometido com os acordos de Annapolis. E pouco tempo depois de o primeiro-ministro turco discutir em público com Shimon Peres no Fórum Econômico de Davos.

Para causar mais impacto, o presidente americano também defendeu a inclusão turca na União Europeia, opinião que causou controvérsia, gerando críticas até mesmo de Sarkozy. Nesse cabo de guerra mundial, Obama mais uma vez se deu melhor, recebendo até editorial elogioso no Times, um dos mais respeitados jornais europeus.

“A Turquia é uma prova viva de que Islã e democracia podem coexistir. Ninguém defende que (a Turquia) está pronta para se tornar o 28º membro da UE, mas os Estados Unidos abraçaram a ideia. A Europa deve fazer o mesmo”. 

Talvez o caminho de Obama seja mais simples, até pela rejeição de Bush. Fazendo tudo ao contrário, o novo presidente americano está conseguindo abrir as portas do mundo. Pode parecer contraditório, mas o maior aliado de Obama parece ser mesmo a política externa de Bush. 

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Coreia do Norte abre caminho para aspirantes nucleares

O lançamento do satélite norte-coreano pode até não ter sido um sucesso. Mas a maneira como a primeira crise internacional de Obama foi conduzida pode servir como alerta para os países envolvidos em embates nucleares. Aliás, para alguns deles, como a própria Coreia do Norte e o Irã, o saldo foi muito positivo.

Afinal, o líder King Jong-il ameaçou, protelou o lançamento, fez a festa da mídia ocidental. Mas, no final das contas, conseguiu realizar seu plano de fazer alguma arma – pacífica, ele jura – voar por sobre o território japonês. Não houve qualquer represália. Muito menos militar, nem tampouco uma sanção pra valer no Conselho de Segurança da ONU.

É possível que o tal satélite não seja nada além disso mesmo. Segundo a agência de notícias oficial de Pyongyang, ele já está em orbita reproduzindo espaço afora músicas de exaltação ao regime “popular”. Mas é mera especulação, já que fontes militares americanas e japonesas argumentam que o lançamento não foi bem sucedido. Isso no momento é o que menos importa.

O fato é que o esconde-esconde de Kim Jong-il ainda não foi decifrado, restando aos países da região torcer para que realmente os norte-coreanos não tenham a capacidade de incluir ogivas nucleares no próximo satélite espacial-musical que venham a lançar por aí.

Sim, nada mais há para ser feito. Obama até que tentou levar a questão para as Nações Unidas. Mas uma sanção mais forte foi barrada por Rússia e China, que nada fizeram além de pedir moderação. É como se pouco se importassem com que tipo de armamento o líder norte-coreano pretende desenvolver. Para eles basta a certeza de que essa não será mais uma questão em que os EUA vão se meter. Se Tóquio ou Seul serão os próximos alvos da Coreia do Norte esta não é a preocupação de russos e chineses. Basta somente que Obama não capitalize mais essa.

E tudo isso menos de uma semana após o “reset” de Obama com Medvedev em Londres, no encontro do G20, e a intervenção do presidente americano na crise entre França e China.

Em artigo publicado no The Wall Street Journal, John Bolton, do Instituto de Empreendedorismo dos Estados Unidos, analisa as conseqüências da liberdade norte-coreana para efetuar o lançamento.

“Rússia e China vão concluir que atingir seus objetivos políticos com o novo governo (americano) pode não ser tão difícil. Pode até ser injusto com o novo presidente, mas deixa claro como Moscou e Beijing estruturam sua diplomacia. Por si só, esta já é uma má notícia para Washington e seus aliados”, diz.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

No G20, Rússia disfarça antiamericanismo

Ainda sob a euforia do bem sucedido encontro do G20, vale prestar atenção aos resultados de uma das reuniões mais aguardadas em Londres: a do presidente russo, Dmitri Medvedev, com o americano, Barack Obama.

Entre muitos sorrisos aliviados e felizes, ficou acertada uma parceria para negociar um maior controle de armas e o trabalho conjunto envolvendo a guerra do Afeganistão e a ameaça nuclear iraniana.

Olhando apenas as decisões bilaterais, parece até que a Rússia está realmente comprometida com um Irã sem armas nucleares ou com a vitória americana contra os talibãs. Ledo engano.

“O regime russo tem uma ordem de prioridades diferente. A maior parte delas se baseia em metas de curto prazo onde o antiamericanismo ocupa um lugar importante simplesmente porque para Putin e seus associados os interesses do regime são maiores que os nacionais”, escreve Svante E. Cornell, diretor do Instituto da Ásia e do Cáucaso da Universidade John Hopkins.

Para o acadêmico, há alguns sinais claros da ambiguidade de posicionamento de Moscou em relação a esses dois temas específicos.

No caso da Ásia Central, um fato importante foi a intervenção direta do presidente Medvedev para o fechamento da base aérea americana no Quirguistão.

Em relação ao Irã, o posicionamento russo é ainda mais marcante.

Como lembra Cornell, Moscou mantém uma aliança com Teerã há mais de uma década. Além de ter construído o reator de Bushehr, a Rússia usa seu poder de veto no Conselho de Segurança da ONU para barrar sanções à República Islâmica e continua a fornecer armamento aos iranianos.

Apesar de Obama ter saído como ingênuo do encontro de Medvedev – como sugeriu o editor da National Review, Rich Lowry –, o presidente americano não é bobo.

Primeiro por ter conseguido o compromisso público de Moscou com dois dos mais importantes objetivos da política externa de Washington. Além disso, ele já usa seu prestígio para influenciar a reunião da OTAN e colocar a guerra do Afeganistão como prioridade da organização.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Brasil sai fortalecido da reunião do G20

Não faz muito tempo, mas era prática comum que um enviado do FMI pousasse em Brasília periodicamente e fosse recebido com status de chefe de Estado pelo presidente brasileiro. Este recebia uma lista com as exigências de metas econômicas que o país deveria apresentar caso quisesse conseguir empréstimos na instituição.

Hoje a situação se inverteu. É o que provam as resoluções divulgadas hoje pelo G20. E não apenas por conta da crise financeira, mas em boa parte pelas mudanças significativas políticas e econômicas obtidas nos últimos anos pelo governo brasileiro.

Uma das principais decisões tomadas hoje em Londres diz respeito à ajuda que os países-membros – dentre eles, o Brasil – vão dar ao FMI.

A instituição vai receber um fundo de 1 trilhão de dólares para emprestar dinheiro aos países em desenvolvimento. O Brasil foi um dos Estados a decidir sobre o futuro do FMI, e não o contrário, como era comum há alguns anos.

Mais ainda, a agenda internacional econômica defendida pelo Brasil saiu em grande parte vencedora da reunião. Por exemplo, ficou acertado um acordo que deverá nomear os países que impedem as regras de livre comércio. Além disso, haverá sanções aos chamados paraísos fiscais. Todos esses pontos são defendidos pela política externa brasileira. 

Foi preciso uma crise global para que os países desenvolvidos apoiassem regras justas e mais claras para determinar o comércio mundial e o mercado financeiro.

Em artigo publicado no britânico The Daily Telegraph o presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel Durão Barroso, simplesmente reafirma a posição brasileira, mas como se fosse a justiça simbolizada pela política da UE. Sou avesso a patriotadas, mas é preciso deixar claro quem são os históricos defensores de cada uma das ideias apresentadas por Barroso.

Vale citar três tópicos, que, se extraídos do artigo, poderiam muito bem ser assinados por Celso Amorim, Celso Lafer ou Marco Aurélio Garcia.

“protecionismo e nacionalismo econômico são falsos amigos que abastecem a pobreza e o conflito: vimos isso nos anos 1930”.

“precisamos estabelecer regras capazes de controlar a globalização. Somente o trabalho internacional conjunto pode colocar o potencial dos mercados a serviço dos cidadãos e atingir desafios globais como mudança climática, segurança energética e o combate à pobreza”.

“(É preciso) enviar uma mensagem forte contra toda a forma de protecionismo e comércio livre a partir do desenvolvimento das conversações de Doha”.

E por fim...

“Países em desenvolvimento não devem pagar o preço de uma crise criada nos países desenvolvidos”.

O que vale é saber que os conceitos são esses, mesmo que ele não tenha tido essas ideias geniais desde sempre. Mas a posição de Barroso mostra uma tendência intrínseca do ser humano de tentar capitalizar para si posições alheias quando essas passam a ser unanimidade.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

O maravilhoso mundo de Hugo Chávez

O mundo do presidente venezuelano Hugo Chávez é bem fácil de ser explicado. De um lado estão os bons – comandados por ele, obviamente. Do outro, os imperialistas. Neste saco de gatos estão Europa, Estados Unidos e Israel. Mas no lado dos maus não figura, por exemplo, Omar al-Bashir, presidente do Sudão condenado por crimes contra a humanidade pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).

Sobre ele pesa a responsabilidade pelo massacre de Darfur, que, até agora, matou cerca de 300 mil pessoas e provocou o deslocamento de outras 2,7 milhões.

Mas para Chávez o vilão da humanidade é o presidente de Israel, Shimon Peres. Para Chávez não existe nenhum problema quando o presidente do Irã afirma que Israel deve ser varrido do mapa. Como o presidente venezuelano imagina que esta “varredura” ocorreria?

Na verdade, soa muito coerente que ele não considere a postura do Irã digna de condenação. Afinal, se ele convidou Bashir para um passeio sul-americano, por que se importar com mais um genocídio em massa hipotético? Faz sentido mesmo.

Chávez justificou seu apoio ao presidente sudanês sob o argumento de que a ordem do TPI é “uma aberração jurídica e um desrespeito aos povos do terceiro mundo”. Mas estar diretamente envolvido com a morte de 300 mil pessoas não é um desrespeito, para dizer o mínimo?

Na cúpula realizada entre países sul-americanos e a Liga Árabe, no Catar, ele também defendeu a adoção de uma moeda internacional fundamentada nas grandes reservas de petróleo. Essa me parece mais uma contradição de um líder que se autointitula uma espécie de messias do socialismo.

E esse modelo econômico seria incrível, sem dúvida. A partir do momento em que houvesse discordância política entre o resto do planeta e a Opep, simplesmente o petro – claro, o nome da moeda seria este – deixaria de ser emitido.

Na prática, haveria a ditadura do petróleo, cujos países produtores são monarquias absolutas ou ditaduras em sua maioria. Além é claro do Irã, que defende a destruição de Israel.

Realmente, Chávez propõe a construção de um mundo maravilhoso.  Mas, sem dúvida, eu prefiro não estar aqui para testemunhar quando ele se tornar realidade.