sexta-feira, 7 de março de 2008

Mesmo

Por Henry Galsky

Nove horas da noite. O metrô nem cheio, nem vazio. No vagão repleto de distrações banais – o reflexo no vidro, a conversa dos outros, a voz da locutora anunciando as estações num inglês relaxado – os rostos não são familiares. Mesmo assim não é difícil se identificar com aquelas pessoas que emanam cansaço, frustração e sono. Após mais um longo e lento dia de trabalho, ninguém parece se importar com as conseqüências de uma vida forjada na dura desesperança repetida a cada nascer do sol: é preciso continuar.

O olhar distante e desatento da mulher de meia-idade traduz o sentimento que parece envolver todos os passageiros. Chegar em casa não é apenas uma obrigação, mas um impulso obedecido quase militarmente pela tropa da classe média embarcada nos trilhos elétricos e bem-aventurados concedidos pela benevolência dos “saudosos” governantes da Cidade Maravilhosa nos idos anos 1980. A mesma década a marcar a áurea juventude da mulher que, neste momento, está ali, sentada e desiludida a poucos metros de mim.

E assim vão correndo os anos. Um casal discute, um estudante escuta seu MP3, a senhora dorme e o rapaz lê jornal. Eu, que já fui o estudante, o sorridente rapaz com a namorada, hoje sou apenas um observador. Em alguns anos serei o homem cansado que olha o vidro como quem não pensa em mais nada e, finalmente, a senhora que cochila relaxada – que talvez nem pense mais nas frustrações e esperanças de anos anteriores. Talvez ela se sinta de alguma maneira justificada pela experiência anunciada pelos governos, pela imprensa e pelo senso comum. Antes de tudo, é preciso respeitar os mais velhos, aprender, apreender. Seremos como eles. Queiram ou não. O destino pronto e acatado pelo passar do tempo. O mesmo breve tempo de 20 minutos que torna a todos nós membros desta efêmera comunidade de passageiros do metrô.

Já na rua, os passos apressados dos que anseiam por chegar em casa. As ruas refletem suas almas e, já cansadas por mais um dia longo, lento e barulhento, entregaram os pontos. Os carros são poucos e lambem apenas os jornais a voar ao sabor do vento quente e abafado. Mas é preciso chegar em casa. Ver os filhos, cozinhar, contar histórias, ler o jornal já velho a noticiar um dia passado. Amanhã será o mesmo para depois se transformar no mesmo e assim por diante.

Em casa, é preciso comer rápido, falar rápido, amar rápido. O sono consome o tempo, que consome a vida. E eu lembro da senhora do metrô. A única que já conhece a história por ela mesma. Porque a vida dela é a minha vida. E a vida do estudante do MP3 é a minha vida. E eu já fui ou serei cada um deles. Na repetição cansada de todos os dias. A lição que engolimos rapidamente no café da manhã pouco antes de nos tornarmos mais uma repetição, antes de entregarmos nossas vidas à saudável e urgente missão de ganhar dinheiro.

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