sexta-feira, 30 de novembro de 2012

O Estado palestino e as eleições em Israel


Se o reconhecimento do Estado palestino pela ONU irá influenciar decisivamente as eleições israelenses de janeiro, somente o tempo dirá. O fato é que, ao contrário do que se possa imaginar, a sociedade israelense apoia em grande escala a solução de dois países para dois povos. Pesquisas realizadas continuamente mostram que dois terços consideram a criação da Palestina pacífica ao lado de Israel a chave para resolver o conflito. Percentual similar também é encontrado entre os palestinos. A convergência de opiniões das pessoas é o reconhecimento da realidade prática: nem israelenses deixarão seu país, nem os palestinos desistirão de ter um Estado próprio. 

No entanto, o lugar-comum – que é verdadeiro – mostra que a política e seus representantes se interpõem para viabilizar o fechamento deste ciclo vicioso. Mas a reivindicação do presidente Mahmoud Abbas na ONU é uma oportunidade para resolver alguns impasses: o primeiro deles é a interrupção de negociações diretas. Não há motivo para não retomar o diálogo mútuo. Como escrevi em meu último post, reconhecer o protagonismo da Autoridade Palestina e suas ambições não significa somente respeitar os Acordos de Oslo, de 1993, mas também legitimar a única entidade palestina que abertamente entende a solução de dois Estados para dois povos como a única possível. 

A guerra recente entre Hamas e Israel serviu de combustível a radicais de ambos os lados. Ao Hamas, a legitimidade que buscava, muitas conquistas políticas internacionais e a possibilidade de silenciar o crescente movimento interno de apoio ao Fatah, do presidente palestino Mahmoud Abbas (antes do conflito com Israel, pesquisas mostravam que, mesmo em Gaza – território do qual a Autoridade Palestina foi expulsa pelo Hamas em 2007 – a popularidade do Fatah era de 40% contra 22% do Hamas, índice superior ao observado na Cisjordânia, inclusive). 

Ao mesmo tempo, o Likud, partido do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, é sustentado no Knesset, o parlamento israelense, graças a uma coalizão de partidos de direita e de ultraortodoxos que apoiam a manutenção dos assentamentos na Cisjordânia. O congelamento das negociações com a Autoridade Palestina é uma maneira de não ter de lidar com essas questões e implodir a coalizão. Netanyahu sabe que os partidos que o sustentam no cargo deixariam o governo no minuto seguinte a uma eventual promessa de desmantelamento dos assentamentos. Por essa aliança partidária, quanto mais tempo ganhar, quanto menos a questão palestina estiver sobre a mesa, maiores são as chances de permanecer à frente do governo israelense. 

Justamente por isso, a vitória palestina na ONU pode trazer o assunto novamente ao centro da discussão política em Israel. Até o momento, a única a se pronunciar abertamente sobre isso e prometer retomar as negociações como plataforma central de candidatura foi a ex-ministra das Relações Exteriores Tzipi Livni. Até há pouco filiada ao Kadima – partido cuja plataforma é o pragmatismo político –, fundou o seu próprio partido, HaTnuá (O Movimento). A partir de agora, é possível que o tema volte a ocupar os partidos e a ser discutido seriamente na campanha – o que possivelmente irá alterar o cenário confortável usufruído até então pelo Likud de Netanyahu. 

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Depois da guerra, Hamas ganha força e Autoridade Palestina se enfraquece


Esta é uma semana movimentada no Oriente Médio. E, mais especificamente, em questões importantes envolvendo o conflito árabe-israelense e, ainda mais pontualmente, o conflito palestino-israelense. Nesta quinta-feira, o presidente Mahmoud Abbas pedirá o reconhecimento de um Estado palestino na Assembleia Geral da ONU. A Palestina será reconhecida como Estado observador. Ao contrário do que o senso comum pode indicar, esta será a melhor notícia para Israel. 

Segundo o Wall Street Journal, o rascunho do pedido palestino não menciona a interrupção das construções de assentamentos judaicos na Cisjordânia como pré-condição para o retorno à mesa de negociações. Apesar de que tal reivindicação seria algo até bastante razoável, a mensagem do presidente Abbas é de que está disposto a negociar desde já. Este é um enorme avanço no conflito, muito embora o cenário atual interno nas questões políticas palestinas não lhe seja nada favorável. A Autoridade Palestina nunca esteve tão enfraquecida. 

O conflito entre Israel e o Hamas foi muito favorável a este último, mas nada lucrativo à AP. O erro estratégico do atual governo de Israel foi quase infantil, a não ser que tenha sido proposital (em qualquer dos casos, é muito ruim). Se o objetivo da guerra em Gaza era enfraquecer o grupo radical que se apoderou do território, o resultado prático da ação foi exatamente o oposto. Lembro que, como escrevi por aqui tantas vezes, o objetivo estratégico do Hamas é conseguir legitimidade regional. E, graças a Israel, o grupo jamais foi tão bem sucedido; além de ter obtido um cessar-fogo depois de mais de mil mísseis lançados sobre o sul de Israel, demoveu as forças israelenses de realizarem uma incursão terrestre e, para completar, ganhou prestígio interno entre os palestinos e internacional (nos países árabes e islâmicos), fortalecendo a aliança com o Irã. Ainda por cima, o Hamas agora dialoga diretamente com atores regionais importantes, como Egito, Turquia e Qatar. 

Para completar, autoridades de Israel estão no Egito para negociar com o Hamas (possivelmente, através de contatos indiretos) o estabelecimento da segunda fase do cessar-fogo que envolve o relaxamento das medidas restritivas à circulação de produtos e pessoas em Gaza. Toda esta mudança de cenário se deve à guerra recente, transformando o enfraquecimento da Autoridade Palestina e a ascensão do Hamas num recado prático muito perigoso. As escolhas erradas do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu acabaram por deixar de fora do processo Mahmoud Abbas, presidente da única autoridade política palestina que, desde os acordos de Oslo, negocia com Israel (a concepção da AP, inclusive, é fruto desses acordos). A única chance de reverter este quadro e fortalecer quem faz política é apoiar o pedido de reconhecimento do presidente palestino na ONU. 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Egito: importante é entender como será a nova constituição


Novamente, o Egito se aproxima de uma nova convulsão política. Apesar de não ter sido o palco do início da Primavera Árabe – o primeiro episódio de revolução popular aconteceu na Tunísia –, o país acabou marcado como o centro desta busca por uma nova ordem social e política. Ou, para ser mais preciso, o ponto mais importante de um breve instante árabe onde um movimento popular, espontâneo e sem uma liderança específica pretendia construir um novo pacto. Fundamentalmente, os egípcios foram às ruas porque queriam uma nova realidade que lhes desse emprego e perspectivas concretas do estabelecimento de um futuro melhor.

Todo este processo pegou o mundo todo de surpresa e deixou países importantes do Ocidente em situação constrangedora. Todos os atores mundiais do lado de cá do planeta estavam alinhados ao ditador Hosni Mubarak. Como escrevi tantas vezes, por uma razão bastante simples: política é constituída basicamente de pragmatismo, por mais que, pragmaticamente, diga-se de passagem, os líderes internacionais queiram dar roupagem moral ao que dizem e fazem. A Primavera Árabe foi, na prática, uma contestação nacional às diretrizes históricas das relações mantidas com o ex-presidente egípcio Hosni Mubarak.

Agora, pouco tempo depois de tudo isso, a Irmandade Muçulmana está no poder. Questionada internacionalmente por suas raízes islâmicas e seu discurso radical que ameaçava a mínima ordem regional, o receio de boa parte dos líderes ocidentais ao movimento começou a ser descontruído na semana passada. Graças à atuação direta do presidente egípcio Mohamed Mursi, da Irmandade Muçulmana, o também movimento islâmico Hamas (oriundo de seu “pai” ideológico no Egito) e o Estado de Israel aceitaram o cessar-fogo que pôs fim a oito dias de guerra aberta em Gaza e no sul do território israelense. Os temores quanto às perspectivas de o maior país árabe do mundo ser comandado pela Irmandade Muçulmana começavam a ser acalmados.

Mas no dia seguinte a este gesto que mostrava tamanho pragmatismo, Mursi pôs novamente os egípcios na praça Tahrir. Demitiu o procurador-geral, destituiu os poderes do Judiciário e declarou que toda decisão do presidente está imune a quaisquer questionamentos legais. Isso tudo acontece no momento em que o país discute a redação de uma nova constituição que irá definir, entre outros assuntos, o papel que a religião terá na realidade política e no dia a dia. Segundo Mursi, a decisão atual é necessária para que a constituição seja concluída.

No entanto, é bom fazer o seguinte esclarecimento de forma a compreender porque a Irmandade Muçulmana foi a grande vencedora nas eleições presidenciais; durante os mais de 30 anos de governo Mubarak, o grupo se estabeleceu como única oposição organizada ao governo, apesar de clandestina. É até natural que tenha vencido com folga durante a realização da primeira disputa política democrática. Se a decisão de Mursi soa simplesmente como antidemocrática – e é por isso que as pessoas estão cobrando publicamente no Cairo –, é importante deixar claro que o presidente egípcio destituiu juízes que, em boa parte, foram indicados ao cargo ainda durante o regime de Hosni Mubarak.

Não me parece que o atual presidente queira tomar o poder para si, mas garantir a redação da constituição. E considero este o ponto mais relevante; o conteúdo da futura nova carta magna do maior país árabe do mundo, um dos pilares fundamentais do Oriente Médio. É isso o que está em jogo a partir de agora.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Guerra em Gaza: os significados do cessar-fogo


Finalmente, o cessar-fogo entre Hamas e Israel foi anunciado. Sob muita pressão internacional, o aparente concerto de forças foi obtido graças ao pragmatismo de todas as partes envolvidas. No Oriente Médio, pragmatismo pode ser interpretado como uma enorme evolução. No entanto, é bom deixar claro que esta guerra aconteceu por conta de objetivos estratégicos de todas as lideranças regionais e internacionais. Em meu último texto, comentei sobre os ganhos políticos do Hamas. Para reforçar, acho importante dizer que esses ganhos imateriais foram bem superiores às perdas físicas, ou seja, à estrutura do grupo radical destruída pelos israelenses nos últimos oito dias. 

Na foto, os termos acordados no cessar-fogo

Pode-se dizer que este acordo bastante simples mediado por EUA e Egito representa o que chamo de negociação ganha-ganha-ganha-ganha. Isso mesmo; há quatro atores vitoriosos neste teatro político. Repito: os principais perdedores, como de costume, são os mortos e as famílias do que pereceram em nome desses ganhos estratégicos. Como já tratei das conquistas do Hamas, vamos aos fatos e aos demais vitoriosos a partir deste cessar-fogo:

Benjamin Netanyahu pôde conquistar uma vitória importante; se de fato os grupos radicais palestinos de Gaza segurarem o ímpeto de lançar mísseis sobre o sul de Israel, Bibi não deve ter dificuldades para ganhar as eleições do próximo dia 22 de janeiro. Com a sensação de tranquilidade, ele vai usar a lembrança do conflito recente como uma reafirmação de suas capacidades como liderança política, alcançando esta ilusória paz numa região que nos últimos anos se acostumou a viver sob as constantes ameaças dos mísseis. Ao mesmo tempo, ao agradecer aos esforços dos EUA e creditar a Washington a articulação deste “acordo”, procura restabelecer os laços estremecidos com o presidente Barack Obama, uma vez que as relações entre o presidente americano e o primeiro-ministro israelense foram as piores possíveis nos últimos quatro anos. Com Obama reeleito, Netanyahu precisava encontrar uma maneira de retomar o caminho que leve a um melhor entendimento entre Jerusalém e Washington. Até porque as possibilidades de o líder israelense permanecer no cargo são grandes. E, só para lembrar, estamos falando de um primeiro-ministro que deixou bem claro que o Irã deve ultrapassar a “linha vermelha” na primavera de 2013 – entre março e junho do ano que vem. Não dá para abrir mão do apoio americano neste cenário. 

Obama precisava mostrar serviço no conflito árabe-israelense, e no conflito palestino-israelense, especificamente. Alcançou ambos de uma só vez. O “acordo” atual foi mediado pelo Egito pós-Primavera Árabe. Estamos falando do Egito comandado pela Irmandade Muçulmana, grupo que durante as três décadas de governo Hosni Mubarak permaneceu clandestino. Tempo bastante para servir de inspiração a um grupo palestino em Gaza, que acabou criando o Hamas. Ao exigir dos egípcios membros da Irmandade Muçulmana uma postura pragmática, a Casa Branca, de certa maneira, dá ao grupo o molde que lhe convinha, fazendo-o reconhecer Israel e os acordos (e agora sem aspas) de paz firmados por israelenses e palestinos em 1979. Por sua vez, o Egito se livrou de um grande problema. Articulando o acordo e deixando claro que se solidarizava com as perdas palestinas, não precisou “trair” sua origem. Ao mesmo tempo, conseguiu se safar de uma custosa saia-justa internacional. Mergulhar no radicalismo certamente mergulharia o país no isolamento. E isso significaria perder aliados e dinheiro, claro. 

No final disso tudo, Israel e Hamas se reconheceram mutuamente ao longo desta guerra e, principalmente, ao acatarem este cessar-fogo. Se isso já havia sido feito em 2009, agora está ainda mais explícito, principalmente porque autoridades de alto escalão de Israel admitiram que estavam em conversações com o Hamas. Se por um lado todo este pragmatismo soa como evolução, como escrevi, há no meio de tantos vitoriosos um perdedor importantíssimo: a Autoridade Palestina, relegada à Cisjordânia. Muito mais pragmática e certamente menos radical do que o Hamas, a instituição atravessa seu pior momento. Principalmente porque um dos termos deste acordo prevê que, 24 horas depois que ele entrar em vigor, as partes – Israel e o Hamas – se comprometem a debater a flexibilização do bloqueio a Gaza e a livre movimentação de bens e pessoas. Ou seja, em oito dias de violência, o grupo radical ganhou mais do que a AP. E se, obviamente, um cessar-fogo é algo muito bom, a mensagem que este conflito deixa para a Autoridade Palestina é muito ruim. 

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Por que a guerra atual interessa demais ao Hamas


No último post, comentei sobre as muitas formas como a atual guerra entre Israel e o Hamas se relaciona com o jogo geopolítico regional. Mas é importante lembrar também que as duas partes estão muito interessadas em se promover internamente. É bem possível, inclusive, que o Hamas tenha provocado a crise atual em função de suas muitas derrotas internas – causadas também, é claro, pelo parcial, mas representativo, sucesso da Primavera Árabe no Egito. 

Desde a última guerra entre israelenses e palestinos em Gaza, entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009, o Hamas aceitou o cessar-fogo que impedia o grupo de lançar novos mísseis sobre o sul do território de Israel. Apesar disso, no entanto, outros grupos radicais palestinos, como a Jihad Islâmica, continuaram a efetuar disparos. Muitas vezes, no entanto, esses grupos foram cerceados pelo Hamas, autoridade máxima sobre Gaza desde a expulsão – pelos próprios membros do Hamas – do Fatah (grupo que compõe majoritariamente a Autoridade Palestina), em 2007. Até agora, por mais que o Hamas fechasse um olho para os demais grupos radicais que atuavam em Gaza, a manutenção do cessar-fogo era de seu interesse. Era. 

A visão estratégica do Hamas mudou em virtude de alguns fatores: o primeiro deles foi a eleição da Irmandade Muçulmana para a presidência do Egito. O grupo radical e clandestino durante as três décadas de governo Mubarak passou a autoridade máxima e oficial egípcia, como escrevi no último texto. As esperanças do Hamas se renovaram, afinal tratava-se da facção originária do próprio Hamas, que, nos últimos 30 anos, se opôs ao regime de Hosni Mubarak e, portanto, a todos os compromissos assumidos pelo presidente egípcio deposto: alianças com os EUA, manutenção dos acordos de paz com Israel, vigilância na fronteira entre o Egito e Gaza, repressão ao tráfico de armamentos do território egípcio ao palestino. O Hamas acreditou que tudo iria mudar a partir da presidência de Mohamed Mursi, membro da Irmandade Muçulmana. 

No entanto, nada disso aconteceu. Muito pelo contrário. Mursi manteve os acordos de paz com Israel – até agora – e também a vigilância sobre Gaza, a rigidez no controle de entrada e saída do território, a aliança com Washington, a cooperação militar com os israelenses para controlar o tráfico e a movimentação no deserto do Sinai e ainda impediu sempre que pôde a construção de túneis por onde passam bens e armas para o interior do território palestino. Para piorar o isolamento do Hamas, seus adversários internos ganhavam cada vez mais: no território, a manutenção do cessar-fogo era vista como capitulação, dando ainda mais moral para outros grupos radicais que agem em Gaza. Já na Cisjordânia, o presidente Mahmoud Abbas – do Fatah e chefe máximo da Autoridade Palestina – prepara-se para conseguir que a ONU conceda à Palestina o status de “observador”. Ou seja, o Hamas perdia de dois lados: no político, seu ponto fraco, e no militar, perfil original do grupo e seu modo tradicional de agir. 

Por tudo isso, o Hamas considerou que havia chegado a hora de mudar de estratégia, aliando-se aos demais grupos que lançaram ao longo de todo este ano mais de mil mísseis sobre Israel e colocando em uso as armas presenteadas por seu Estado-patrocinador, o Irã. Até o momento, parece-me que a decisão do Hamas foi vitoriosa, sob o ponto de vista de seus objetivos internos e externos. As imagens de israelenses indo ao chão em Tel Aviv para se proteger dos mísseis fazem sucesso junto ao público interno. Tanto que, neste final de semana, numa passeata na Cisjordânia – território do Fatah, grupo rival ao Hamas – as bandeiras verdes do Hamas eram preponderantes às amarelas, do Fatah. Do ponto de vista mais amplo, a atual ofensiva pôs lado a lado os primeiros-ministros egípcio e do próprio Hamas, mais uma vitória importante. Como de costume, quem perde com todo este jogo político são os civis inocentes, que pagam com suas vidas. 

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

A nova guerra entre Israel e o Hamas e o novo jogo politico do Oriente Medio apos a Primavera Arabe no Egito

Em primeiro lugar, peco desculpas aos leitores pela demora em escrever, mas isso se deve ao fato de estar distante da estrutura necessaria para postar com a frequencia que o momento demanda - o que tambem explica a precariedade dos recursos ortograficos deste texto. Mas vamos ao que interessa; a ofensiva israelense em Gaza e a insercao dos acontecimentos atuais no tabuleiro geopolitico do Oriente Medio. 

Ao contrario da cobertura pontual da grande imprensa, estou sempre preocupado em contextualizar as acoes dos atores regionais em perspectiva, levando em consideracao seus interesses estrategicos. O novo embate entre Israel e Hamas deve ser interpretado desta forma, muito alem de mais um ato isolado. Politica internacional e sua expressao militar - a guerra - nao costumam acontecer por meio de bravatas, discursos ou gestos apaixonados. Muito pelo contrario. E claro que a ofensiva atual tem a ver com o risco de cerca de um milhao de habitantes do sul de Israel, quase 15% da populacao total do Estado judeu. Mas nao e so isso. Os moradores desta regiao do pais sofrem com a ameaca do misseis do Hamas ha muito tempo, e a ofensiva de Israel no final de 2008 nao conseguiu destruir a infraestrutura de lancamento do grupo palestino que passou a controlar o territorio no ano anterior. 

Na semana passada, um jipe do exercito israelense foi atingido durante uma patrulha de rotina no interior das fronteiras israelenses. Tratava-se de uma operacao de rotina nas proximidades de Gaza. Por mais estranho que pareca, este pequeno ato carrega em si um significado muito maior; do ponto de vista geopolitico, ele representa um movimento de medicao de forcas pelo Hamas bastante similar ao crescimento continuo do Hezbollah, no norte de Israel, sul do Libano, que consolidou a milicia xiita como um importante ator regional do Oriente Medio. Ate o ano 2000, Israel manteve uma zona de ocupacao no sul do Libano, isolando minimamente o Hezbollah de porcao importante de sua fronteira norte. Por pressao interna da sociedade israelense, as forcas militares foram retiradas e Israel desocupou o sul do territorio libanes unilateralmente. Imediatamente, a milicia xiita passou a controlar a area e usa-la como base de operacoes. Seis anos mais tarde, Israel e o Hezbollah travaram uma guerra de 34 dias que permitiu ao grupo libanes, apoiado logistica e financeiramente pelo Ira, alcancar um de seus objetivos estrategicos: estabelecer-se como um ator regional a ser levado em consideracao em qualquer cenario atual do Oriente Medio. 

A atual ofensiva de Israel tem como meta conter a expansao do Hamas, principalmente por conta da realidade egipcia pos-Primavera Arabes, cujos resultados eleitorais deram a presidencia do pais justamente a Irmandade Muculmana - fonte de inspiracao ao nascimento do proprio Hamas, em 1987. Na pratica, tanto Israel quanto o grupo radical palestino estao colocando em teste o papel da Irmandade Muculmana neste novo Oriente Medio. 

O grande teste fica sobre os ombros de Mohamed Mursi, chefe politico da Irmandade Muculmana no Egito e eleito presidente do pais. Um dos principais pilares da fragil estabilidade regional, o Estado egipcio, o maior pais arabe, esta sendo chamado a se manifestar. Ao mesmo tempo em que a Irmandade Muculmana possui obvia identificacao com o Hamas, o grupo deixou a clandestinidade dos anos de regime Hosni Mubarak e passou a formalidade de ser parte integrante da formalidade e das burocracias impostas por esta transicao. Por mais ideologico que seja, o presidente Mursi agora nao pode virar as costas ao principal aliado financeiro do pais, os EUA, nem aos acordos de Camp David, assinados em 1979 e que selaram a paz com Israel. Ou melhor, a pressao atual quer que o Cairo faca sua opcao. No entanto, e bom lembrar que, se rasgar os acordos com os israelenses, e pouco provavel que os americanos continuem a repassar os tres bilhoes de dolares em ajuda financeira ao Cairo. 

E tudo isso que esta em jogo agora no Oriente Medio.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Obama tem missão duríssima na área internacional


Sobram desafios para as relações internacionais a serem conduzidas por Obama “reloaded”. A cada dia mais cidadãos comuns compreendem que não é possível agir como no século 20. Assim, se política externa ainda não é um tema decisivo na vida das pessoas, ignorar as muitas e importantes decisões internacionais que o presidente deve tomar não é uma opção. 

Obama é certamente o mais internacionalista dos presidentes dos EUA. E todo mundo aposta que, neste mandato, irá agir com firmeza no cenário global. Com a garantia de mais quatro anos, a Casa Branca tem muitos assuntos urgentes a resolver. A situação na Síria, o fim da guerra do Afeganistão, a transição política chinesa, o nacionalismo russo e o projeto nuclear iraniano são as questões mais importantes e estão na agenda do dia de Washington. 

A guerra civil síria já completou 20 meses. Até agora, os EUA se recusaram a fazer grandes movimentos. Isso porque, como escrevi por aqui outras tantas vezes, os americanos têm pouco interesse em sacar Assad. Não porque têm grande apreço pelo presidente sírio, mas porque o país é – embora injusto com seus cidadãos – estável. A administração alauíta do presidente sírio conseguiu estabilizar a Síria, inclusive mantendo a fronteira com Israel em relativo estado de tranquilidade nos últimos 40 anos – até esta semana, é bom dizer. Agora, no entanto, Washington deve agir de alguma maneira. E não se trata da defesa dos 20 mil mortos pela repressão de Bashar al-Assad. 

A Casa Branca está numa encruzilhada e aprendeu bastante com o fracasso na Líbia. Também como escrevi por aqui outras vezes, os rebeldes líbios eram compostos por gente de fidelidades distintas: membros arrependidos do governo Assad, jihadistas de diferentes grupos e até mesmo terroristas da al-Qaeda (a organização interpretou a instabilidade do país como oportunidade estratégica de alcançar sucesso e contrabalançar o poderoso discurso popular, espontâneo e descentralizado do que se convencionou chamar de Primavera Árabe). A Síria simplesmente não pode se transformar numa nova Líbia pós-Kadafi. Sua posição estratégica e seu arsenal militar colocariam em risco ainda maior a região mais problemática do planeta. 

Ao mesmo tempo, ficar de braços cruzados não é mais uma opção. Principalmente porque o Irã também entendeu que apostar em Assad é sua última oportunidade de contar com a aliança estratégica de um país árabe (localizado na fronteira com Israel, para ser ainda mais claro). Por isso, os EUA vão investir sim na oposição síria, mas sem repetir os erros do caso líbio. Vão estabelecer contatos políticos mais próximos com a oposição a Assad, oferecendo ajuda, mas exigindo garantias de manter proximidade ao futuro governo. E, para complicar, Obama vai ter de investir muito de seu setor de inteligência nesta tarefa, uma vez que a opinião pública americana não pode nem sonhar com mais uma guerra no Oriente Médio. 

Abordo a questão iraniana em próximos textos. 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Nos EUA, reforma migratória passa a ser prioridade republicana


A ressaca moral e política republicana dá o tom do momento exatamente posterior à derrota do partido nas urnas. Se uma mensagem ficou clara o bastante no dia seguinte à reeleição de Barack Obama, ela diz respeito ao caminho demográfico inevitável dos EUA. Como escrevi ao longo deste processo desgastante de campanha partidária, ignorar a realidade não é uma forma de alterá-la. O partido Republicano está sentindo isso na pele. 

Agora, a chapa Romney-Ryan é história. Possivelmente, se as ambições do partido de retomar a Casa Branca forem sérias, - e certamente são -, o purismo de dois candidatos identificados com o país que não existe mais – ou melhor, existe na memória e na minoria da representação demográfica – não deve se repetir. Mesmo os mais republicanos dos comentaristas políticos tiveram de admitir a necessidade de mudança interna; ou a legenda se adequa para conseguir minimamente se comunicar com as pessoas ou está fadada, invariavelmente, à derrota. E é a partir desta constatação que os republicanos já pensam no senador pelo Estado da Flórida Marco Rubio como o nome a ser lançado em 2016. 

É uma boa aposta, mas não garante vitória. Primeiro, será preciso mudar o discurso. Enquanto os republicanos não pensarem numa forma de encarar a questão da imigração de maneira mais flexível, os latinos não irão votar num partido que chegou a propor, inclusive, “autodeportação”. Pois é. Ninguém vai votar em quem defende a deportação de um primo, de um tio, de um amigo. Mesmo que Obama tenha sido um dos presidentes mais rigorosos quanto à fiscalização e policiamento da fronteira com o México, ao menos consegue se apresentar como liberal. E acho mesmo que o presidente irá pensar numa reforma, mesmo tendo de enfrentar a resistência de uma Câmara dominada pelos republicanos. Mas, se até o porta-voz da casa, o nada liberal John Boehner, já disse que o assunto deve andar, é capaz mesmo de a tão discutida reforma migratória sair do papel. 

Acredito que, inclusive, este será um dos grandes temas dos próximos quatro anos de mandato de Obama. Justamente por conta desta constatação eleitoral de que não é mais possível ignorar a nova cara dos EUA. Para azar dos republicanos, no entanto, a situação é de cobertor curto. Se contarem somente com a origem do senador Marco Rubio, ainda não terão resolvido o problema. Principalmente porque são os asiáticos, não os latinos, que compõem a minoria com os maiores índices de crescimento. 

De fato, acho que a declaração de John Boehner – reconhecido por sua inflexibilidade – não é de graça. Ele e os republicanos mais ambiciosos politicamente sabem que, além de mudar o discurso, será preciso tomar medidas práticas. E aí voltamos à reforma migratória. Se este assunto era visto pelo partido como tabu, agora seus membros mais sagazes perceberam que esta se configura como a principal oportunidade republicana de renascimento.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Reeleição de Obama é a vitória da “Nova América”


Para alívio da maior parte do planeta, Obama venceu. A lógica dos colégios eleitorais favoreceu o presidente, mas sua vitória foi ainda mais significativa: a estratégia democrata também foi vitoriosa e mostra a capacidade do partido de entender quem são os novos americanos, quem representa sua base de apoio e como falar com eles. A mudança que Obama prometia em 2008 não veio como se imaginava, até por conta da herança catastrófica deixada por Bush. Mas a “mudança” que determinou o resultado dessas eleições é tão significativa quanto o slogan da campanha de quatro anos atrás: um novo país está nascendo e foi ele que emergiu fortalecido das urnas. 

Obama sabia que sua base de apoio excluía, em boa parte, o extrato social que compunha o imaginário dos EUA: homens brancos cristãos. Essa parcela da população – que durante a maior parte da história americana foi o retrato do país – está diminuindo. E, com isso, o quadro político também está mudando. Obama não apenas é parte desta mudança como cidadão, mas também representante político voluntário dessas pessoas. Quero dizer com isso que o presidente sabe o que a “Nova América” espera dele, mas também se coloca como parte deste grupo. O voto em bloco de todas as minorias em Obama determinou sua vitória. 

A estratégia democrata simplesmente adequou três fatores simples: o discurso natural de Obama (ou seja, ele não precisou se “violentar” para reafirmar valores que já eram seus), o aspecto ideológico do partido, e a interpretação óbvia de dados sobre o tecido social e populacional americano disponíveis a quem quisesse consultá-los; segundo os números do censo norte-americano, na primeira década deste século, a taxa de crescimento dos cidadãos americanos de origem asiática foi de 43,3%. A população negra cresceu 12%, e os latinos, 43%. O crescimento da população branca foi de apenas 5,7%. Hispânicos, negros e asiáticos correspondem hoje a 50,4% do total de crianças nascidas nos EUA. 

Nas urnas, deu a lógica. Entre os latinos, 70% votaram em Obama; entre a população negra, 96%. E Obama foi vitorioso não apenas por ele mesmo ser negro, mas porque inclui as minorias em seu discurso, porque as considera parte dos EUA, porque não se nega a debater e escutar o que pensam, porque é parte de um partido que tem esta tradição. É natural que as pessoas identifiquem o presidente como alguém que os representa. Principalmente porque, do outro lado, os republicanos insistem em fazer escolhas que remetem à “Velha América”, um país conservador branco e que não faz nenhuma questão de esconder sua preferência pela população mais rica. A rejeição ao Obamacare e à ideia do presidente de taxar a parcela mais rica dos americanos acabou não convencendo negros e latinos de que os republicanos os representavam. De acordo com pesquisa do Centro Conjunto para Estudos Políticos e Econômicos, em 1940, 42% dos negros entrevistados se declaravam republicanos (índice similar aos que se declararam democratas). Quatro anos atrás, 76% se assumiram como democratas e somente 2%, republicanos. 

A derrota nas urnas na eleição desta terça-feira é apenas uma constatação de que os republicanos erraram a mão e encontram cada vez menos apoio – o Tea Party é um movimento forte, mas extremamente “nichado”. Por isso, em declaração à CNN, Steve Schmidt, estrategista do partido Republicano, classificou o resultado e a campanha como uma grande catástrofe. “Esta é, esta deve ser, a última vez que que o partido Republicano tenta vencer desta maneira”. Ou seja, excluindo a realidade de que o país está mudando e se colocando como representante dos EUA do passado, cuja população tende a se tornar cada vez mais minoritária. Se os republicanos insistirem em adotar a mesma estratégia, já podemos começar a pensar em qual candidato democrata irá suceder Obama daqui a quatro anos. 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Eleições americanas: hoje os EUA começam a escrever mais um capítulo histórico


É isso aí, pessoal. Hoje é o ponto final da campanha pelo cargo político mais importante do planeta. E os meses que antecederam o dia de hoje foram para lá de sujos. Os candidatos usaram todo tipo de armas retóricas e empenharam milhões de dólares para se atacar mutuamente. De longe, Mitt Romney foi quem mais se expôs. E o fez, inclusive, de maneira irresponsável, como no vídeo vazado que quase encerrou sua carreira política, quando o candidato deixou claro que Obama necessariamente receberia 47% dos votos daqueles que “se vitimizam e vivem graças à ajuda do governo”. 

Cheguei a publicar, na época, que este episódio poderia não apenas acabar com as chances do republicano, mas enterrar sua carreira política. Errei feio. Estamos falando dos EUA, país que sempre nos surpreende com reações como a ocorrida; Romney não apenas deu a volta por cima, como também empatou com Obama, ultrapassando o presidente na contagem total dos votos. Vai entender. A campanha americana é suja, mas a verdade é que aqui no Brasil não estamos em posição de garantir que nossas eleições presidenciais sejam o grande espaço elegante e desinteressado para o debate de ideias. Basta lembrar o que aconteceu na última disputa, quando o então candidato José Serra foi atingido por uma bolinha de papel e, como tentativa de capitalização política do ocorrido, chegou a fazer uma tomografia. Setores que o apoiavam, inclusive na imprensa, classificaram a bolinha de papel como um “atentado à democracia”. Isso sem falar que, durante parte da campanha, o debate se polarizou entre a defesa e o ataque ao aborto. Pois é. 

No caso dos EUA, Romney se excedeu em inverdades a ponto de seu assessor-chefe dizer claramente que “não permitiria que a campanha fosse regulada por quem checa fatos”. A mentira estava liberada oficialmente. E assim ocorreu, a ponto de Steve Benen, responsável pela redação do blog de Rachel Maddow, da MSNBC, contar 917 dados e fatos errados usados a favor de Romney.

Do ponto de vista ideológico, o embate Romney e Obama foi limitado; os dois candidatos entenderam que o público queria soluções para os problemas econômicos e acabaram focados no assunto. A parte ideológica também seguiu o lastro da economia, e o partido Republicano tentou transformar o presidente num porta-voz do socialismo. O vice de Romney, a estrela em ascensão Paul Ryan, chegou a declarar que as ideias de Obama representam “uma ameaça aos valores ocidentais” (!). Isso porque os republicanos distorcem o conceito de livre mercado e papel do governo. Para eles, o livre mercado é a forma de recompensar justamente quem trabalha. Qualquer intervenção, qualquer tentativa de equilibrar a desequilibrada relação entre empresas e os cidadãos, põe em risco os empregos e a criação de riqueza. Entrevistado pelo New York Times, Rich Hart, professor de economia e mentor de Paul Ryan, disse temer que os EUA se transformem numa espécie de “Estado socialista europeu”. Está aí a visão simplória republicana. 

Para sorte de Obama, os deslizes de Romney acabaram sendo divulgados com mais impacto nesta reta final. Os dados equivocados sobre as montadoras Chrysler e GM sobre os quais comentei no último texto pegaram muito mal. E ainda tiveram importância maior justamente por afetarem a população de Ohio, um “swing state” onde a indústria automobilística é grande empregadora. Agora, para piorar o lado republicano, surge a notícia estranhíssima de que o ex-presidente George W. Bush proferiu uma palestra secreta nas Ilhas Cayman e seus participantes foram orientados a não comentar, em nenhuma hipótese, o que Bush disse durante o encontro. Pegou muito mal. Ainda mais porque, não custa lembrar, o próprio Mitt Romney possui 25 milhões de dólares investidos em fundos nas Ilhas Cayman. E a Bain capital, antiga empresa do candidato e fonte de seu sucesso financeiro, possui 138 investimentos no arquipélago e 40 contas secretas. A partir de hoje, dia 6 de novembro, saberemos como os americanos entenderam tudo isso. 

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Republicanos divulgam anúncio com dados errados, provocam ira de Chrysler e GM e dão presente a Barack Obama


Aos partidários de Obama, notícias importantes: Romney está cometendo deslizes que podem fazer a diferença nesta reta final de campanha. O candidato republicano está se atrapalhando justamente em questões sobre as quais insistiu em debates e que foram usadas para inventar a imagem de gestor capaz de criar empregos. Este é o foco das discussões envolvendo a disputa presidencial e desde o primeiro momento a equipe de Romney tentou desqualificar as decisões de Obama na área de economia. Agora, isso pode estar sofrendo um revés.

Tudo porque a dias da votação final, Romney decidiu ser ainda mais agressivo no que diz e na publicidade que divulga em anúncios de rádio e TV. Numa polêmica com poucos precedentes na história eleitoral americana, o candidato republicano errou ao afirmar que a Chrysler decidiu levar a produção para a China, e a General Motors estaria a ponto de transferir 15 mil postos de trabalho também para o país comunista.

Este tipo de acusação cala fundo no imaginário do cidadão americano médio e, mais ainda nos dias de hoje, por algumas razões: a indústria automobilística sempre foi um ramo fundamental da economia do país; implica a GM, uma das empresas mais simbólicas dos EUA; e, finalmente, reafirma o poderio econômico chinês – e a China ocupa hoje a mesma posição representada pelo Japão nos anos 80, a de país que, em questão de tempo, se nada for feito, ultrapassará a capacidade econômica americana. Isso não vai acontecer, mas este temor mexe com os sentimentos e preocupações dos americanos.

As acusações de Romney visavam a um alvo cirúrgico; o estado de Ohio, considerado um importante “swing state”, ou seja, um estado que normalmente não está alinhado a nenhum dos dois partidos e, portanto, tem resultado indefinido. Não por acaso, o tom alarmista quanto aos postos de trabalho no setor automotivo foi adotado justamente em Ohio, onde 850 mil empregos são diretamente dependentes da indústria automobilística. Seria um golpe de mestre, se os dados não estivessem errados.

A resposta aos anúncios republicanos não partiu da campanha democrata, mas das próprias empresas citadas, algo que raramente acontece principalmente porque as corporações evitam se manifestar publicamente sobre questões eleitorais. Mas, como foram mencionadas diretamente, se sentiram pressionadas a dar declarações oficiais desmentindo as informações divulgadas por Romney. A Chrysler disse que, de fato, está mesmo aumentando a produção na China, mas o objetivo é estritamente a venda no mercado chinês, não no americano; ainda acrescentou que a produção para o mercado americano permanece nos EUA. Já a resposta da GM soou ainda mais constrangedora aos republicanos.

Segundo a GM, o corte de 15 mil postos de trabalho aconteceu antes de 2009 – justamente quando o presidente Obama conseguiu aprovar o resgate governamental, salvando a empresa. Para piorar o lado de Romney, a GM seguiu adiante e declarou que, a partir do resgate, novos empregos foram criados. Se a campanha democrata decidir pisar fundo, tem material pesado para contra-atacar. Vale dizer que, pesquisas divulgadas nesta quarta-feira, mostram a vitória de Obama em 11 dos 13 “swing states”.