sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Discursos, bobagens e cultura política americana

As eleições americanas de novembro estãoempatadas. Inacreditavelmente, os cidadãos dos EUA estão divididos sobre quem devem eleger. Digo inacreditavelmente porque Obama está a léguas de distância de Mitt Romney. Obama tem alguma visão sobre bem-estar social, aprovou a reforma da saúde e enfrenta as dificuldades naturais de um dos momentos econômicos mais complicados do país. Mitt Romney promete cortar impostos, reduzir o papel do Estado na vida das pessoas e criar empregos. 

Mas como levar a sério que Romney pode ser o criador de milhões de postos de trabalho se, justamente, sua carreira de empresário bem-sucedido se baseia no corte de postos de trabalho das empresas adquiridas pela sua corporação? Este tipo de pensamento não é nada justificado, mas os americanos têm outras formas de justificar o voto no candidato republicano. A linha de raciocínio é ainda mais individualista: se o país vai mal e há menos empregos, a única maneira de aliviar o impacto desta situação na minha vida pessoal é reduzindo o papel do Estado, que, por sua vez, irá ter menos programas de governo e, finalmente, poderá deixar de cobrar muitos impostos. 

Romney fala para essas pessoas principalmente. A parte ideológica desta estratégica política é igualmente rasteira. Fácil de explicar: se Obama quer um governo maior, se aprova a reforma da saúde – que estende os benefícios de saúde à população mais pobre –, é porque ele é socialista. E ser socialista nos EUA mexe com a memória do americano médio, a memória de tempos de Guerra Fria. Ser socialista nos EUA é, para boa parte dos americanos, uma ofensa grave que culmina com algo ainda mais sério; ser socialista colocaria em dúvida o próprio patriotismo. As críticas a Obama estão recheadas desta lógica(?) – tanto que os republicanos mais raivosos, os do Tea Party principalmente, não desistem de tentar provar que o atual presidente não teria nascido em território americano. 

Em meio a tudo isso, Mitt Romney acelera fundo quando se trata de aprofundar a visão republicana – e, novamente, principalmente do Tea Party – do que se chama de “American exceptionalism”, conceito que singulariza os EUA em relação a todos os demais países, tornando-o especial por definição. Sobre isso, recomendo a série Newsroom, criada por Aaron Sorkin e exibida no Brasil pela HBO. Os primeiros minutos do primeiro capítulo mostram a visão crítica de um jornalista americano a respeito disso. Seja como for, a disputa pelo cargo político mais importante do planeta será repleta deste tipo de besteira, dessas batalhas conceituais que não resolvem nenhum dos muitos impasses que estão diante dos EUA nesses dias. 

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