Na Tunísia, o assassinato de uma das principais lideranças políticas de oposição do país fez com que o mundo mais uma vez voltasse os olhos para o berço da chamada Primavera Árabe. Em janeiro de 2011, a revolta popular conseguiu derrubar o então presidente Zine al-Abidine Ben Ali, dando início a um processo que mudaria não apenas a realidade do Oriente Médio, mas também criando um dos mais importantes eventos políticos e sociais do século 21. A situação na Tunísia parecia até certo ponto resolvida, principalmente porque a população e as instituições nacionais conseguiram realizar eleições limpas, permitindo que um novo governo – eleito pelo voto da maioria – assumisse o poder.
Mas um tiro disparado contra Chokri Belaid acendeu o sinal de alerta. Não somente porque soa muito estranho que uma das principais vozes críticas ao governo seja para sempre calada pela violência, mas também porque coloca em xeque o próprio processo da Primavera Árabe. Assim como em Egito e Líbia, a Tunísia ainda não havia conseguido revolucionar a vida dos cidadãos comuns, que foram às ruas, de maneira espontânea e apartidária, exigir eleições livres, imprensa livre, emprego e acesso à possibilidade de viver num país mais justo.
É difícil imaginar processos políticos regionais importantes como movimentos únicos e restritos a um único país. À exceção de Israel, o Oriente Médio é formado por Estados que apresentam características comuns também naquilo que pode ser considerado negativo; por exemplo, o histórico de líderes ditatoriais que se apoderaram dos cargos e baniram qualquer grupo de oposição. Quando os tunisianos derrubaram Ben Ali, a influência que esta conquista teve sobre as pessoas dos países vizinhos provocou uma onda de manifestações similares e que, de uma forma ou de outra, acabou também alcançando um ponto fundamental em parte deles: a queda de ditaduras históricas.
A dúvida agora, justamente por todas essas questões, é quais os impactos do assassinato de um líder de oposição no processo ainda em curso nos países árabes do Oriente Médio. Principalmente no Egito, o maior país árabe e também um importante pilar estratégico da política regional. Curiosamente, Tunísia e Egito passam por momentos similares: ambos derrubaram ditadores históricos, realizaram eleições e acabaram por eleger partidos islâmicos que dizem ser possível adotar princípios e práticas religiosas ao mesmo tempo em que defendem a democracia. É no mínimo complicado pensar numa forma prática de estabelecer limites, principalmente porque estamos falando de grupos que se mantiveram clandestinos durante os anos de ditadura e que agora precisaram se reinventar para assumir a liderança política.
Na época das eleições na Tunísia escrevi sobre o Ennahda, partido vencedor das eleições e que busca imprimir modelo similar ao da Turquia, onde, bem ou mal, o islamismo político encontrou uma maneira de ser o protagonista bem sucedido de um cenário democrático. O problema é que não se alcança este tipo de equilíbrio bastante complexo de uma hora para outra. E os turcos têm suas próprias particularidades. Resta saber como o tiro que matou Belaid vai influenciar os acontecimentos de agora em diante. As manifestações que já tomam as ruas do país devem prosseguir, até porque a população e a oposição não estão dando sinais de que irão aceitar as soluções paliativas do governo.
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