Escrevi muitas vezes por aqui sobre a Guerra civil síria. O impasse da luta do presidente-ditador Bashar al-Assad pela permanência no cargo já causou cem mil mortes. Como também escrevi tantas vezes, é pouco provável que o mapa da Síria seja o mesmo quando tudo isso terminar. O problema é que a comunidade internacional não apenas se recusa a intervir, mas seu silêncio é interpretado pelo líder sírio como uma folha em branco assinada pelas potências internacionais.
Os responsáveis pela condução da política externa de EUA, Grã-Bretanha e França – além de toda a comunidade internacional representada pela ONU – subestimaram o potencial radical de Bashar al-Assad. Quando a crise síria começou, na esteira do movimento popular que ficou conhecido como Primavera Árabe, a comunidade internacional optou por se resignar. Fruto do fracasso da intervenção na Líbia, mas também das duas guerras que continuam a ser travadas no Oriente Médio (Iraque e Afeganistão) e, acima de tudo, sob o argumento de que a região já é por demais complexa para uma nova ação militar. Soma-se a tudo isso a crise econômica que atingia e continua a afetar dramaticamente EUA e Europa.
Por tudo isso, nada foi feito. Os cem mil mortos passaram a ser contados em estatísticas igualmente silenciosas e burocráticas acompanhadas rotineiramente pela imprensa. Nada haveria de ser feito a não ser fingir que nada acontecia na Síria e aguardar, pacientemente, para que tudo se resolvesse por si. Mas isso não aconteceu, pelo contrário. O tom dramático dos eventos se tornou uma ameaça ainda mais sombria a partir da notícia de que, nesta quarta-feira, dia 21 de agosto, cerca de 1,2 mil civis sírios foram mortos pelas forças leais a Bashar al-Assad por uso de armas químicas. A suspeita é de gás sarin, o mesmo usado por Saddam Hussein, em 1988, contra a etnia curda.
E agora? O cenário de uso indiscriminado deste tipo de armamento deveria, em tese, afetar a comunidade internacional de maneira sem precedentes. Mas esta comunidade internacional é a mesma responsável por dar a Assad a facilidade de empregar gás sarin. Com o avanço dos rebeldes e, principalmente, com a presença de militantes radicais islâmicos entre eles, o líder sírio tem partido para o tudo ou nada. Como já havia usado armamento químico em março deste ano e conseguiu obter a aprovação silenciosa do Ocidente – na medida em que as chamadas potências não fizeram nada para detê-lo –, agora está muito seguro e à vontade para aumentar a dosagem de seu radicalismo. Em nome da manutenção do cargo, em nome da manutenção da unidade territorial e política da Síria. E, como de costume, com a aprovação declarada de Rússia e China. E com a aprovação silenciosa da ONU.
Para concluir este texto, reproduzo abaixo um trecho de um artigo assinado pelo jornalista israelense Ari Shavit, do Haaretz. Faço minhas suas palavras:
“Se civis podem ser mortos por gás em 2013, nos deparamos com o fim do mundo. É o fim de um mundo que se pretende moral e esclarecido. É o fim de um mundo que busca estabelecer uma ordem internacional justa da qual o Oriente Médio faria parte”.
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