Parte dos interessados na situação síria está reunida em Genebra para debater o caos no país e, principalmente, tentar chegar a um consenso. Digo logo de início que é muito pouco provável que isso aconteça, na medida em que bom senso não é exatamente o ponto forte dos envolvidos. A guerra civil já matou 130 mil pessoas, deixou 2,4 milhões de refugiados e deslocou cerca de 6,5 milhões de sírios. Por definição, esta é uma tragédia humanitária cujas proporções serão sentidas ao longo de gerações.
A verdade nisso tudo é que todo mundo errou nas avaliações – eu, inclusive. Todos caímos na tentação fácil de imaginar que bastava colocar os acontecimentos na Síria no mesmo pacote da “Primavera Árabe” e pronto, Assad cairia e, em breve, os atores políticos estariam discutindo caminhos novos, a constituição e o surgimento de jovens lideranças democráticas seria apenas uma questão de tempo. Se admito o erro de avaliação inicial posso me orgulhar de ter mudado de posição muito rapidamente. Já escrevo sobre o fim da Síria tal como a conhecemos hoje há bastante tempo.
Retorno a este assunto porque acho relevante apresentar novamente o mapa da divisão sectária (acima). Já tem muita gente chamado o processo de “balcanização”, como forma de traçar um paralelo entre o que acontece agora e o que ocorreu nos anos 1990 nos Balcãs. Faz sentido sim. Particularmente, concordo com visões mais pessimistas sobre a situação. Isso porque há gente demais lutando no território. E é impossível fazer divisões claras sobre quem está do lado certo; se Bashar al-Assad tem usado todos os meios para se manter no poder (e é o principal responsável pelo genocídio da população de seu país), a oposição não é muito melhor. Um dos grupos mais fortes, o Jabhat al-Nusra, é um braço da al-Qaeda. Esta é a principal razão pela qual as potências ocidentais decidiram evitar participação mais ativa no conflito. Ninguém, claro, quer se associar à al-Qaeda – mesmo que seja para derrubar Assad.
Dito isso, acho que vale partilhar a correta análise do professor Andrew Terrill, especialista em Oriente Médio do Instituto de Estudos Estratégicos dos EUA. Sua visão mais ampla sobre o que se passa na Síria é semelhante ao que tenho dito. O problema no país irá persistir, mesmo se Assad cair:
“(as minorias árabes não-sunitas) também temem o surgimento de um governo democrático num país onde os árabes sunitas superariam eleitores alauítas numa relação de seis para um. Outras minorias que têm cooperado com o regime ao longo dos anos temem a vingança da maioria. Grupos islâmicos não-sunitas (xiitas e drusos) e especialmente os sírios cristãos estão aterrorizados com a possibilidade de combatentes islâmicos radicais assumirem o poder após Assad (...). Estes grupos estão tentando desesperadamente fazer oposição aos rebeldes, mas também procuram evitar a identificação com o regime (de Assad) para que não tenham o mesmo destino dos alauítas quando Assad cair”.
Considerando que a ONU não consegue impor limites práticos a ninguém, a verdade é que pouco provável que algum país estrangeiro consiga evitar mais limpeza étnica quando (e se) a guerra terminar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário