É impossível fazer qualquer análise sobre o Oriente Médio sem levar em consideração as distinções religiosas. A situação na Síria seria resolvida com muito mais facilidade se não fosse por este importante entrave. É ele que está no centro do atual impasse e não se pode imaginar qualquer solução que ignore este assunto. Até agora, nenhuma dos planos ocidentais conseguiu ser criativo o bastante para lidar com a guerra civil de fato na Síria – e, mais ainda, com o conflito étnico-religioso que tomou o país.
A minoria alauíta, da qual a família de Assad faz parte, controla o governo. Num país de maioria sunita, os Assad se cercaram de outro grupo minoritário, os xiitas, para conduzir o país. Ao contrário do que aconteceu no Egito, onde os militares pularam fora da aliança com Mubarak e, sem romantismos, conseguiram derrubá-lo, os postos estratégicos do exército sírio são ocupados por militares xiitas. Bashar al-Assad foi mais esperto que seu colega egípcio e criou uma estrutura capaz de defendê-lo no caso de uma grave crise institucional, como esta que ocorre agora.
Do outro lado, a pressão dos grupos sunitas é enorme. Eles estão por toda a parte nos ataques a Assad. Oficialmente – os governos de Arábia Saudita e das monarquias do Golfo Pérsico – e ilegalmente: os combatentes que integram o tal “Exército Livre da Síria”. Para quem acha tudo isso estranho, uma informação que vai deixar a confusão ainda mais surpreendente: a al-Qaeda está no país e luta junto a este exército. Como o grupo terrorista é sunita, está interessadíssimo em derrubar Bashar al-Assad. Curiosamente, esta é exatamente a mesma posição da Arábia Saudita, um dos principais aliados americanos no Oriente Médio, e dos próprios EUA – que, depois de relutarem em pedir a saída do presidente sírio, agora já admitem que não há solução ao problema sem que o líder político deixe o cargo.
Al-Qaeda e EUA estão do mesmo lado. E, nos últimos tempos, esta não é a primeira vez; durante o processo de queda do presidente líbio Muamar Kadafi, a al-Qaeda não apenas lutou pela deposição do ditador, mas também, na prática, esteve ao lado das forças da Otan. No entanto, se as fidelidades étnico-religiosas do Oriente Médio acabam formando essas estranhas alianças, elas também são responsáveis, em boa parte, pelo impasse atual. Afinal, a dinastia Assad não vai simplesmente atender aos apelos ocidentais e entregar o país aos sunitas. Para se sustentar, recorre ao outro lado da balança: o eixo xiita – que tem no Irã sua expressão regional mais importante.
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