Hoje é sexta-feira e, no dia de orações mais importante da semana islâmica, as manifestações se exacerbam. O clima é de confronto e expectativa por conta do vídeo. Ao longo desses últimos dias, novas visões se apresentaram de forma a interpretar o que está acontecendo globalmente a partir da divulgação do “filme” (trata-se de um trailer tão somente).
Minha forma de olhar para este momento tão estranho é a que já apresentei. Mas não custa repetir: o vídeo é tão somente uma manifestação idiota individual produzida por um sujeito sem qualquer notoriedade – e certamente sem credibilidade alguma – e não havia recebido nenhuma atenção até os aproveitadores de sempre perceberem a oportunidade que a produção precária representava.
E os aproveitadores de sempre merecem menção: o Hezbollah, a milícia xiita libanesa que tem estrategicamente buscado reconhecimento como ator no Oriente Médio (e obtido sucesso, é bom dizer); os fundamentalistas sunitas da al-Qaeda, os maiores derrotados durante a Primavera Árabe e que estão desesperados para minimizar os prejuízos políticos e retomar o poder que perderam; e os menos culpados disso tudo – mas com uma parcela de culpa pela omissão e também pela covardia de não tentar acalmar suas populações –; os líderes árabes egressos do processo de derrocada das antigas ditaduras. Vale também dizer que as manifestações não são somente árabes, mas estão espalhadas por todos os países islâmicos, como Paquistão e Indonésia, por exemplo.
O que está em jogo agora e que tem sido muito bem aproveitado principalmente por al-Qaeda e Hezbollah é a incapacidade de compreensão mútua entre a visão das populações islâmicas e do Ocidente. Se para nós é difícil entender o potencial da ofensa do vídeo, para as pessoas que estão queimando bandeiras americanas nas ruas é incompreensível como possamos não compreender a gravidade de um vídeo jocoso com a figura principal e fundadora do islamismo.
Este é, aliás, um episódio que traduz um dos principais impasses deste início de século 21. E quem sai ganhando com isso são os radicais. São esses grupos os maiores beneficiados pela exacerbação dos ânimos, pela agitação que impede um olhar mais apurado – e menos apaixonado – sobre o assunto. Ora, um trailer de 14 minutos, assistido por até então meia-dúzia de gatos pingados e postado no Youtube, não é, definitivamente, uma demonstração do desprezo ocidental pelo islamismo e tampouco uma manobra política americana (!) para ofender Maomé.
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