Nesta sexta-feira, o senador Cristóvam Buarque (PDT-DF) defendeu o fim de todos os partidos políticos, numa clara tentativa de se posicionar a partir das manifestações populares. Uma declaração como esta não deve merecer elogios, mas condenações.
Escrevi no dia 20 sobre a insatisfação generalizada com a atuação dos partidos e de como a voz das ruas deixava muito evidente não se sentir representada pelas legendas. No entanto, existe uma diferença óbvia entre esta demanda e o fim dos partidos; como também escrevi no texto do dia 20, não me parece que a população esteja questionando o regime democrático.
E esta questão sutil é extremamente relevante no momento atual. As passeatas não podem ser apropriadas por grupos que se aproveitam desta insatisfação para defender o fim da democracia. É possível sim que isso esteja acontecendo e, justamente por isso, as manifestações devem estabelecer um limite claro: criticar partidos, práticas políticas e o próprio Estado brasileiro não pode servir de desculpa para justificar qualquer mudança de regime. A Primavera Árabe e os movimentos Occupy internacionais lutaram para que a população fosse ouvida. A Primavera Árabe especificamente lutava para a construção de regimes democráticos em sociedades que vivem em ditaduras policialescas muitas vezes disfarçadas de democracia graças à existência de partidos políticos únicos ou de oposições artificiais.
Seria um retrocesso do tamanho dos estádios da copa que os movimentos brasileiros fossem sequestrados por grupos que defendem intervenção militar ou mesmo um golpe de Estado. Se os partidos são fracos é preciso fortalecê-los com participação popular, jamais exterminá-los.
O Movimento Passe Livre (MPL) - o mesmo movimento que deu o pontapé inicial deste momento histórico - me parece ter uma visão lúcida sobre essas diferenças semânticas que têm grande impacto prático. Em comunicado divulgado nesta sexta, declarou ser um movimento apartidário, mas não antipartidário. Pereceberam a diferença?
Não existe vida democrática sem partidos políticos. Não existe sociedade livre com parlamento fechado. É preciso esclarecer isso porque em outros momentos históricos o banimento de partidos ou a adesão a um partido único acabaram por resultar em consequências gravíssimas. Em 30 de janeiro de 1933, Hitler foi nomeado chanceler da Alemanha. Logo na sequência, baniu todos os partidos políticos. Não é isso o que as passeatas querem e por isso os manifestantes devem estar atentos aos sinais, mesmo que esses sinais sejam sutis. O início do movimento queria reviver 1968 e tudo o que este ano representou ao mundo. Vamos fazer de tudo para que ele não seja apropriado pelos saudosistas de 1964.
3 comentários:
Embora vivamos num Estado Democrático de Direito pleno, mesmo que imperfeito, o autor tem todo o direito de manifestar seu ponto de vista de que "não existe democracia sem partidos políticos", mas a mesma consciência democrática torna necessário discordar de tamanho equívoco.
Os partidos políticos, originalmente,serviam para reunir pessoas em torno de um mesmo ideal, uma mesma plataforma política.
No entanto, é mais que notório que os atuais clubes partidários brasileiros se desviaram de seu objetivo original. Hoje o que nós vemos é partidos sendo criados à revelia - muitos deles sem qualquer orientação política definida - com o único propósito de dar expressão à figuras políticas pouco expressivas, que não conseguem se projetar nos grandes partidos políticos.
Democracia é o governo do povo! O governo dos grupos, das facções, dos partidos, tem nome: é oligarquia. Mas no Brasil, sem risco de injustiça ou generalidade, pode-se denomina-las de Cleptocracia! O governo regido pelos ladrões e corruptos, onde a vontade soberana do povo não é levada a sério. Onde a casta política vive num Olimpo intocado pelos pobres mortais, que sequer os elegem. Basta conferir que, dos 513 deputados eleitos em 2010, apenas 35 foram eleitos diretamente - os demais foram levados de carona, pelo criminoso sistema proporcional que privilegia os partidos, não os eleitores.
O Brasil precisa de mudança, e se o fim dos partidos políticos oligárquicos que conhecemos for uma maneira para alcançar esse objetivo, que seja feito. Mas nunca pensemos, nem por um instante, que os partidos representam a democracia, pois eles representam apenas a si próprios. É o povo quem representa a democracia - o governo é o espelho de seu povo, não o contrário!
Sr. Ageu Rodrigues, seu ponto de vista eh magistral. Concordo plenamente! Pelo fim da Oligarquia!! Abaixo a Tirania dos partidos!! De-se ouvidos ao povo!!
O povo é o principal agente da democracia. A democracia pode existir sem partido político. Aliás, atualmente no Brasil não existem partidos políticos, mas sim um cipoal de siglas partidárias sem nenhuma identificação ideológica de seus membros.
Assim, é perfeitamente cabível a democracia sem partido político, bastando para isso a implantação da CANDIDATURA AVULSA, sem nenhuma vinculação partidária, acrescida da instituição do VOTO DISTRITAL PURO.
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