Sempre que há oportunidade, faço questão de reforçar a ideia de que, na maioria das vezes, é decepcionante buscar coerência nas relações internacionais. Quem está em busca disso encontra contradições, poucas respostas e muita incoerência. Tudo isso se aplica de forma bastante clara na polêmica que gira em torno deste pré-acordo entre as potências ocidentais e o Irã. Michael Weiss, colunista de política externa e membro do Instituto da Rússia Moderna, escreveu um grande artigo mencionando todas as contradições. Há alguns pontos muito interessantes:
“Nos últimos 30 anos, os EUA mantiveram uma política externa inteligível e com precedentes históricos sobre a República Islâmica do Irã: contenção. A expansão do ‘Khomeinismo’ no Oriente Médio era algo a ser resistido como questão de segurança nacional e internacional. Se nossos aliados regionais podiam concordar sobre algo era quanto a prioridade (da contenção do Irã) bipartidária em Washington: a detenção do Estado que mais patrocinava o terrorismo em todo o mundo...”
“David Petraeus defendeu a posição para o então secretário de Defesa Robert Gates: ‘...acredito que o Irã esteja, de fato, travando uma guerra no Iraque contra os EUA... Acredito que o Irã tenha passado do limite de apenas lutar por influência no Iraque e pode estar criando (agentes, milícias) procuradores para ativamente nos combater... para agir como o Hezbollah libanês no Iraque”.
Petraeus serviu na escala militar americana em diversas posições e chegou a ser apontado como líder da ofensiva no Iraque em 2007.
Michael Weiss opta por contrapor o momento atual de engajamento entre Washington e Teerã ao histórico que, ao longo dos últimos 36 anos, coloca os dois países em lados opostos, chegando mesmo ao combate quase direto. As posições entre Irã e EUA desde a Revolução Iraniana de 1979 sempre foram antagônicas, isso não é segredo a ninguém. Weiss e muitos comentaristas políticos questionam a opção do presidente Obama a partir dessas posições e do histórico de oposição. A resposta a tudo isso foi dada por Obama em seu pronunciamento e na entrevista que serviu de base ao meu texto anterior. Vale expor novamente o trecho em que ele aborda esta questão de maneira bastante direta:
“...em relação ao Irã, um país grande, perigoso e que se envolveu em atividades que resultaram na morte de cidadãos americanos. Mas a verdade desta questão é: o orçamento de defesa do Irã é de 30 bilhões de dólares. O nosso se aproxima de 600 bilhões de dólares. O Irã sabe que não pode lutar contra nós... Você perguntou sobre a Doutrina Obama. A doutrina é: nós vamos nos envolver (engajar, abordar os países, mesmos os rivais), mas vamos preservar as nossas capacidades”.
Obama dá como resposta a qualquer questionamento sobre o envolvimento com o Irã a opção do chamado realismo político. O governo americano busca o pragmatismo como forma de abordagem ao Irã. Se a ideia dos últimos 36 anos era conter os iranianos, está muito claro que isso mudou. A partir deste pré-acordo, o engajamento é prioridade. E engajar é muito diferente de conter, porque implica em conceder. É justamente este dilema que resume a possibilidade da assinatura de um acordo definitivo no final de junho. Se o acordo deixar claro que se trata unicamente de engajamento, o Irã assinará. Se houver traços de contenção, não irá assinar. Para o Irã, a situação é muito simples e muito fácil. Mesmo com sanções afetando o país, a economia local conseguiu sobreviver. O governo conseguiu manter seu programa nuclear. Se entender que os resultados práticos não significam o total abandono da ideia de “contenção”, os iranianos não prosseguirão com o acordo. Resta saber se as potências ocidentais estão dispostas a pagar este preço.
Nenhum comentário:
Postar um comentário