Acabei não comentando sobre as eleições italianas. Mas nunca é tarde. O assunto é muito simples e direto. A insatisfação popular generalizada no país criou uma situação inusitada de impasse político. Se o presidencialismo brasileiro é um exemplo de rapidez, ele é também para lá de binário. É muito pouco provável que a população consiga dar um nó tático no país, mesmo se estiver muito insatisfeita. O parlamentarismo têm suas vantagens, por este aspecto. É isso o que está acontecendo na Itália, onde as pessoas têm razões de sobra para - desculpem o termo - se vingar nas urnas.
Estamos exatamente neste momento. O caos a que a grande imprensa tem se referido é bem fácil de ser entendido. Como o sistema italiano é parlamentarista, para que um novo governo seja formado é preciso haver coalizões entre os partidos. O problema é que, desta vez, nenhuma legenda obteve maioria clara. E aí nenhum líder de partido pode ser declarado o próximo primeiro-ministro porque, na prática, não teria sustentação para aprovar qualquer medida. Pronto, os italianos deram uma chave-de-braço no próprio governo, no sistema e nas instituições.
Os principais partidos do país são os que mais perderam. Mas não sem motivo, é importante dizer. Como continuam a zelar pelo mercado e pelas instituições financeiras internacionais, estão pagando o preço. Desde o início da crise, o dedo do mercado está apontado para os italianos. E a receita que a União Europeia tem aplicado no país é a mesma que insiste em aplicar para todos os demais países da zona do euro. Os índices econômicos são ruins, mas a fórmula mais simples cobra a conta da população. É uma regra tão batida que soa como lugar-comum: austeridade, cortes de empregos, redução de salários, redução de investimento, redução nas aposentadorias. O problema para os grandes estrategistas que elaboram esses planos inócuos é que as pessoas comuns votam. E, para lá de óbvio, é claro que elas são as principais prejudicadas pelos equívocos de gestão. E ainda mais óbvio é que as pessoas comuns esperam soluções de seus governantes, não medidas que representam uma perda atrás da outra e que continuam a não produzir qualquer resultado.
E que ninguém credite ao acaso este impasse político. A insatisfação é coletiva, assim como o protesto nas urnas. Para lidar com as sucessivas determinações absurdas dos políticos, os italianos escolheram a alternativa mais cômica. O Movimento Cinco Estrelas, do humorista Beppe Grillo (foto), tornou-se a terceira principal força do país. Outro fator interessante foi o baixo comparecimento dos eleitores às urnas; normalmente o índice chega a 80%, mas desta vez ficou pouco acima de 40%. O atual primeiro-ministro, Mario Monti, obteve somente 10% dos votos - não por acaso, ele é o tecnocrata alçado à política para resolver parte da crise de desconfiança do mercado...
Para finalizar, vale dar uma olhada de leve na razão de tanta vontade de dar um passa fora nos políticos. O desemprego beira os 12%, o pior índice dos últimos 21 anos; o desemprego entre os jovens bateu 38%, o maior em todos os tempos; em janeiro deste ano, noventa e sete mil empregos foram perdidos em relação a dezembro; se comparado a janeiro do ano passado, aí a situação piora: houve redução de 310 mil vagas.
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