O sequestro num café australiano é um ato terrorista. Na verdade, muito mais do que a reprodução do imaginário sobre o terrorismo, é um dos capítulos iniciais de eventos que devem se desdobrar de agora em diante; quando os atentados de 11 de Setembro inauguraram o século 21, a humanidade foi exposta ao terrorismo em sua configuração clássica: grandes grupos e suas células que passam meses ou anos em preparação, estudos e levantamento de recursos para a realização de ataques. O novo terror é exatamente o oposto disso.
E o evento na Austrália é importante por mostrar ao restante do planeta esta modificação das ações terroristas. Se o início do século 21 apresentou o terrorismo em sua maneira mais organizada, a metade final de 2014 apresenta sua nova versão: a individualização do terrorismo, o que chamo de “terrorismo por inspiração”. O sujeito que sequestrou os clientes e funcionários do café australiano não é um membro formal do Estado Islâmico (também conhecido como ISIS), mas um identificado com sua ideologia e métodos. Certamente tem acompanhado a evolução do grupo desde seu rompimento com a al-Qaeda, certamente é atingido por suas mensagens no Twitter, certamente assiste aos vídeos de decapitações de ocidentais no Youtube. O modo de operação é muito similar ao de outro ataque individual ocorrido em outubro no Canadá. Na ocasião, um homem decidiu por conta própria atacar um soldado canadense em guarda num memorial de guerra e depois invadiu o parlamento. Acabou morto por um oficial.
Os casos são semelhantes e apresentam um novo momento do jogo internacional. A configuração em que qualquer um identificado com o fundamentalismo islâmico age por conta própria e consegue usar praticamente qualquer objeto comum como arma para matar pessoas apresenta desafios complexos às autoridades. Na prática, não há como impedir a realização de ataques desta natureza. E tudo isso mostra como a estratégia específica do IS tem funcionado. Vale lembrar a declaração de Abu Muhammad al-Adnani que se encaixa perfeitamente nos eventos ocorridos na Austrália:
“Se você puder matar um descrente americano ou europeu (...) ou australiano ou canadense ou qualquer outro dos descrentes em guerra – incluindo os cidadãos dos países-membros da coalizão contra o IS –, então confie em Alá e o mate de qualquer maneira (possível)”.
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