Fiquei um pouco reticente de escrever sobre a escolha do Rio, cidade onde vivo e nasci, como sede das Olimpíadas 2016. Primeiro porque, desde o anúncio do Comitê Olímpico Internacional (COI), na última sexta-feira, praticamente tudo o que poderia ser dito sobre o assunto já ocupou colunistas e reportagens; segundo porque, num primeiro momento, a decisão não tem relação direta com o que costuma ser tratado por aqui. Ou será que tem?
O COI é uma entidade privada que seguramente tem mais poder de pressão e barganha do que boa parte dos Estados nacionais. Esta é a premissa importante que, a meu ver, mostra uma mudança que já ocorre há muito tempo na dinâmica das relações internacionais. A FIFA é outro exemplo de organismo que desfruta de livre acesso a líderes e territórios no globo sem o ônus de organizações políticas multilaterais como as Nações Unidas, por exemplo.
Afinal, decisões tomadas na ONU costumam ferir interesses vitais de países – muitas vezes envolvendo questões estratégicas, como determinações acerca de disputas políticas, trocas de prisioneiros, intervenção externa etc. A entidade máxima do futebol, ao contrário, é cortejada sem jamais ter sido ameaçada ou criticada sistematicamente por seus membros.
Para entender melhor como a FIFA age nos bastidores da política internacional, recomendo a leitura de “Como Eles Roubaram o Jogo”, do inglês David Yallop.
De qualquer maneira, a escolha do COI mostra uma mudança nos parâmetros de valorização dos Estados. Receber os Jogos sempre foi uma exclusividade do chamado eixo Helena Rubinstein. A opção pelo Rio representa uma virada significativa e premia itens que vão aos poucos se consagrando relevantes no novo jogo de poder: uma economia em expansão com grande contingente populacional, parte integrante dos BRICs, com crescente e importante presença no cenário internacional e – é válido lembrar – que sofreu poucas consequências da crise que tomou conta do planeta.
Coluna publicada na prestigiada Foreign Policy pontua a relação entre esporte e política evidente desde a última sexta. Lula mais uma vez mostrou ser o cara e sua presença foi fundamental para a decisão do COI.
“O presidente brasileiro será recompensado por sinalizar a crescente influência internacional do país. Ou seja, os Jogos Olímpicos reafirmam a reputação do atual governo como líder entre as nações emergentes”, diz a revista.
A meu ver, no entanto, uma contradição ficou estampada nos comentários sobre a vitória: o fim do tal estigma de “colonizado”, lugar-comum repetido para valorizar ainda mais a escolha do Rio, soa estranho. Afinal, as obras serão realizadas por aqui e a cidade vai mudar graças à pressão e vigilância exercidas pelo próprio COI, instituição sediada em Lausanne, na Suíça, e presidida pelo belga Jacques Rogge.
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