quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Agora presidente da Turquia, Erdogan retorna ao palco

Ainda sobre a ambiguidade turca, vale fazer um contraponto sobre os discursos e declarações do presidente Recep Tayyip Erdogan. Se por um lado ele concorda em combater o IS quando se encontra com autoridades do governo americano em Nova Iorque, por outro manifesta sua retórica independente – e isso significa a construção de abordagem para lá de duvidosa ao grupo terrorista. 

Ancara está prestes a aprovar a adesão de suas forças armadas – o segundo maior contingente da Otan – à coalizão internacional que luta contra o IS. Todos estão aguardando a decisão do parlamento turco. No entanto, vale ler uma parte das palavras de Erdogan em pronunciamento ao público em Istambul: 

“Enquanto a organização terrorista IS está causando desordem no Oriente Médio, no meu país há permanente terrorismo do PKK nos últimos 32 anos e o mundo nunca se importou. Por que? Porque esta organização terrorista (o PKK) não carregava o nome ‘Islã’”. 

Entenderam o que Erdogan quis dizer? Ele abriu uma brecha de interpretação que pode dar a entender que o motivo pelo qual o mundo passou a se importar com o IS tem mais a ver com o fato de se tratar de um grupo autodenominado representante do islamismo. A questão, no entanto, é bem mais simples: a ideia de combater o IS tem pouca ou nenhuma relação com o fato de ser um grupo islâmico (fundamentalista islâmico, para ser bem claro), mas com a barbaridade que marca suas ações e com a promessa que tem feito (e cumprido) de usar a violência diante de qualquer oposição. E oposição neste caso é um espectro enorme que varia desde o simples pertencimento a fidelidades islâmicas distintas à própria existência de fronteiras internacionais. A fronteira turca, inclusive. 

Mas Erdogan não abre mão deste posicionamento ambíguo de nenhuma maneira. Isso porque ele continua a querer se reafirmar como uma espécie de “pai” internacional dos muçulmanos. E, em sua linha de raciocínio bastante trabalhada nos últimos dez anos, mesmo a oposição ao IS poderia ser interpretada como uma adesão aos “valores ocidentais”. Ao mesmo tempo, o presidente turco não quer abrir mão do alinhamento lógico com parceiros estratégicos europeus e, claro, com o governo americano. Mas ele precisa disfarçar isso ao máximo, mesmo ao custo de um eventual isolamento político. 

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