Por que agora? Por que nessas condições? Essas são duas perguntas básicas que muita gente tem feito sobre o fim do atual conflito entre Hamas e Israel. Na minha visão, há respostas a essas duas questões.
Em primeiro lugar, é preciso esclarecer o que menciona este acordo de cessar-fogo: Israel irá permitir a passagem de ajuda humanitária e material de construção pelos postos de controle. Também vai permitir pesca no limite de até 9,6 km de distância da costa. O ponto de passagem de Rafah, na fronteira entre Gaza e Egito, será reaberto. As próximas negociações devem acontecer daqui a um mês.
Dito isso, vamos às principais perguntas:
Israel diz que este cessar-fogo é exatamente o mesmo apresentado pelo Egito – e com o qual os israelenses concordaram – em 15 de julho, uma semana, portanto, após o início do conflito. A diferença principal é que, naquele momento, o Hamas não havia conquistado os objetivos estratégicos atuais (mesmo que às custas de milhares de vidas palestinas, com as quais o grupo não se importa minimamente). Agora, o Hamas reforça seu papel de “resistência” e marginaliza a Autoridade Palestina no processo político interno e regional. Para completar, trouxe, mesmo que não totalmente, o Qatar, seu principal financiador, para o centro das negociações.
Além disso, sob o ponto de vista do prolongamento da retórica de resistência, fazer a guerra perdurar por 50 dias permitiu ao Hamas dois ganhos: afirmar ser capaz de sobreviver a um conflito de médio prazo com Israel; e causar quase 70 baixas ao Estado judeu, lançando mais de 4,5 mil mísseis a partir de Gaza. Esses fatores aumentaram o prestígio do grupo. Isso sem falar no óbvio: o simples fato de continuar a existir após o conflito já é considerado como vitória.
Para completar, ao aceitar o cessar-fogo, o Hamas freia um movimento internacional que ganhava força: o de exigir a desmilitarização do grupo, tema sobre o qual escrevi amplamente durante o conflito. A partir do momento em que esta exigência deixou de ser somente uma prerrogativa israelense e se transformou em base da proposta europeia para encerrar a guerra e ajudar no processo de reconstrução de Gaza, a natureza do Hamas passou a estar sob ameaça aberta.
Do lado de Israel, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, vai fazer o que puder para convencer o público interno de que foi capaz de vencer o Hamas. Mas não foi. Porque derrotar totalmente o Hamas significa garantir o retorno de calma e segurança às cidades e comunidades do sul do país. Agora, exatamente como no estágio anterior ao conflito atual, esta situação depende exclusivamente do interesse do Hamas de seguir com a trégua. Por mais que o argumento seja de que Israel foi capaz de destruir a maior parte da capacidade militar do grupo, a chuva de mísseis sobre o céu do território israelense pouco antes do cessar-fogo vigorar foi uma demonstração do Hamas de que seu arsenal está longe de ter sido completamente erradicado. Além dos prejuízos com perdas econômicas e isolamento internacional, a liderança de Israel preferiu encerrar o conflito justamente como forma de impedir o crescimento do protagonismo do Qatar no Oriente Médio. E, claro, fortalecer a aliança e o papel geopolítico deste atual governo egípcio.
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