quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Aprovação do novo governo do Iraque oculta as muitas complicações que ainda estão por vir

E então, depois de nove meses de impasse, o parlamento iraquiano aprovou o novo governo a ser comandado pelo primeiro-ministro Nouri al-Maliki. Isso não significa que o país caminha para se transformar na democracia exemplar sonhada por George W. Bush. Pelo contrário; os sinais não me levam a acreditar nisso. Como o Oriente Médio tem ensinado a duras penas nos últimos anos, a tentativa ocidental de moldar Estados de acordo com seus próprios princípios é absolutamente infrutífera.


A diferença no caso iraquiano é que certamente Maliki não irá tentar qualquer virada mais brusca neste momento. Seu maior objetivo agora é preparar o país e evitar qualquer grande mudança até a saída das tropas americanas prevista para o final do ano que vem. O primeiro-ministro iraquiano é uma figura de muitas facetas. Internacionalmente, tenta ser conciliador. Muitos apostavam, inclusive, que seria facilmente manipuldo pelos ocidentais.

Mas, como sempre, a vida real se mostrou muito mais complexa e repleta de nuances. Ao contrário de seu antecessor Saddam Hussein que privilegiava a minoria sunita, Maliki seguiu caminho oposto. A diferença em relação a Saddam não vai muito além disso, uma vez que, assim como o ditador deposto por Bush, o líder iraquiano gosta bastante de reter poder em suas mãos. Não é mera coincidência ele ter deixado de apontar ministros para pastas importantes, como Defesa, Interior e Segurança Nacional. Sabem quem vai cuidar desses assuntos por tempo indeterminado? O próprio Maliki.

Além disso, sua aproximação com o regime xiita iraniano não causa surpresa. Assim como Ahmadinejad e Khamenei, o líder iraquiano também tratou de colocar seus homens de confiança na chefia das forças armadas e busca desempenhar pessoalmente papel central nas agências de segurança. Também como acontece no Irã - onde a prisão de Evin é o símbolo mais importante do tratamento dado aos dissidentes políticos -, Maliki é acusado pela Anistia Internacional e a Human Rights Watch de manter suas próprias prisões e centros de tortura.

 
O governo iraquiano é elogiado pelos EUA por conseguir ser representativo dos muitos grupos que compõem a sociedade local. Na prática, no entanto, existe uma clara preferência pelo controle centralizado xiita. Por exemplo, o novo vice-primeiro-ministro na área de energia, Hussain al-Shahristani, declarou que todos os contratos assinados pelo semiautônomo Curdistão com empresas estrangeiras são ilegais.

 
Enquanto isso, os EUA parecem anestesiados. Diante de tantas frustrações em sua política externa, a mera ilusão de que a situação no Iraque pode se resolver já satisfaz o suficiente. No entanto, não creio ser impossível que, num futuro próximo, o país possa novamente se transformar numa ditadura fantasiada de democracia, assim como o Egito, por exemplo. Se isso acontecer, os EUA terão simplesmente mudado o cetro de mãos. E com a real perspectiva de terem aberto as portas para a influência iraniana. Este seria certamente o pior dos cenários para os americanos.

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