Havia grande expectativa em relação ao anúncio do vencedor do Prêmio Nobel da Paz. Todo mundo que tem alguma proximidade com política internacional esperava muito da premiação, já que, como tenho escrito, 2011 é um desses anos que mudam o rumo da história. A comissão julgadora responsável pela eleição sabe que o Nobel da Paz é o mais político dos prêmios. Muito embora qualquer escolha seja sempre política, especialmente o Nobel da Paz é diferente dos demais.
Ao contrário dos prêmios mais técnicos – focados em grandes descobertas e avanços –, o Nobel da Paz dá uma espécie de chancela a determinadas causas. Ou, ainda, ratifica rumos e aponta caminhos. Por exemplo, quando Obama foi o vencedor, em 2009, a justificativa era de que seus esforços para a redução dos arsenais nucleares haviam sido reconhecidos. O prêmio foi concedido por isso também, mas a explicação não se restringe a esta linha meramente formal.
O Comitê Nobel fez uma análise do cenário internacional e mandou seu recado. Na época, havia grande preocupação com uma nova corrida nuclear, a ameaça real de um confronto direto entre EUA e Israel, de um lado, e o Irã, de outro. Fora as tentativas comandadas pelo próprio Obama de reaproximação com os russos e o resultado prático de frear a competitividade atômica entre os dois países. Mais além de tudo isso, a representatividade do presidente americano, um voto de garantia simbólico de que ele deveria ser mais ousado na liderança geopolítica internacional e que tivesse o pacifismo e o multilateralismo como bases de ação. O Nobel era um prêmio antecipado por Obama não ser Bush, para ser bastante claro.
No entanto, agora, o Comitê recuou. Diante do maior número de concorrentes inscritos, num dos anos mais importantes e representativos para o pacifismo, o prêmio foi dividido não entre os protagonistas da Primavera Árabe ou dos muitos movimentos sociais em curso, mas entre figuras menos relevantes, sob o ponto de vista do simbolismo político. As vencedoras (foto) foram Ellen Johnson Sirleaf, presidente da Libéria, a ativista Leyma Gbowee, também da Libéria, e Tawakkul Karman, do Iêmen, ativista pró-democracia (a primeira mulher árabe a receber o prêmio). Por mais que esta última seja representante das manifestações populares nos países árabes, o Comitê perdeu a chance de reconhecer a importância deste movimento na plenitude.
Havia duas opções óbvias que, se escolhidas, teriam dado ainda mais sentido a este momento raro em que a luta popular democrática conseguiu resultados práticos nos países árabes: o já morto Mohamed Bouaziz, o vendedor ambulante que ateou fogo ao próprio corpo em dezembro de 2010 na Tunísia quando seu material de trabalho foi confiscado dando início aos protestos; Ou Wael Ghonim, executivo egípcio do Google e um dos principais articuladores das manifestações no país. O Comitê Nobel perdeu uma grande chance de demonstrar seu apreço a um movimento ainda em curso e reconhecer sua importância na construção de um mundo mais democrático e na transformação de um região um tanto problemática.
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