Durante esses dias tenho lido e ouvido bastante sobre as reações aos atentados na França. Enquanto há um consenso sobre a tentativa de extremistas de silenciar os cartunistas do Charlie Hebdo, há uma série de interpretações sobre o sequestro e posterior assassinato de judeus franceses no mercado de produtos casher.
Vi inclusive um professor comentando que o este atentado especificamente não teria motivações antissemitas. Parte da imprensa brasileira seguiu por este caminho, parte nem entrou na discussão. Seja como for, acho válido olhar o cenário mais amplo, o que tenho tentado fazer por aqui regularmente. Sobre o atentado ao mercado de produtos judaicos, certamente foi um ato antissemita. É impossível que o alvo tivesse sido escolhido ao acaso. Então vamos à análise;
A escolha de um mercado judaico teve como alvo seus frequentadores e o capital simbólico do estabelecimento comercial. Um mercado de produtos alimentares produzidos de acordo com a dieta alimentar judaica e supervisão rabínica tem os judeus como consumidores primordiais. Judeus franceses. A história recente dos judeus franceses não tem sido exatamente tranquila. Ou seja, os episódios de atentados e violência contra a comunidade judaica francesa são frequentes.
Lar das maiores comunidades judaica e islâmica da Europa, a França tem sido palco de conflitos, principalmente em virtude do que acontece no Oriente Médio. Nos últimos anos, a situação dos judeus vem se tornando mais delicada. Para citar os casos recentes de maior repercussão: em 2006, o jovem judeu Ilan Halimi foi sequestrado e morto (inicialmente, o governo francês se recusou a reconhecer o caso como um ataque antissemita, mas depois mudou de posição); em 2012, um rabino e três crianças foram mortas a tiros na porta de uma escola judaica em Toulouse; em 2014, um cidadão franco-argelino matou quatro pessoas no Museu Judaico da Bélgica; também no ano passado, uma multidão tentou invadir uma sinagoga em Paris, alegando protestar contra a Israel.
O atentado contra o mercado se insere nesta realidade dos judeus franceses. Ignorar este cenário inviabiliza, na prática, qualquer análise. Todos esses acontecimentos na comunidade judaica francesa explicam por que o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, foi ovacionado na Grande Sinagoga de Paris. Vale mencionar também que, pela primeira vez desde a independência de Israel, em 1948, a França lidera o ranking da população judaica que decide se estabelecer em Israel.
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