Vou repetir algo que sempre escrevo por aqui: quem procura coerência na política internacional vai se frustrar. Por mais que os líderes mundiais sempre joguem com esta expectativa, a verdade é que as posições externas dos países são determinadas por suas aspirações de poder, pelo jogo político doméstico ou pelo interesse em reforçar alianças internacionais. Neste momento, temos um exemplo de como funciona esta dinâmica; enquanto é inegável a legitimidade da solidariedade internacional após os atentados na França, a maior parte da comunidade de países não se esforça para impedir as sucessivas vitórias do grupo terrorista islâmico Boko Haram, na Nigéria.
Ao longo de 2014, o grupo matou dez mil pessoas. Nos últimos dias, tem colocado em prática o método assustador de usar meninas entre dez e 14 anos de idade para realizar ataques terroristas. No último sábado, ao menos 16 pessoas foram mortas num mercado lotado após os terroristas amarrarem uma bomba numa menina de dez anos de idade.
Uma boa parte do fracasso no enfrentamento ao Boko Haram é explicada pela corrupção. E pelo descaso com que o presidente da Nigéria, Goodluck Jonathan, trata o problema. Na medida em que não consegue impedir as sucessivas vitórias do grupo, Jonathan procura minimizar seu poderio. Com eleições marcadas para 14 de fevereiro, tem procurado inclusive maquiar o número de mortos nos atentados.
Em meados de 2014, a revolta internacional contra esta organização terrorista atingiu seu ápice após o sequestro de 274 meninas de uma escola na cidade de Chibok. O movimento “Bring Back Our Girls (Tragam de volta nossas meninas)” causou comoção internacional e parecia que a emoção se transformaria em algo de mais concreto. Mas o presidente nigeriano fez o que pôde para jogar a questão para debaixo do tapete. Jonathan ordenou o cancelamento de um programa criado pelos EUA para combater o Boko Haram. Por sua vez, Os EUA cancelaram o treinamento de combatentes nigerianos após uma série de denúncias de organismos internacionais sobre violações de direitos humanos cometidas pelas forças armadas da Nigéria, incluindo estupro e assassinato em massa, como lembra a revista Foreign Policy.
Graças às sucessivas falhas e negligências do governo de Goodluck Jonathan, hoje o Boko Haram controla uma população de 1,7 milhão de nigerianos (ver imagem). Como semelhança ao Estado Islâmico, o grupo pretende construir uma espécie de califado tendo como base a interpretação fundamentalista do islã. A comunidade internacional – e principalmente EUA e União Europeia – irão se reunir para pensar em novas maneiras de combater o terrorismo. Deveriam incluir na agenda também o combate ao Boko Haram, que, na prática, continua a fazer o que bem entende na Nigéria e por enquanto não tem motivos para se sentir intimidado.
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