Para não deixar nenhuma dúvida, o discurso do supremo líder iraniano, o aiatolá Ali Khamenei, foi repleto de palavras duras contra o ocidente, a mídia e, é claro, Israel. De importante mesmo, o apoio ao presidente reeleito Mahmoud Ahmadinejad. Khamenei reafirmou que as eleições foram limpas e usou um argumento muito semelhante ao do presidente Lula no início da semana para contestar a suposta fraude.
“Houve uma diferença de 11 milhões de votos. Como se pode manipular 11 milhões de votos?”, perguntou.
Ora, nada mais simples. Ao menos numa região onde a manipulação de votos é um hábito quase tão tradicional quanto participar das orações de sexta-feira nas mesquitas.
Era assim nos tempos de Saddam Hussein – sim, ele fazia questão de realizar eleições e incrivelmente era reeleito sucessivamente com mais de 90% dos vots – e continua assim hoje no Egito de Hosni Mubarak e na Síria de Bashar Assad.
A habilidade do governo do Irã com as cédulas de papel deve ser mesmo enorme. Afinal, menos de 12 horas após o encerramento das eleições, Ahmadinejad já era declarado vencedor. Ou seja, se apurar cerca de 30 milhões de votos é rápido, manipular somente 11 milhões deles não deve ser das tarefas mais difíceis, convenhamos.
O discurso do supremo líder realizado hoje teve um tom de “déjà vu” em alguns momentos e acusações inéditas e curiosas em outros.
“Os inimigos através de vários meios de comunicação – e alguns deles pertencem aos sionistas – tentam fazer crer que existe uma luta entre os militantes da oposição e o establishment islâmico”.
Ora, acusar os judeus pela propagação de informações consideradas contrarrevolucionárias não é novidade. Além de unir as diversas partes em conflito, pega bem junto à opinião pública dos países da região. O curioso foi Khamenei apontar sua metralhadora verbal na direção do Reino Unido, qualificando-o de “o mais demoníaco dos inimigos do Irã”. A plateia correspondeu à afirmação entoando o cântico de “morte à Grã-Bretanha”. Soa bastante estranho aos britânicos ser a bola da vez, ainda mais se for lembrado o fato de o próprio Ahmadinejad ter sido convidado pelo Channel 4 para fazer o discurso de natal ao vivo para os ingleses.
Ainda sobre o discurso de hoje, o opositor e derrotado Mousavi havia sido convidado para estar presente durante a exposição. Ele não apareceu e ninguém sabe ao certo qual papel vai exercer a partir de agora. As palavras de Khamenei tentaram constrangê-lo. Afinal, boa parte da mensagem foi o habitual e pouco criativo “quem não está conosco está ao lado dos sionistas”. Os próximos dias vão mostrar como Mousavi devolve a bola para o lado do regime.
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