A desestabilização dos países do norte da África é um processo em curso. No texto de ontem, comentei sobre a possibilidade de movimentos similares ao que derrubou o governo corrupto da Tunísia eclodirem pela região. O cenário se torna real a cada dia. O tempo está ao lado dos revoltosos.
E outro aspecto importante parece caminhar paralelamente às manifestações populares: a tentativa de grupos radicais islâmicos de se aproveitarem do vácuo de poder. Um exemplo esquecido é o caso sudanês. Para complicar o já complexo quadro político do país que vive o gerúndio da secessão, a principal liderança política islâmica do Sudão, Hasan al Turabi (foto), já se manifestou:
“Eles deveriam ter percebido (as autoridades governamentais) que este país precisava estar integrado socialmente. Você precisa criar fundações para poder construir a partir delas. Do contrário, cada uma das paredes irá desmoronar. Agora este país nunca vai estar conectado”, disse.
É preciso entender uma parte importante do intrincado histórico do Sudão para compreender o protagonismo de al Turabi.
Hassan al Turabi e o presidente Omar al-Bashir trabalharam juntos nos momentos anteriores à chegada deste último ao poder, em 1989. Durante dez anos, foram parceiros na tentativa de implementar a sharia, a lei islâmica, no Sudão. Em 1999, no entanto, a relação terminou. Turabi e Bashir se separaram, encerrando a parceria e dando início a uma era de estremecimento, alimentando ódio recíproco comparável a de Lex Luthor por Super-Homem.
Ne medida em que Bashir se tornou uma espécie de presidente vitalício a partir de sucessivas – e fraudulentas – reeleições, al Turabi foi posto na ilegalidade. Já foi preso inúmeras vezes sem maiores explicações e retornou para a cadeia nesta semana, após as declarações em que convocou a população a derrubar o governo através de manifestações como as que ocorrem na Tunísia.
Esta é a brecha de oportunidade sobre a qual falei ontem. O momento é muito propício e o governo Bashir está em péssima situação; por conta da divisão do país, o Sudão original deve perder cerca de 75% das reservas petrolíferas – localizadas na parte sul do território. Além das tentativas infrutíferas do banco central de estabilizar a libra sudanesa, o governo teve de reduzir os subsídios aos produtos derivados de petróleo e aumentar o preço do açúcar.
A equação é muito favorável à oposição: governo contestado, país dividido, perda das principais riquezas e medidas impopulares. E, não custa lembrar, Omar al-Bashir é investigado internacionalmente pelos crimes de guerra cometidos em Darfur. Ou seja, basta um leve empurrão para que o poder mude de mãos no Sudão.
É importante lembrar também que Hassan al Turabi não é nenhum, digamos, democrata. Entre 1964 e 1969, foi secretário-geral da Frente da Carta Islâmica, o braço político da Irmandade Muçulmana no Sudão. Se tomar o poder, irá implementar a lei islâmica e, sem nenhuma dúvida, irá fechar ainda mais o país.
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