A Liga Árabe já deixou claro que passa a reconhecer o Conselho Nacional de Transição (CNT) como autoridade legítima da Líbia. Há também uma pitada de populismo ao afirmar, em comunicado, que o CNT é o “único representante do povo líbio”. Digo isso porque durante 42 anos a organização jamais questionou a ditadura de Kadafi no país. Mas, é sempre bom lembrar que a Liga Árabe não é o exemplo singular de contradição, infelizmente. Nunca é demais recordar que mesmo as potências ocidentais – agora ultrajadas com o ex-líder líbio – toparam estabelecer relações muito próximas a ele. Política é, acima de tudo, conveniência.
Foto: embaixada líbia em Brasília já ostenta a bandeira que se tornou símbolo dos rebeldes
Há também grande questionamento por aqui quanto à posição brasileira. E não é para menos. O Itamaraty corre o risco de tornar o Brasil o último a entrar no barco dos vitoriosos. Quando uso o termo “último”, refiro-me, obviamente, aos Estados que de fato possuem relevância no cenário internacional. Por exemplo, não faz grande diferença quando a Venezuela trata a derrubada de Kadafi como “uma agressão ocidental ao povo líbio”. Sem a menor dúvida, esta não é uma posição que o governo brasileiro pretenda compartilhar.
E há uma explicação para isso. Como sempre escrevo, o Brasil quer se manter relevante. E ideologizar demais a política externa é o primeiro passo para seguir ladeira abaixo. Há certa dificuldade em definir uma linha clara. Mesmo que o ministro das relações exteriores Antonio Patriota nutra desprezo pela ditadura líbia, uma das práticas brasileiras condena o alinhamento automático às potências tradicionais. Além disso, o Brasil preza acima de tudo as organizações multilaterais. O país quer tomar decisões numa espécie de estratégia wiki, ou seja, ouvir todos os atores envolvidos. Principalmente, os que representam Estados ora pertencentes ao chamado grupo dos não alinhados.
Patriota tem mantido conversas com membros do Ibas (formado por, além do Brasil, Índia e África do Sul), Brics, União Africana e Liga Árabe. A decisão brasileira só vira quando contar com a aprovação de todos esses países. Isso é até compreensível, mas não me parece prático e inteligente. Soa como um grande pedido de desculpas por se posicionar internacionalmente. Mas, afinal, não era justamente isso o que o Brasil sempre quis? É natural que a relevância seja acompanhada de desgaste. É natural também que posicionamentos brasileiros desagradem e o país não possa mais contar com a grande aprovação destinada aos que estão permanentemente em cima do muro. Mas e daí?
Há passos politicamente irreversíveis. Quando o Brasil forjou sua recente política externa e conseguiu ter sucesso, conhecia as contrapartidas envolvidas. E uma delas é absolutamente clara: não se pode participar do jogo a partir da arquibancada. É claro que há riscos ao se legitimar o desconhecido Conselho Nacional de Transição (CNT) da Líbia. Mas todos os principais atores estão se posicionando. O Brasil não pode simplesmente ignorar este movimento e se abster das decisões.
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