A política externa brasileira se assemelha a da maior parte dos países – para não dizer de todos os países. Escrevi os dois últimos posts como crítica a ações pontuais do Itamaraty. E o fiz questionando, principalmente, a coerência do posicionamento em relação aos acontecimentos na Líbia. Para deixar claro, minha surpresa diz respeito somente aos valores morais que caminham ao lado da falta de atitude atual. Sempre reforço a característica realista da política internacional e, por isso, reconheço os objetivos das estratégias brasileiras colocadas em prática de forma bastante evidente durante o governo passado. A grande incoerência desses dias não se baseia tão somente no na falta de firmeza, mas também na aparente incongruência com a diplomacia adotada durante toda a administração Lula.
Foto: Obama e Kadafi em 2009. Realismo político
Chegamos aí num ponto importante: os países tomam decisões baseadas no realismo político. Ou seja, a bússola que norteia quase todos os Estados aponta para vantagens e poder a partir do que possuem ou das alianças que mantêm. É claro que há limites e a ONU existe para, dentre outras funções, impedir que o mundo se transforme numa espécie de estado da natureza formulado por Hobbes. O que o Brasil tem feito, no entanto, é contraditório com suas próprias pretensões. Não há nada de errado nisso, mas causa estranheza.
Quem está do outro lado do posicionamento é, para variar, os EUA. Apesar de atolados numa espiral de críticas internacionais desde o início da resposta ao 11 de Setembro (que provocou duas guerras contra todos os grupos terroristas islâmicos), os americanos acabaram se beneficiando da situação na Líbia. E de uma maneira bastante inteligente, por sinal. A Casa Branca não planejou a Primavera Árabe (pelo contrário) e tampouco teve qualquer participação nas manifestações populares dos líbios. Mas foi astuta o suficiente para enxergar nos acontecimentos duas possibilidades interessantes: estar envolvida de alguma maneira no processo de luta pelo democracia nos países árabes, podendo se conciliar com a população comum de um inimigo histórico; derrubar Kadafi sem perder soldados ou muito dinheiro.
Os EUA não foram os principais agentes da transformação líbia, mas capitalizaram a seu favor. Obama apoiou os rebeldes em março passado porque sabia que era preciso estar envolvido com a luta pela democracia na região. Afinal, não são justamente os americanos que fazem da democracia a sua própria contribuição para a humanidade? Pois é. Mas não se trata somente disso. No norte da África, os EUA estavam em péssima situação desde que demoraram a responder às manifestações populares em Egito e Tunísia. Hoje este pode até parecer um passado distante, mas sucessivos governos americanos – inclusive o de Obama – tiveram nos ditadores de Egito e Tunísia aliados históricos capazes de manter a estabilidade numa região cercada de incertezas.
Graças ao realismo político, Obama agora pode se orgulhar de dois grandes feitos internacionais dos quais fará bom uso durante os debates eleitorais: o assassinato de Osama bin Laden e a derrubada de Kadafi – grande inimigo dos EUA nos anos 1980. E tal feito não custou a vida de nenhum soldado americano.
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