Escrevi sobre a indecisão brasileira quanto a reconhecer ou não o chamado Conselho Nacional de Transição (CNT) na Líbia. A pressão aumenta sobre a posição do Itamaraty. No entanto, o ministro Patriota tem encontrado novas formas criativas de justificar o adiamento de algum tipo de decisão. “O Brasil não reconhece governos, reconhece Estados”, disse.
Isso até pode soar bonito, mas, efetivamente, não resolve nada. Declarações como esta não apenas são banais como também mostram um retrocesso no projeto de política externa. Ora, se a ideia era não se manifestar, por que todo o esforço em busca de relevância? Um ponto importante que precisa ser lembrado: o objetivo máximo da diplomacia nacional é conseguir um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Quem almeja tal reconhecimento simplesmente não pode buscar subterfúgios para as grandes questões internacionais. Encontrar uma solução para a Líbia é, neste momento, uma das principais preocupações mundiais.
Aliás, há outra contradição nesta postura. O Brasil se alia à Rússia e China, dois membros do CS que foram não somente contrários à intervenção, mas também evitaram criticar Kadafi até o limite do possível. Ou seja, a tradição brasileira de independência caiu por terra. E, pior, correndo o risco de pular para o lado errado (alguém duvida que levantar a bandeira da manutenção do regime Kadafi seja o lado errado?). Todo este esforço de escapismo tem sido feito apenas em nome do não alinhamento automático às potências ocidentais. Isso é uma tremenda bobagem e um enorme erro estratégico.
O chanceler Patriota também disse que a principal preocupação dos Brics é pela unidade do território líbio. Já a ONU aprovou a resolução contra Kadafi de forma a proteger as vidas dos civis. Acho que fica claro qual discurso é mais poderoso, certo? Por mais que ambos sejam meras construções estéticas em busca de justificativas nobres para objetivos geopolíticos distintos. Para complementar o equívoco, não custa lembrar que o próprio Kadafi conseguiu manter o território líbio integrado durante 42 anos. A resposta brasileira expõe o país à crítica mais óbvia. Basta juntar as peças.
Não por acaso, durante coletiva de imprensa no Fórum para a Cooperação entre América Latina e Leste da Ásia (Focalae), o ministro das Relações Exteriores do Brasil teve de negar oito vezes que o país considerava a possibilidade de conceder asilo ao ditador da Líbia. Se ao optar por não tomar partido na questão líbia a ideia era ter tempo para analisar o cenário sem ser associado a nenhum dos lados, ela foi por água abaixo. A rapidez do mundo de hoje não é apenas um conceito aplicável à tecnologia. Como todos estão integrados – comunicação, economia, mercados etc – não há tempo para hesitações e intervalos gigantescos.
A saída encontrada pelo Itamaraty para mascarar a indecisão que tomou conta do governo foi envernizá-la com uma suposta ideologia de crítica à intervenção e às potências ocidentais. Só que esta nada mais é do que uma estratégia ingênua e antiga que nada tem a ver com a dinâmica internacional dos dias de hoje. Deu tudo errado.
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