segunda-feira, 8 de novembro de 2010

As difíceis escolhas americanas na Ásia

A visita de Obama à Índia mostra a preocupação dos EUA com a Ásia e o Sudeste Asiático. No mundo em transformação, a noção de que as regiões são entidades desconexas se confronta com a realidade. A intenção de fortalecer laços com os indianos na verdade resume os múltiplos interesses em jogo: a guerra do Afeganistão, a luta do Paquistão contra os talibãs, e a percepção da importância da aliança com a Índia num momento em que a China se projeta como potência internacional.

Tudo isso está misturado e conectado de alguma maneira ou de muitas maneiras simultâneas. É esta a complexidade geopolítica do século 21, marca que parece ter vindo para ficar por bastante tempo. A agenda de Obama envolve a necessidade de lembrar aos indianos que os EUA são seus aliados por uma série de fatores: a China inicia seu processo de expansão regional baseada em sua inegável força econômica, militar, estrutural e populacional. Ao mesmo tempo, não se pode contar apenas com a ajuda paquistanesa no Afeganistão. E, para completar, é importante deixar claro que Washington não irá tolerar qualquer disputa na Caxemira que coloque em risco seus principais esforços asiáticos.

Acredito, no entanto, que a questão mais importante no momento é mesmo a China. Frear as intenções de Beijing é fundamental porque este é um problema que acaba caindo na conta da economia americana. Se os republicanos conseguiram mudar a balança de poder interna ao basear parte do discurso na taxa de desemprego atual, o presidente americano responde como pode. E um dos campos onde ainda usufrui de liberdade de ação é justamente a política externa. Evitar a expansão chinesa para os demais países da Ásia pode ser uma forma de fragmentar o potencial econômico regional e impedir, por ora, mais competição para a indústria americana.

"As regiões como elas existem hoje devem sobreviver sob a influência geoeconômica. Os Estados irão se encontrar mais envolvidos numa rede de associações de livre comércio. Na Ásia-Pacífico, a China provavelmente deverá se sentir mais confortável no papel do 'suserano exaltado', uma versão atualizada do tradicional sistema tributário chinês", escreve James C. Hsiung, professor da Universidade de Nova Iorque.

Para barrar este projeto de Beijing, Obama finalmente decidiu visitar a Índia. Topou, inclusive, prometer se empenhar no reequilíbrio de instituições multilaterais, como a ONU - o que poderia também beneficiar o Brasil. O problema é que, para convencer Nova Déli a embarcar no canto americano, será preciso mexer com o também aliado - e problemático - Paquistão.

A fidelidade ambígua de Islamabad é velha conhecida de Washington. Mesmo assim, não se pode abrir mão deste apoio. Seria loucura abandonar à própria sorte um Estado detentor de arsenal atômico que tem o Talibã lhe batendo à porta. Mas a rivalidade entre Índia e Paquistão é histórica e foi reforçada por conta dos atentandos a Mumbai, em 2008. Nada disso, no entanto, impediu os americanos de dar continuidade à transferência de 13,8 bilhões de dólares em equipamentos militares ao país numa parceria altamente incômoda aos indianos.

Acho que este é um dos casos em que impera o maniqueísmo de ambas as partes. Será difícil ao projeto americano seduzir a Índia sem causar prejuízo à relação que os EUA mantêm com o Paquistão. O mesmo raciocínio vale para as relações com o Paquistão. Obama terá de abrir mão de algo neste caso: a estabilidade no Afeganistão ou a influência econômica na Ásia. Qualquer que seja sua escolha, as consequências a longo prazo irão reverberar em todo o mundo. Definitivamente, a sorte não tem acompanhado o presidente americano.

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