No próximo domingo, dia 28, meio que na encolha por conta de tudo o que está acontecendo no mundo, o Egito realiza eleições parlamentares. Não se pode esquecer a importância estratégica regional do país e de como tudo o que acontece a partir do governo do Cairo reverbera em todo o Oriente Médio. A presidência de Hosni Mubarak deve ser "ameaçada" somente no ano que vem, quando haverá eleições para o cargo político máximo. Mesmo assim, o pleito atual pode dar algumas pistas importantes sobre o rumo a ser seguido pela controversa "democracia" egípcia.
Em primeiro lugar, é preciso apresentar uma série de contradições de um dos principais aliados americanos na região: é o partido de Mubarak – que ostenta ironicamente o título de Partido Nacional Democrático – o responsável pela verificação do processo eleitoral. Isso já seria estranho o suficiente, mas vale dizer também que o PND – representado pelo presidente – está no comando do país há 30 anos, e recentes declarações indicam que ele deverá concorrer novamente ao cargo no ano que vem. Para completar, há indícios de que a cobertura da imprensa egípicia no domingo já está comprometida com os candidatos do partido do governo.
Resta saber, então, por que os EUA apoiam um presidente que não larga o osso, direciona a imprensa e controla o parlamento. No jogo de forças políticas do Oriente Médio, Mubarak dispõe de uma característica capaz de levar os americanos a fecharem os olhos para todas as demais: ele sufoca o movimento fundamentalista Irmandade Muçulmana, que prega a islamização da política egípcia, por exemplo, e é fonte de inspiração para o Hamas, em Gaza, e diversos grupos radicais islâmicos em toda a região. Mubarak não apenas colocou o movimento na ilegalidade, como costuma sufocar qualquer manifestação de força de seus militantes.
Curiosamente, no entanto, a situação não é a representação completa do maniqueísmo. Isso porque a legislação política egípcia – ao contrário da brasileira, por sinal – permite que candidatos concorram ao parlamento como independentes. Tal brecha permitiu à Irmandade Muçulmana eleger um em cada cinco parlamentares nas últimas eleições (há 518 cadeiras no parlamento do país).
Há alguns fatos novos que podem alterar este tênue equilíbrio de poder no Egito: a mobilização de parte da sociedade – 14 mil membros de entidades civis do país pretendem fiscalizar as eleições, mas a autorização depende da Comissão Eleitoral do governo – e o retorno do ex-presidente da Agência Internacional de Energia Atômica Mohamed ElBaradei ao país. Ganhador do prêmio Nobel da paz e fundador do movimento Associação Nacional para Mudança, ElBaradei é bastante popular e representa uma terceira via para disputar politicamente as eleições presidenciais no ano que vem.
Por ora, resta observar os resultados de domingo. A tendência é de vitória em larga escala do PND, mas pode ser que a Irmandade Muçulmana – representada por boa parte dos candidatos independentes – consiga mais uma votação expressiva. Se isso acontecer, ninguém sabe como o próprio Mubarak irá reagir.
Resta a dúvida também como os demais atores regionais poderiam responder a esta injeção de ânimo. E mais: creio que, neste caso, o próprio processo de paz entre israelenses e palestinos seria ainda mais prejudicado, uma vez que o Egito exerce o papel de importante intermediário regional para as conversações.
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