As incongruências entre as expectativas norte-coreanas e as concessões internacionais podem acirrar os conflitos iniciados ontem. Perceber que Pyongyang pretende se estabelecer como potência atômica planetária reforça o que já escrevi. Para analisar os passos do regime de Kim Jong-il é preciso ter em mente mais uma característica humana transportada às ações governamentais: a autoestima está alta demais.
Na foto: manifestante sul-coreano em Seul queima bandeira da Coreia do Norte
Isso poderia não ser ruim necessariamente. O problema é quando ela passa a denunciar uma boa dose de loucura. Loucura do grande líder transformada em insanidade institucional. Como menciona o texto de ontem, o Ocidente enfrenta grandes dificuldades para entender a Coreia do Norte porque todas as explicações levam em consideração certo bom-senso.
Agora, depois do primeiro impacto causado pelos bombardeios, já é possível estabelecer novos paradigmas de análise. Um dos mais interessantes é o seguinte:
"O que eles (os norte-coreanos) desejam há ano é reconhecimento diplomático de seu país pelos EUA. Eles estão frustrados porque entraram nas negociações de seis partes, fizeram testes nucleares e todo o tipo de ameaças, mas ainda não conseguiram levar os americanos à normalizar relações", diz à CNN Wenran Jiang, cientista político da Universidade de Alberta, no Canadá.
Ora, a premissa apresentada mostra total falta de conhecimento do modo de operação de Washington. Algum Estado que minimamente acompanhe a política externa americana desde o início do século 20 saberá que os EUA não costumam aceitar chantagens em troca de relações diplomáticas. Há três administrações presidenciais americanas – a partir de Bill Clinton, em 1994 – existe um consenso de que é preciso interromper o programa nuclear norte-coreano. Houve muitos erros de análise por parte dos EUA, mas em nenhum momento qualquer presidente do país ou autoridade mostrou a mínima disposição de conviver com a possibilidade de uma Coreia do Norte com capacidade atômica.
Em artigo publicado no Wall Street Journal, Michael J. Green e William Tobey, dois ex-oficiais de segurança dos EUA, informam que fontes da Coreia do Norte dizem que o interesse de seu governo é negociar com os americanos um acordo de controle de armamentos. Isso é tão improvável de acontecer que soa ridículo. Se os EUA enfrentam dificuldades para ratificar internamente um tratado de redução de arsenal nuclear com a Rússia (Start, na sigla em inglês), imagina como os congressistas reagiriam a uma proposta deste tipo para fazer algo semelhante com os coreanos? Não faz qualquer sentido.
Washington está em conversações com Moscou porque no século 20 houve algum paralelo entre a capacidade militar dos EUA e da ex-URSS. Definitivamente, o mesmo raciocínio não pode ser aplicado à Coreia do Norte.
Se Pyongyang deposita na aceitação americana de sua autoestima como forma de dar fim a esta nova série de provocações, é melhor que a Coreia do Sul se prepare para novos ataques. Aliás, os EUA já despacharam para a região o porta-aviões George Washington acompanhado de navios militares para conduzir exercícios com os aliados de Seul. Esta primeira resposta oficial deixa claro que as expectativas estão em patamares muito distintos.
2 comentários:
Oi Henry, achei seu post bem legal mas um pouco ingenuo. Da uma olhada em dois artigos do Ron Ben Yishai no Ynet de hoje. São sobre as motivações da Coréia e achei eles bem interessantes.
Eu ando meio ingênuo mesmo, Eduardo. Eu e o Kim Jong-il.
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