quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Bahrein, Irã e EUA: incoerência cruzada

A indefinição em torno do futuro no Oriente Médio gira bastante em torno da própria incapacidade dos EUA de entenderem qual deve ser seu posicionamento diante de tantas mudanças. Os eventos têm se sucedido dia após dia e as autoridades envolvidas – as que estão no alvo das reivindicações e as que não estão – têm adotado a estratégia das respostas mínimas. Ou seja, nenhuma delas se expõe demais ou ousa além do óbvio.

Mesmo a tentativa do regime iraniano de capitalizar as manifestações no Egito a favor de um suposto “despertar islâmico” é uma postura óbvia quando se leva em consideração a grande disputa de poder entre os Estados xiitas e sunitas da região. Este é um momento único muito mais porque os EUA ainda não se posicionaram claramente. E deixar a maior potência do planeta num papel reativo é algo muito raro na história desde meados do século vinte.

E os atores todos se deram conta disso. É a hora de reivindicar. É a hora de pisar mais fundo no acelerador. Enquanto Washington ainda se mantém nesta posição – e isso vai durar pouco tempo, certamente – quem gritar mais alto, quem tiver maior capacidade de mobilização, vai sair na frente. E não me refiro somente a contar com o apoio americano, mas também criar fatos consumados que levem os EUA a ter de lidarem com novas realidades. Por exemplo, a Irmandade Muçulmana legitimada no governo egípcio.

A situação no Bahrein se enquadra nesta categoria. Há alguma diferença, mas as manifestações no pequeno país do Golfo Pérsico procuram alterar uma balança de forças plenamente apoiada pelos americanos. E, ao contrário do Egito, a população do Bahrein usufrui de qualidade de vida bastante razoável. Inclusive de alguma democracia. Por exemplo, dos 40 membros da Câmara Baixa, 18 são representantes da oposição. No ranking de renda per capta, o Bahrein ocupa a 20ª posição; o analfabetismo foi erradicado.

Mas nada disso satisfaz porque, como já acontecia no Iraque, nenhuma maioria se contenta em ser governada pela minoria. E é exatamente o que ocorre entre xiitas e sunitas no Bahrein, como se sabe. E aí entra em jogo o conceito de realismo político sobre o qual comentei ontem: a incoerência cruzada.

A luta entre os modelos políticos é tão acirrada, que EUA e Irã tomam a mesma atitude ao contrário. Explico: o Irã procura influenciar os países da região inflamando um discurso do despertar islâmico, mas não concebe qualquer tipo de manifestação interna. Os EUA demandam – à exceção do Irã, com muita discrição – mudanças que atendam às expectativas populares da oposição iraniana, mas se mantêm distante de críticas abertas às repressões aos protestos no Bahrein.

E este momento está afetando todas as relações de poder estabelecidas no Oriente Médio. Por isso ele é tão especial.

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