segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Exército egípcio é até agora o maior beneficiário da queda de Mubarak

O futuro político e social do Egito é uma grande incógnita. E isso me parece até natural, em virtude da essência dos protestos que culminaram com a queda de Mubarak. Se daqui para frente o país vai se tornar um exemplo de democracia no Oriente Médio árabe e islâmico – o que eu particularmente duvido – ninguém sabe. Mas o fato é que os dias de manifestações foram absolutamente anárquicos.

E a expressão popular nas ruas foi exacerbada até mesmo pelos 30 anos de repressão. Esta vontade sufocada de mudar “tudo o que existiu até agora” pode complicar as decisões estratégicas a partir do momento em que o presidente foi deposto. Qual o próximo passo? Mudar o sistema de governo, acabar com qualquer restrição à imprensa livre, retomar logo o poder das mãos do exército? Ninguém sabe. E se ninguém sabe é porque intrinsecamente não há qualquer organização por trás do movimento.

É bem provável que uma liderança surja dos escombros de Mubarak. Aliás, já há certo acotovelamento entre figuras políticas em busca de ascensão neste novo Egito. Sempre faço questão de lembrar um ditado popular que costuma se mostrar muito correto quando aplicado a essas situações: crise é oportunidade. E pouca gente tem dado a atenção devida aos motivos que tornaram possível o sucesso dos protestos. Sem a menor dúvida, o exército tem profunda participação neste processo. Se não fosse sua cumplicidade, as manifestações teriam sido sufocadas desde o início. Com muito sangue e sofrimento, é importante dizer. Mas tais condições não podem ser consideradas inéditas no Oriente Médio.

O poder coercitivo sempre será fundamental. Na prática, perder o controle sobre o exército é perder qualquer jogo político. E a rapidez com que as forças armadas egípcias aderiram ao movimento popular é no mínimo suspeita. Ou deveria ser. Repararam como o exército conseguiu alcançar dois objetivos de uma só vez sem precisar enfrentar grande desgaste? Derrubar Mubarak e conseguir ainda mais legitimidade popular. E agora são os generais egípcios quem dão as cartas no país.

E já há duas evidências importantes de que nem tudo é uma maravilha neste novo cenário político: autoridades militares do país falam apenas vagamente sobre a manutenção do poder durante um período de seis meses, quando a atual constituição exige a realização de eleições em 60 dias; e a ordem de banir encontros de sindicatos e proibir greves. Ou seja, por ora não se comenta sobre grandes mudanças, a não ser a já consumada exclusão de Mubarak do jogo político. A pergunta mais importante neste momento é até bem óbvia: o exército vai passar a real interlocutor dos anseios populares ou ele simplesmente vai substituir a elites política de outrora em nome de seus próprios interesses?

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