quarta-feira, 2 de março de 2011

Atoleiro líbio

Ontem comentei sobre a possibilidade de intervenção estrangeira na Líbia. O caso envolve tantas articulações e oposições políticas que fica difícil imaginar quem seria capaz de equalizar todas as posições distintas. Com EUA e Grã-Bretanha à frente da pressão pelo uso militar – são os únicos que até o momento cogitaram publicamente esta possibilidade –, não era difícil prever a polarização do assunto.

Acho importante reafirmar que todo mundo está com medo de bancar a decisão de derrubar Khadafi à força. Se as autoridades americanas foram as que mais diretamente deram entender que esta opção não está descartada, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, não quis ficar para trás. O problema é que há poucos meses ele foi o responsável por introduzir um doloroso plano de cortes de gastos interno. Diante disso, é bastante natural que a imprensa do Reino Unido tenha caído de pau sobre sua “bravura” militar:

“O espetáculo do primeiro-ministro de se colocar ao lado de nossos aliados-líderes (EUA) para fazer ameaças públicas contra Khadafi no momento em que nossas forças armadas enfrentam sua maior redução (de verbas) em décadas é simplesmente indefensável”, afirma editorial do Telegraph.

De fato, a conta desta aventura militar contra o líder líbio certamente será alta. Mas o problema não se restringe a isso. Enfrentar as tropas que ainda lutam por Khadafi ressuscita alguns dos piores fantasmas de Londres e Washington. Aliás, nem se pode chamar de fantasmas, até porque permanecem vivos na memória recente de cidadãos e da imprensa: o imbróglio em Iraque e Afeganistão. Se a guerra nos dois países acabou por se transformar numa luta sem fim entre tropas ocidentais e uma enorme variedade de franquias terroristas, a eventual intervenção na Líbia pode acabar por seguir o mesmo caminho.

Já se sabe que a al-Qaeda tem enviado para o país norte-africano fileiras de seus combatentes vinculados à filial magrebina. Se tropas ocidentais de fato invadirem a Líbia, o território não apenas pode se transformar num novo Afeganistão – a situação no Iraque é um pouco melhor –, mas numa análise combinatória de militância e enfrentamento ideológico.

Explico: a al-Qaeda certamente não se alinharia a americanos e britânicos. Por outro lado, no entanto, lutaria contra os exércitos estrangeiros e também contra as forças leais a Khadafi (se elas ainda existirem, claro) e seus mercenários; americanos e britânicos (ou até a Otan, muito embora esta possibilidade seja aparentemente remota neste momento) se preocupariam em derrubar as forças de Khadafi o quanto antes e, posteriormente, seriam obrigadas a algum enfrentamento com a al-Qaeda. Já as forças leais a Khadafi, bom, essas têm diante de si o pior dos cenários: lutam contra todos porque são os alvos prioritários de todo mundo.

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