A tragédia no Japão acabou por atingir também a indústria energética. E, em especial, a nuclear. Diante da gravidade dos acontecimentos, começam a surgir algumas “verdades”. A que tem conseguido conquistar muitos comentaristas é definitiva: a energia nuclear deve deixar de ser usada. Mais ainda, a construção de usinas precisa ser interrompida o quanto antes.
Calma. Ontem escrevi sobre a opção japonesa pela geração nuclear. A raiz desta escolha não pode ser simplesmente esquecida, por mais que o ocorrido seja realmente comovente. Alguém é ingênuo o bastante para crer que os governantes japoneses não sabiam dos riscos envolvidos na construção de usinas? É preciso lembrar sempre que o país possui características muito particulares. Uma das mais importantes é a escassez de recursos naturais. É muito possível que o Japão recorresse à construção de hidrelétricas ou à aplicação de matrizes energéticas mais tradicionais, se pudesse. Mas a realidade não é essa.
Não se trata de nenhuma maneira de proteger a indústria nuclear, até porque não haveria qualquer razão para isso. Mas é espantoso notar como a tragédia japonesa detonou um processo de condenação generalizada que denuncia certo esquecimento do histórico destrutivo das usinas e reatores nucleares. E não me refiro somente a Chernobil (1986) ou Three Mile Island (1979), catástrofes presentes em 100% das recordações jornalísticas desses dias.
Como lembra Lloyd J. Dumas, especialista em desastres tecnológicos, entre 1976 e 2000, houve mais de 1,8 mil incidentes nucleares somente nos EUA. Conforme previu muitas vezes o visionário Matt Groening, há registros frequentes de operadores nas usinas que dormem durante o expediente ou trabalham sob efeito de álcool e drogas (sério). Talvez por isso a alemã Der Spiegel tenha sido a mais radical das publicações ao determinar que “a energia nuclear não pode ser controlada por humanos” (!) – seja lá o que isso signifique em relação às alternativas para os futuros funcionários da área.
Cravar o fim da energia nuclear agora é estranho, na medida em que, de certa forma, ignora todos os muitos desastres ocorridos anteriormente. É como se nenhum deles fosse importante o bastante para se chegar a tal conclusão. E, mais ainda, carrega em si uma dose de crítica ao colocar as autoridades japonesas no lado errado da balança – afinal, se os reatores são os culpados pelos eventos desses dias, os responsáveis por eles estão nesta mesma onda (com o perdão do trocadilho). Este tipo de maniqueísmo é típico e ignora as muitas variáveis em torno das escolhas nacionais.
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