Acho que vale a pena fazer uma parada estratégica aqui pela América Latina. O grande tumulto em torno da vitória de Ollanta Humala no Peru é a reafirmação de um roteiro já bastante conhecido dos brasileiros. Quando nesta segunda-feira as ações negociadas no país andino tiveram a maior queda da história (12,5%), lá estava novamente o mercado mostrando sua vontade política. E o mercado é uma entidade quase religiosa, sem rosto e sem nome, e com muito poder. Curiosamente, no entanto, toda esta força tem seu ponto fraco. E, ainda mais estranho, é que ele sente medo – algo terrível e ironicamente humano.
É assim contraditoriamente mesmo que as operações e reações do mercado são meramente noticiadas sem maiores explicações. E quando mencionei que esta atitude era familiar ao Brasil é porque se parece bastante com o frenesi causado pela primeira vitória eleitoral de Lula, em 2002. Havia temores de que o então presidente eleito fosse pôr em prática novo modelo econômico que colocasse em risco, justamente, o livre-mercado. Como se sabe, nada disso aconteceu. E o mundo dá voltas mesmo. Agora, quem diria, Humala tenta acalmar a situação mencionando Lula sempre que pode. O peruano argumenta que, assim como o brasileiro, não pretende transformar o país a ponto de expulsar o investimento estrangeiro. Da mesma forma que Lula, pretende distribuir riqueza.
No caso do Peru, isso é até mais fácil, dependendo do ponto de vista. A economia é hoje a que mais cresce no continente – incríveis 7% nos últimos 13 meses. O problema é que esta mesma fonte de riqueza pode se transformar na origem de problemas sociais graves. O país conseguiu este “milagre” econômico graças à exploração desmedida dos minerais e, principalmente, do atropelamento dos direitos dos povos que vivem no entorno das fontes. Isso inclui também a água. Aliás, não é desconhecida da região Andina a privatização da água. Isso já aconteceu na Bolívia pré-Morales. O novo presidente deve abordar esta questão. E ninguém sabe ao certo o que pode acontecer a partir daí.
A Eleição de Humala assusta os mercados por tudo isso. O ciclo financeiro virtuoso permanecia em curso em boa parte devido à promessa por parte de empresas privadas estrangeiras de investir mais de 40 bilhões de dólares no país. Isso iria acontecer desde que, é claro, o governo peruano continuasse a deixar de lado a discussão da regulamentação sobre a exploração de ouro, prata e cobre. Este é o tipo de dinâmica que lembra um pouco a da América Latina do século 16. É por aí mesmo. Humala é o penetra nesta festa do mercado e por isso ele sente “medo”.
É claro que também há muito confete a adornar este temor todo. Em parte culpa do próprio Humala. O fato de ele ser ex-comandante do exército é importante. O fato de, em 2000, ter tentado aplicar um golpe contra o regime do ex-presidente Alberto Fujimori é outro dado ainda mais importante. A proximidade com Hugo Chávez é simplesmente uma reafirmação do estereótipo do líder latino-americano contemporâneo. De toda a forma, o presidente eleito parece mais interessado em ser o novo Lula do que ser mais um Chávez.
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