Uma das eleições mais importantes do mundo terminou como se esperava. O partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), de Recep Tayyip Erdogan, recebeu 50% dos votos na Turquia. Não havia qualquer dúvida sobre a ampla aprovação popular do AKP, pelo contrário. A questão era saber se o partido conseguiria ganhar cadeiras suficientes no parlamento para realizar reformas quase de maneira unilateral, sem a necessidade de negociar com opositores. Erdogan precisará diminuir seu ímpeto para alterar a Constituição – como expliquei por aqui na semana passada – e terá de encontrar canais de diálogo com as demais legendas.
Dos 550 assentos do parlamento turco, o AKP levou 326. Não é pouco; Inclusive é um número bem próximo dos 330 necessários para que o partido propusesse um amplo referendo sobre reformas. Para tranquilidade da oposição, há margem de segurança à maioria absoluta (367 cadeiras) que permitiria realizar todos esses projetos de alteração política sem necessidade de consultas com os demais partidos.
Erdogan é hoje o líder mais popular nos países árabes e islâmicos. Este é um fato incontestável que celebra a inteligência e a rara capacidade de adaptação de um político repleto de perspicácia. Mesmo no discurso deste domingo, quando muitos acreditavam que ele demonstraria alguma contrariedade, conseguiu usar a retórica a seu favor.
“Acreditem em mim, Sarajevo venceu hoje tanto quanto Istambul, Beirute, Izmir, Damasco, Ancara, Ramallah, Jenin, Cisjordânia, Jerusalém e Diyarbakir (cidade no sudoeste da Turquia”, disse.
O primeiro-ministro turco sabe do poder de atração que exerce sobre o mundo árabe e islâmico e faz questão de surfar neste potencial. Seu projeto de liderança regional fica cada vez mais claro e ele quer mais é deixar tudo muito evidente. Quando se transforma em porta-voz de árabes e islâmicos e não apenas dos turcos, encontra eco nos demais países porque passa a ser a alternativa viável. E justamente no momento em que boa parte dos Estados do Oriente Médio é palco de manifestações populares que buscam um modelo democrático capaz de conciliar as demandas por liberdade e a religiosidade que envolve muitos de seus cidadãos.
Nem EUA, nem Irã ou Síria. A Turquia é um modelo político viável que equilibra democracia e islamismo. Esta é a mensagem internacional do primeiro-ministro turco. É graças a ela que tem conseguido se transformar em polarizador regional. Por isso que a aliança com Assad, na Síria, corre riscos. Erdogan abriu as fronteiras aos refugiados sírios porque seu projeto político pessoal é mais importante que a amizade ou admiração pelo presidente do país vizinho.
Curiosamente, no entanto, os críticos domésticos de Erdogan são sutilmente atropelados. Há sete mil páginas na internet banidas devido a críticas pessoais ao político ou ao regime; há uma lei em discussão que pretende aprovar o banimento de uma lista de palavras na internet; 57 jornalistas estão presos; Hoje, no ranking de liberdade de imprensa, a Turquia ocupa a 138ª colocação (em 2008, ocupava o 102º lugar), atrás de Estados notadamente antidemocráticos, como Zimbábue e Argélia.
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