Os ataques terroristas a Mumbai, na Índia, talvez sejam exemplos muito raros de atentados perpetrados por grupos desconhecidos. Ou melhor, organizações que se escondem e deixam de reivindicar autoria. Na maior parte das vezes, os agentes de banhos de sangue coletivos a civis fazem questão de serem identificados. Para eles, quanto maior o número de mortos, mais evidente o sucesso da operação. É uma lógica perversa cuja violência é difícil de ser compreendida – o terrorismo, por si só, já é uma estratégia de luta condenável que não merece qualquer tipo de justificativa.
No caso específico deste ataque recente, há toda a sorte de especulação. E não duvido nada que esta falta de pistas seja proposital, que o objetivo seja justamente provocar confusão. Os primeiros suspeitos são, claro, os paquistaneses. Rivais históricos da Índia, acobertam diversas organizações terroristas que agem sem grandes problemas a partir do território. O Lashkar-e-Taiba (LeT), responsável pelo caos perpetrado em Mumbai, em novembro de 2008, é a opção mais óbvia. Mas não é a única. Principalmente porque a enorme complexidade regional tem na decadência do próprio Estado paquistanês uma de suas principais raízes.
A suspeita também recai sobre os Mujahedin Indianos, facção associada ao LeT originada a partir do Movimento de Estudantes Islâmicos da Índia. Este é o único cenário que existe até agora. Mesmo assim, não passa de especulação. A partir deste ponto, há uma profunda divergência sobre que tipo de relação mantém esses dois grupos terroristas. A primeira possibilidade gira em torno de uma espécie de “corrida por legitimidade”, uma competição entre eles que poderia ser interpretada como sinal de descontentamento por parte dos jihadistas indianos. Esta insatisfação estaria direcionada ao próprio LeT e sua suposta falta de iniciativa de apoiar ataques terroristas internacionais. Esta é a teoria mais complexa.
A possibilidade que mais me convence é justamente a mais simples. A ideia de que LeT e Muajedin Indianos agiram em conjunto e de maneira coordenada. É tentador aos dois grupos ver a região cada vez mais instável. Provocar a troca de acusações entre Paquistão e Índia é, na prática, jogar dois importantes e estratégicos aliados americanos um contra o outro. E não é nada complicado de se alcançar este objetivo, já que os dois países convivem com períodos de hostilidade mútua há 60 anos. E nada melhor do que distanciá-los agora em que havia um movimento de aproximação cuidadosa entre seus governos. Além disso, a desconfiança americana sobre o Paquistão aumentou depois da operação de captura de Osama bin Laden, em março passado (e das consequentes revelações sobre o esconderijo do homem mais procurado pelos EUA, abrigado numa casa localizada a metros da academia militar paquistanesa).
Os ataques acontecem justamente na semana em que Washington informa a intenção de reduzir a ajuda econômica a Islamabad. Se o objetivo era provocar confusão e distanciamento, parece que a ideia dos atentados foi bem-sucedida. A ponto inclusive de facilitar a difusão de ideias favoráveis ao confronto.
“Se o estabelecimento da supremacia civil sobre os serviços de inteligência militar paquistaneses se provar impossível, a Índia deve adotar a política de levar a luta ao território (do país) vizinho a partir do qual os ataques terroristas se originam (...). Como a Índia não possui tal inteligência e capacidade militar hoje, deve investir todos os meios necessários para adquiri-las”. Essas não são palavras de algum fanático, mas do indiano Ramesh Thakur, professor de Relações Internacionais na Universidade Nacional da Austrália.
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