A Rússia reage mal quando pressionada. Esta não é uma novidade. Com Putin à frente do país, a política de enfrentamento com o Ocidente passou a ser determinante às ambições nostálgicas do presidente. Diante da divulgação do projeto americano de armar Estados do leste europeu, a tendência é que Moscou reaja. OS EUA irão alocar na Europa oriental tanques, veículos de guerra e artilharia. A ideia é reforçar a Otan, a aliança militar ocidental, e responder principalmente às demandas do leste europeu – que se sente cada vez mais ameaçado pela Rússia.
Houve uma sucessão de acontecimentos desde a invasão russa à Ucrânia no ano passado. A decisão de Putin de anexar a Crimeia e Sevastopol causou alarme aos ex-membros da União Soviética e da chamada Cortina de Ferro. Este era um movimento de certa maneira já previsto pelos russos, mas, mesmo que Putin imaginasse uma reação ocidental mais assertiva, ele tinha a seu favor os eventos de agosto de 2008, quando a Rússia invadiu a Geórgia e, na prática, não foi confrontada pela comunidade internacional. A Ucrânia pode ter sido mais uma tentativa de testar os limites. Por mais que as sanções ainda estejam em vigor e a economia russa perceba seus efeitos reais (principalmente neste momento de crise), a resposta militar não aconteceu. Ou, pelo menos, alguma sinalização disso.
Os países do Báltico (Estônia, Letônia e Lituânia) jamais se sentiram seguros. Se os russos se consideram ameaçados pelas incursões ocidentais em sua antiga esfera de influência, há no Báltico a certeza de que é lá onde Putin dará a sua próxima cartada no jogo político internacional. O Kremlin nunca aceitou de fato a adesão de ex-repúblicas soviéticas à Otan.
Este jogo de soma zero ganha agora elementos da Guerra Fria; os americanos aportam armamento na fronteira russa; os russos acrescentam mais 40 mísseis balísticos intercontinentais em seu arsenal nuclear. Há uma evidente escalada e os dois lados já deixaram o discurso para trás. Por ora, em termos práticos, a Rússia deu os passos mais importantes (e ousados): na guerra da Geórgia, em 2008, e na anexação de parte do território ucraniano, em 2014. Nenhuma dessas ações foi respondida. Até agora.
Os equipamentos militares americanos serão colocados em seis territórios: Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia e Romênia. É uma resposta clara ao temor desses países, mas também uma tentativa de reforçar a Otan, aliança cuja existência já vinha sendo questionada. De um lado, atende ao propósito de Washington de não deixar morrer uma organização importante para sua estratégia de presença global; de outro, cumpre com a promessa de mandar um recado claro aos russos sem necessidade de envolvimento direto na guerra da Ucrânia. O único problema deste caminho é que há outras questões em que os interesses americanos cruzam com os russos. Um caso especial é o Irã. No próximo dia 30, vence o prazo final estipulado pelo P5+1 (EUA, Grã-Bretanha, Alemanha, França, Rússia e China) para alcançar os termos definitivos do acordo nuclear com o Irã. Por mais que os americanos estejam à frente do processo de negociação, a Rússia tem relação mais próxima com Teerã. Não seria surpreendente se, diante do movimento americano na Europa, Moscou optasse por dificultar a situação com os iranianos.
Putin sabe como Obama considera prioritário resolver a crise nuclear com Teerã. Este seria um dos principais legados internacionais dos oito anos de governo Obama. Com americanos e russos em rota de colisão, os eventos se misturam e as decisões dos lados influenciam diretamente em questões que, aparentemente, não estão relacionadas.
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