A cada nova decepção com a Europa, a cada perspectiva de mais exigência de austeridade, a cada novo índice negativo os dirigentes gregos desistem um pouco mais da União Europeia. O eixo das relações do país pode estar aos poucos em mudança. Em Atenas, há agora a possibilidade de buscar novos parceiros, principalmente aqueles que acenam com dinheiro neste momento de torneiras fechadas e caras amarradas em Bruxelas. O olhar da Grécia busca o leste. E o presidente russo, Vladimir Putin, busca o contra-ataque ao Ocidente. A crise da Grécia é sua grande oportunidade.
Em menos de três meses, o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, já esteve na Rússia duas vezes. Na última visita, dia 19 de junho, não saiu de mãos vazias. Em São Petersburgo, fechou com os russos um acordo preliminar no valor de 2 bilhões de dólares para a construção de um gasoduto. Rússia e Grécia têm um ponto comum: ambos se consideram injustiçados pelo Ocidente. Esta união dos rejeitados é oportuna aos dois governos. Para a Grécia, apresenta a perspectiva de ter algum trunfo nas negociações com os parceiros europeus, além de garantir, em médio prazo, uma fonte de receita permanente. Para a Rússia, as vantagens são ainda mais significativas.
A política externa de Putin se fundamenta na formação de alianças para se contrapor ao que considera como investidas ocidentais – para Moscou, o Ocidente faz ameaças constantes ao território russo. Para Putin, o caso ucraniano é emblemático, assim como todas as tentativas de expansão da UE aos países orientais do continente. Diante da guerra na Ucrânia (em que os russos anexaram as regiões da Crimeia e Sevastopol), o governo Putin, pessoas do círculo pessoal do presidente, empresas governamentais e privadas passaram a sofrer sanções da UE e do governo americano. Com a crise instalada – a economia não deve crescer, mas encolher 4,5%, e as reservas já caíram 28% desde o início de 2014 –, é preciso buscar alternativas econômicas e geopolíticas. O negócio do gás é o grande trunfo do Kremlin. Não é novidade, os russos já fizeram uso desta carta antes, principalmente após o processo histórico que ficou conhecido como a Revolução Laranja, em 2004, também em função de eventos políticos na Ucrânia.
A Ucrânia é um ponto de apoio fundamental à Rússia. É pelo território do país que passa a maior parte dos gasodutos russos. São esses gasodutos que abastecem cerca de 10% da demanda de gás de toda a União Europeia. Diante da guerra na Ucrânia e do confronto com a UE, a Rússia sabe que este é o momento para mudar a rota do gás. A Grécia surgiu como alternativa econômica e política. O megaprojeto de refazer os dutos irá permitir a Moscou se livrar da dependência dos ucranianos, reconstruindo os gasodutos pelos territórios turco e, possivelmente, grego. Do ponto de vista político, a Grécia é uma aliada ainda mais importante. É uma maneira de sinalizar o poder russo aos europeus. O raciocínio é simples: se a UE estiver disposta a levar a Ucrânia a seu campo de influência, a Rússia aponta que pode fazer o mesmo, mas de maneira oposta, com a Grécia.
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