segunda-feira, 15 de junho de 2015

Os curdos no novo cenário político da Turquia

Apesar de não ter vencido as eleições, o Partido Democrático do Povo (HDP) conquistou um feito histórico: pela primeira vez concorrendo sob uma mesma legenda os curdos ultrapassaram o mínimo de 10% de votos e estarão representados no parlamento. Os 80 membros eleitos do partido – de um total de 550 assentos da Assembleia Nacional – adicionam um elemento novo no jogo político oficial. Especialmente neste momento de indefinição quanto aos rumos da Turquia. 

Os curdos correspondem a 18% dos pouco mais de 80 milhões de habitantes do país. Desde 1984, o movimento nacionalista que reivindica mais direitos à minoria encontrou representatividade no Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) . O grupo seguiu o caminho da guerrilha, fez atentados no país e seu líder, Abdullah Ocalan,  está preso de 1998. O Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), do presidente Recep Tayyip Erdogan, iniciou processo de aproximação com os curdos, na tentativa de encontrar uma solução para suas as demandas e resolver mais de 30 anos de conflito. Em fevereiro de 2015, os anos de negociações secretas entre Ocalan e o governo turco pareciam estar prestes a terminar, e o líder curdo determinou que seus correligionários se reunissem para tentar alcançar um acordo definitivo e dar fim à luta armada que, de acordo com autoridades da Turquia, já causou a morte de 40 mil pessoas. 

No entanto, a disputa eleitoral provocou a interrupção do que parecia ser o caminho natural que daria fim às hostilidades. Na tentativa de alcançar a maioria absoluta do parlamento, a campanha do AKP passou a retratar o HDP – o partido oficial curdo – como indiferente aos interesses nacionais da Turquia. Simultaneamente, Erdogan enfureceu a minoria ao se recusar a fornecer ajuda militar aos curdos da Síria durante os combates contra o Estado Islâmico. O HDP, por sua vez, optou por apresentar agenda mais liberal, em busca de apoio nacional. O plano funcionou e o partido agora é parte do sistema e tenta encontrar uma saída para o nó político formado a partir da divulgação dos resultados eleitorais. A tática do AKP de isolar as ambições políticas curdas para conseguir mais votos e obter a maioria absoluta no parlamento não funcionou. Agora, Erdogan parece ser vítima da própria estratégia, na medida em que as demais legendas ainda não acenaram com a possibilidade de coalizão. 

Durante as comemorações pelos resultados das eleições, Selahattin Demirtas, líder do HDP, declarou que o “debate sobre a ditadura” havia terminado, numa clara referência aos planos de Erdogan – por ora fracassados - de alterar o sistema de governo. Politicamente, os curdos não podem ser ignorados por Ancara. Mas, se a representatividade da minoria está garantida, Erdogan ainda mantém a maioria do parlamento e pode alcançar a sonhada maioria absoluta caso consiga formar aliança com o Partido do Movimento Nacionalista (MHP) que obteve 80 cadeiras no parlamento. É pouco provável que isso aconteça, mas não é impossível. Se em algum momento os partidos adotarem o pragmatismo e se unirem, terão a maioria absoluta na Assembleia Nacional, com 338 assentos. Para os curdos, representaria um novo desafio, na medida em que o MHP se opõe à concessão de mais direitos à minoria. 

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