A justiça da Escócia decidiu libertar o líbio Abdel Basset Ali al-Megrahi, julgado responsável pelo atentado a bomba que explodiu, em 1988, o voo 103 da extinta Pan Am, causando a morte de 270 pessoas. Ele foi solto após cumprir somente oito anos de pena numa decisão polêmica e que ainda vai dar muito pano pra manga. No centro da justificativa para deixá-lo retornar em liberdade para a Líbia, o conceito de “compaixão” pelo fato de o terrorista sofrer de câncer de próstata em estado avançado e estar à beira da morte.
Existe grande controvérsia em torno de todo o caso, até porque o próprio julgamento do líbio foi posto em dúvida algumas vezes. Há suspeitas sobre a idoneidade de todo o processo. Seja como for, a Justiça escocesa manteve sua decisão de considerá-lo culpado. Mas ontem mexeu nesse vespeiro e causou grande sofrimento às vítimas, vibração na Líbia, perplexidade internacional e até uma derrota retroativa do governo Bush.
Ao ser recebido por uma multidão no aeroporto de Trípoli, a capital líbia, Megrahi – que também é ex-agente do serviço de inteligência de seu país – causou arrepios no ex-presidente americano, que descansa em seu conhecido rancho em Crawford, Texas.
A Líbia era, até ontem, o grande “case” vitorioso da política externa Bush, cuja relação com os demais países – ainda mais do chamado “mundo árabe” – sempre foi de mal a pior.
Mas, Bush se orgulhava de ao menos ter conseguido “reabilitar” o Estado controlado com mão-de-ferro por Muamar Kadafi, tendo levado o país de volta à comunidade internacional, inclusive presidindo o conselho de segurança rotativo da ONU (!).
Porém, ao promover a calorosa recepção ao terrorista no aeroporto da capital do país, Kadafi levou a Líbia de volta aos anos 1980, quando gozava do status de inimigo internacional número um, patrocinando atentados e abrigando seus mentores – uma espécie de al-Qaeda armada com aparato de Estado.
É uma reviravolta estranha, uma vez que Kadafi vinha se esforçando nos últimos anos para ser novamente aceito internacionalmente. Seus atos mais recentes mostram bem este movimento: desmantelou o programa nuclear do país, admitiu a responsabilidade governamental pelo próprio atentado contra o avião da Pan Am e pagou compensações financeiras aos parentes das vítimas.
Agora, entretanto, tudo pode começar a se esvair novamente. Obama classificou a libertação do terrorista como um erro. Mas foram as palavras do ministro das relações exteriores britânico, David Miliband, que mostraram bem como a recepção calorosa de Megrahi promovida por Kadafi pode mudar a maneira como a Europa irá se relacionar com a Líbia a partir desta confusão toda.
“A maneira como o governo líbio vai atuar nos próximos dias será bastante importante para moldar a opinião mundial sobre a aceitação do país na comunidade dos Estados civilizados”, diz.
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