A decisão do governo Obama de suspender a instalação do escudo antimísseis na Polônia e na República Tcheca mostra como a Casa Branca enxerga estrategicamente o relacionamento com a Rússia. O tema foi exposto no texto da última quarta-feira e, se por um lado consegue devolver a bola para a “quadra” de Moscou, mostra certa inocência por acreditar que, a partir de agora, o Kremlin estaria disposto a cooperar com os americanos diante da ameaça iraniana.
Mas esta é uma premissa equivocada. Os teóricos e práticos responsáveis por elaborar as diretrizes internacionais da única superpotência global estão distantes de qualquer tipo de amadorismo. A decisão foi tomada porque os EUA sabem como seria desastroso aos russos – que optam por permanecer em cima do muro e seguem a perigosíssima linha de não pretender ficar mal com ninguém – expor que na prática Medvedev e Putin estariam um tanto realizados se Obama se enrolasse num problemático conflito com o Irã.
A sinuca foi devolvida. Caberá agora aos russos retribuírem a “gentileza” americana. E este novo capítulo de um dos mais importantes vértices da política internacional já tem data para acontecer: a próxima quarta-feira, dia 23, quando o presidente Dmitri Medvedev estará em Nova Iorque para participar da Assembleia Geral da ONU.
Até lá, no entanto, um novo elemento divulgado na noite desta quinta-feira promete complicar ainda mais o assunto: a Associated Press (AP) afirma ter tido acesso a um anexo secreto de um documento da Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA, sigla em inglês) sugerindo que seus técnicos estão convencidos de que o Irã pretende sim construir uma bomba. E mais: o relatório diz que a República Islâmica possivelmente já teria testado um componente-chave para a obtenção do armamento.
Nunca duvidei das intenções militares do programa nuclear de Teerã. Acho, entretanto, que as informações publicadas pela AP devem ser explicadas pela IAEA. Afinal, vale lembrar que, em 2 de setembro, seu dirigente Mohamed El Baradei – que deixará o cargo em novembro – afirmara não haver qualquer prova concreta quanto à possibilidade de o Irã produzir armas nucleares num curto período de tempo.
Ora, como um anexo da IAEA pode contrariar informações divulgadas há pouco por seu dirigente máximo?
É um tanto lastimável perceber como, às vésperas de um de seus encontros mais importantes, a ONU pode estar desacreditada – a IAEA é um órgão das Nações Unidas. E não apenas por este relatório divulgado pela AP, mas também pelo polêmico documento sobre a guerra em Gaza.
A instituição – criada sob os escombros da Segunda Guerra para garantir a paz mundial – pode estar se esfacelando por conta da arriscada opção que seus membros têm tomado de privilegiar determinadas posições políticas. Acho que uma das alternativas seria transformar a Assembleia Geral da próxima semana numa oportunidade para se discutir seriamente o futuro da ONU. Até porque sua existência é mesmo imprescindível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário