Todo este imbróglio ainda em curso envolvendo as novas sanções ao Irã prejudica os EUA. Para ser mais específico, é ruim para Barack Obama. No final das contas, a imagem que vinha tentando construir como líder de um novo mundo multilateral ficou arranhada. Talvez por isso seja de Hillary Clinton a missão de anunciar os passos tomados pelo governo americano. É ela também quem está a frente de processos como a adoção de medidas unilaterais da Casa Branca. Penso que o Brasil não se saiu mal de tudo isso: tentou negociar, conseguiu um acordo onde as grandes potências já haviam falhado e, agora, termina como o "marido traído" da situação. Se este cenário obviamente não é o ideal, ao mesmo tempo não compromete os esforços do Itamaraty.
Importante saber agora quais serão as consequências no rumo da política externa brasileira. Por mais que o desgaste com os EUA seja claro, é inteligente manter o pragmatismo. Tentar adotar atitudes reativas a europeus e americanos é besteira. Quem mais perde é o Brasil. Já está claro que o país representa hoje uma liderança regional inquestionável e um ator internacional de peso. São ganhos expressivos. A vaga para o Conselho de Segurança da ONU virá em algum momento.
Um ponto que considero importante é o papel russo nisso tudo. Na véspera da viagem a Teerã, Lula se reuniu com o presidente Dmitri Medvedev, que em nenhum momento avisou que estaria disposto a furar qualquer resultado alcançado entre turcos, brasileiros e iranianos. A Rússia mantém uma postura profundamente ambígua em suas relações internacionais. Não haveria por que ser diferente em relação ao Brasil e suas ambições geopolíticas. E Moscou continua a atuar desta maneira.
Mesmo após concordar com as sanções capitaneadas pelos EUA, o ministro das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, disse a Hillary Clinton estar comprometido com as punições "a princípio" somente. Segundo ele, o acordo alcançado por Brasil e Turquia deixaria claro o desafio da comunidade internacional de lançar um "novo olhar" sobre o impasse iraniano. Ou seja, Moscou permanece em cima do muro. E, como se sabe, este tipo de postura costuma esconder uma grande possibilidade de os russos seguirem um caminho descompromissado com qualquer um dos lados.
O problema para o Brasil é que a Rússia é um dos vértices dos BRICs. O Itamaraty tem o Kremlin em alta conta em suas pretensões geopolíticas. E tomar uma punhalada de um parceiro é muito pior do que ser traído por um adversário. Ainda mais se o país em questão é considerado pela diplomacia brasileira como um dos principais agentes capazes de apoiar Brasília em questões de relevância mundial. Como se viu agora, os russos não pensam da mesma forma.
Joe Klein, da revista Time, apresenta uma explicação para este comportamento em relação à questão iraniana. Para ele, Moscou deu mais um exemplo de sua política baseada no potencial energético do país. Quando contrariados, os russos reagem levando em conta somente os prejuízos que podem sofrer nesta área.
"Os russos não ficaram satisfeitos quando souberam pelos americanos que os iranianos estavam construindo uma usina nuclear secreta em Qum. Eles ficaram ainda mais insatisfeitos quando as autoridades iranianas disseram estar mais confortáveis para enviar seu urânio para a Turquia, não para a Rússia. Isso tudo alimentou suspeitas de que Irã e Turquia poderiam planejar um acordo para a construção de um gasoduto que levasse gás natural de Irã e Turcomenistão para a Europa através da Turquia, o que poderia quebrar o monopólio russo", escreve.
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