Há algo muito além da crise econômica nos países europeus mediterrâneos e na Irlanda. Com a Alemanha finalmente tomando a frente do concerto de nações envolvidas em ajudar principalmente os gregos, a natureza da União Europeia corre sérios riscos. Tudo isso porque os eleitores alemães deixaram claro que não estão dispostos a pagar para resgatar as economias mais fracas do bloco. E isso pode mudar tudo.
A questão é interessante porque mistura uma série de fatores: economia, nacionalismo, identidade e senso de pertencimento. O recado recebido pela chanceler alemã, Angela Merkel, veio das urnas e tão logo seu gabinete aprovou o pacote de quase 1 trilhão de dólares a serem destinado à Grécia: seu partido, o Democrata-Cristão, teve o pior desempenho nas eleições locais desde a Segunda Guerra Mundial. E justamente na Renânia do Norte-Vestfália, o maior estado alemão.
A situação de descontentamento não é exclusiva da população alemã, mas um consenso generalizado entre os membros da UE menos atingidos pela crise. Na prática, a mensagem é bem simples e direta: os eleitores das economias que sustentam o bloco não legitimam que seus líderes transfiram parte de sua riqueza para os países em dificuldades. O momento oferece uma oportunidade única – e que certamente será desperdiçada – para analisar dois processos que correram paralelamente e nunca se encontraram: a união política dos Estados da UE não foi capaz de, num curto espaço de tempo, criar a mentalidade em seus habitantes de que eles compartilham um destino comum.
Assim, agora simplesmente está muito claro que alemães e holandeses não acreditam que o estado de caos e falência grega seja algo com que a Alemanha ou a Holanda devam se preocupar. É basicamente isso que George Friedman, fundador do Stratfor, apresenta em artigo publicado hoje. Um texto perfeito, diga-se de passagem.
"Na fundação do projeto europeu estava a ideia de que essas nações poderiam ser transformadas num único regime econômico e que este poderia amadurecer e se transformar numa única entidade política.(...) A história europeia desde a Revolução Francesa mostra a resistência do conceito de Estado-nação. Tanto a Alemanha Nazista e União Soviética tentaram criar Estados multinacionais dominados por um único ator. Ambas as tentativas falharam e se tornaram odiadas por isso", escreve.
Ou seja, se colocar em prática o regime supranacional em áreas como Defesa e Política Externa já causava resistência – vale lembrar a enorme rejeição à simples ratificação do Tratado de Lisboa, assunto já amplamente discutido aqui no blog –, imagine quando a UE passa a representar prejuízo e desfalque nas economias mais fortes do bloco? Acho mesmo que o futuro europeu passa pela superação da crise nos chamados PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha, na sigla em inglês) e de como os descontentamentos internos e as repercussões políticas vão ser administradas daqui para frente.
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