quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Cheiro de golpe no Equador

Ainda há muitas informações desencontradas sobre o caos que toma conta do Equador. O que se conhece claramente apenas é o ponto de partida de tudo isso: a revogação dos benefícios concedidos a policiais e militares, além da decisão de aumentar de cinco para sete anos o período previsto para a concessão de promoções às tropas. Antes de colocar em xeque todas as democracias sul-americanas – o que seria tentador, mas equivocado –, é preciso lembrar que a posição presidencial equatoriana é historicamente instável mesmo. O país teve oito diferentes presidentes desde 1997. Curiosamente, um deles – Abdalá Bucaram – foi declarado "mentalmente incapaz" de exercer o cargo pelo Congresso.

A situação atual lembra um pouco a tentativa de golpe contra Hugo Chávez, em abril de 2002. Na ocasião, o chefe das forças armadas declarou que o presidente havia se demitido, e as emissoras de televisão privadas repercutiram com regozijo a suposta informação. Por conta disso, hoje o presidente venezuelano partiu em defesa de um de seus maiores aliados políticos. Por sua vez, o presidente do Equador, Rafael Correa, declarou estado de exceção e permitiu apenas que a TV pública continuasse a transmitir. Não é coincidência. A memória do que aconteceu na Venezuela em 2002 ainda está bastante viva.

É importante citar que o próprio Correa levantou a possibilidade de estar sendo vítima de uma tentativa de golpe. Mas é preciso deixar claro que o presidente tem a opinião pública interna a seu favor. Além disso, a OEA já declarou estar a seu lado, e a Unasul fez o mesmo.

Aliás, a situação é um importante teste para o organismo recém-criado. Não que tropas sul-americanas irão invadir o país e entrar em confronto com os militares. Mas esta perspectiva pode ser útil de forma a evitar um golpe de Estado – o que seria muito ruim para a América Latina ainda mal-resolvia com a bem-sucedida derrubada do presidente Manuel Zelaya, em Honduras

No caso do Equador, o posicionamento rápido dos atores pode ajudar a contornar este imbróglio com certa rapidez. Até porque o próprio comandante das forças armadas equatorianas, Ernesto González, disse permanecer subordinado ao presidente. O que mais me chamou a atenção nisso tudo foi a tomada do aeroporto de Quito por 150 homens da força aérea. A logística de uma operação deste tipo não é simples. E o contingente envolvido foi bastante considerável. Por isso, é preciso ficar atento às informações que surgirão em breve, mas creio ser possível dizer que, por trás deste episódio, existe mais do que simplesmente um descontentamento pontual dos militares.

Os protestos na Europa e a ascensão da extrema-direita

Na quarta-feira passada, fiz uma análise sobre o ressurgimento do extremismo político europeu – aliás, mais do que reaparecer, a influência de ideias radicais tem se expandido. Não procurei provocar nenhum tipo de alarmismo - até porque o site não existe para isso. O propósito era simplesmente projetar cenários com base no que está acontecendo. Pois bem. Uma semana depois, três eventos fundamentais contribuem para reafirmar que é só uma questão de tempo para que os partidos de extrema-direita se transformem em peças políticas relevantes no continente.

No primeiro caso, este é um fato dado. A Holanda, país associado às mais diversas formas de tolerância, acabou por ceder e decidiu incluir o Partido da Liberdade, do extremista Geert Wilders, na coalizão que decidirá os rumos do país. Foi a única forma encontrada para encerrar o impasse iniciado em fevereiro, quando o gabinete liderado pelos Democratas Cristãos caiu. A partir daí, um governo provisório assumiu. Mas a situação foi resolvida. Os extremistas – que nas eleições de junho conquistaram um terço dos votos – não estarão mais à margem do sistema, mas farão parte dele.

Esta parece ser uma tendência europeia, ainda mais devido ao desencanto com os partidos de esquerda. A grande greve que mobilizou boa parte dos trabalhadores do continente nesta quarta mostra um grau de insatisfação bastante considerável. As medidas de austeridade adotadas para reduzir gastos e serviços públicos são impopulares por natureza. A taxa de desemprego atinge níveis absurdos. Na Espanha, por exemplo, chega a 20%. E não é preciso muito esforço para lembrar quem mais se aproveita deste tipo de cenário.

A extrema-direita costuma encontrar seus mais ávidos partidários em momentos de profunda fragilidade como este. A solução fácil de apontar o trabalhador estrangeiro como o responsável pela falta de emprego está em alta. Some-se a isso as novíssimas revelações de planos da al-Qaeda de voltar a atacar a Europa, e a realidade está posta. Parte importante dos cidadãos europeus hoje sonha com as ideias defendidas pelos partidos ultranacionalistas – ignorar o mundo global de trânsito livre e fluxos migratórios em nome do retorno a um status idílico de pureza nacional. Cabe lembrar que, diante disso, a própria União Europeia corre sérios riscos.

Do ponto de vista do fundamentalismo islâmico – cujos planos de novos ataques foram revelados nesta semana pelo canal de televisão Sky News –, quanto pior, melhor. Na medida em que os radicais não concebem qualquer ideia de convivência harmoniosa entre culturas distintas, a enorme população muçulmana presente nos países europeus acaba por se tornar uma excelente massa de manobra. Quando o cenário político do continente confirmar seus novos padrões, a polarização vai se acentuar ainda mais.

Ou seja, europeus irão recorrer à extrema-direita, e líderes islâmicos radicais encontrarão terreno fértil para recrutar adeptos. Este também é um dos sonhos de grupos como a al-Qaeda, que já declarou pretender vingar a expulsão dos muçulmanos da Espanha no século 15. Uma guerra de vingança travada na Europa seria vista como uma forma de fazer justiça retroativa. Pode parecer um pensamento absurdo, mas os radicais acreditam em teorias como esta.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Eleições na Venezuela, e semelhanças entre Chávez e Obama

De acordo com o primeiro relatório oficial publicado pelo Centro Nacional Eleitoral da Venezuela, a Assembleia Nacional do país passa a ter a seguinte divisão: o Partido Socialista Unido (PSUV), de Hugo Chávez, conseguiu eleger 95 representantes, enquanto a oposição ganhou 61 assentos. Ou seja, a perspectiva de maioria absoluta – 110 parlamentares – para qualquer dois lados não existirá. A situação muda de certa forma, uma vez que o presidente venezuelano vai precisar negociar com adversários políticos de forma a apontar ocupantes de cargos importantes, como juízes da Suprema Corte, por exemplo.

Acho que um dos aspectos interessantes da atual eleição venezuelana foi a significativa mudança das intenções da população. Não me refiro simplesmente aos resultados, mas à demonstração de que existe a preocupação de discutir projetos políticos. Se Chávez está no poder há quase 12 anos e durante este período já realizou inúmeros pleitos e plebiscitos, algo de diferente ocorre desta vez. Esta parece ter sido a primeira ocasião em que questões ideológicas foram menos relevantes.

Ainda existe uma enorme polarização no país, o presidente ainda é o grande protagonista das discussões entre situação e oposição, mas parece que o eleitorado quer discutir alternativas para enfrentar os muitos desafios: a inflação de 30%, o aumento dos índices de violência e as frequentes interrupções no fornecimento de energia. Ao contrário do ocorrido no último pleito, a oposição não incentivou seus partidários a não comparecerem às urnas. Até seus representantes parecem ter desistido da tentadora ideia de rotular Cháves como líder antidemocrático. É preciso reafirmar que observadores internacionais não costumam encontrar fraudes em eleições e plebiscitos venezuelanos.

Curiosamente, a atual situação de Chávez acaba por permitir alguns paralelos com um de seus maiores inimigos, o presidente norte-americano Barack Obama. Ambos enfrentam o teste das urnas quase simultaneamente; os resultados podem servir de prévia de eleições presidenciais a serem realizadas em 2012, quando os dois líderes tentarão se reeleger.

As semelhanças não param por aí. Obama e Chávez emprestam aos cargos que ocupam um forte teor ideológico e pessoal – nos EUA, inclusive, os críticos mais ferrenhos ao presidente americano costumam rotulá-lo de socialista, adjetivo que o inimigo venezuelano ostenta com muito orgulho. Para completar, ambos foram eleitos por conta de ideias progressistas, mas agora são contestados por populações que anseiam pela aplicação de soluções pragmáticas capazes de resolver questões importantes, como desemprego, violência e carência na área de infraestrutura.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Possíveis consequências políticas da retomada das construções de Israel na Cisjordânia

A decisão do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, permitindo a retomada das construções de colonos judeus na Cisjordânia desagradou a todos os personagens envolvidos no entrave israelo-palestino. Até o líder do governo israelense se viu vítima da própria arquitetura política que construiu. Sem os ultranacionalistas que o pressionaram a não renovar a moratória de dez meses ele mesmo não teria conseguido formar a coalizão que o sustenta no poder. É a história que vai determinar o preço que Bibi vai pagar por ter se metido neste imbróglio aparentemente sem saída.

O presidente americano, Barack Obama, tampouco está satisfeito, uma vez que se empenhou pessoalmente para colocar as partes de volta à mesa de negociações após 20 meses. Por ora, os resultados são nulos. Aos líderes do Oriente Médio, Obama dá mostras de irritação e já declarou a intenção de se envolver na questão somente depois das eleições legislativas americanas de 2 de novembro. Para a Casa Branca, fica o gosto amargo, quase a frustração total. Se avançar nas negociações de paz não é fator determinante para vitória interna dos Democratas, a estagnação do processo de paz às vésperas de um importante teste político nos EUA pode fornecer ainda mais material para as críticas cada vez mais ferozes do Partido Republicano.

Sabendo disso e com as mãos atadas pelos próprios compromissos políticos que assumiu para governar, não restou a Netanyahu nada mais a fazer a não ser pedir que os colonos fossem pouco festivos nas comemorações – no que foi solenemente ignorado. É curioso perceber como figuras políticas absolutamente opostas como Bibi e o presidente palestino, Mahmoud Abbas, se encontram em situação parecida. Enquanto o líder israelense cedeu às pressões de sua coalizão e mostra profunda falta de imaginação para encontrar qualquer solução sem desmoronar seu gabinete, Abbas também está de mãos atadas.

O presidente palestino precisa da pressão americana sobre Netanyahu para congelar a expansão dos assentamentos. Não vai poder contar com isso pelo menos durante o próximo mês. Tampouco pode recorrer à violência, como fez Arafat quando recusou a proposta israelense oferecida pelo então premier Ehud Barak, em Camp David, em 2000 – a segunda Intifada palestina foi lançada sobre os escombros do fracasso das negociações de paz. Digo que o presidente da Autoridade Palestina não pode fazer uso de tal recurso pelo simples fato de ele governar apenas metade de seu território, uma vez que Gaza continua sob controle do Hamas.

Por falar nisso, quem mais está satisfeito com este impasse é justamente o grupo radical. Desde o anúncio da retomada dos diálogos diretos, o Hamas mantém posição contrária a qualquer negociação (aliás, esta é uma das pedras fundamentais sobre a qual se apoia desde a fundação). É chegada a hora de colher os frutos. Poderia dizer também "chutar cachorro morto". Como o Fatah de Mahmoud Abbas foi expulso pelo grupo radical de Gaza em 2007, os fundamentalistas farão grande uso da retomada das construções judaicas na Cisjordânia para contestar ainda mais a liderança do presidente palestino.

Por sua vez, Mahmoud Abbas reagiu da única maneira possível diante da situação em que se encontra. Disse estar disposto a continuar a negociar – o mesmo foi dito por Netanyahu –, mas que levará a questão para debate na reunião da Liga Árabe marcada para a próxima segunda-feira. Não se trata apenas de uma forma de ganhar tempo como tem sido repetido desde a declaração, mas também uma maneira de buscar legitimidade, mostrar que quem representa as posições palestinas é a Autoridade Palestina, não o Hamas individualmente.

Agora, o mais importante: em entrevista ao jornal O Globo de hoje, o jornalista palestino Bassam Eid, diretor-executivo do Grupo Palestino de Monitoramento de Direitos Humanos (GPMDH), disse acreditar que alguma novidade está prestes a ser anunciada. Eu posso estar errado, mas apostaria no sucesso da formação de um governo de união nacional com Fatah e Hamas. Seria uma jogada de mestre neste momento, se o objetivo fosse derrubar de vez a coalizão de Netanyahu.

Juntos no poder e representando a Autoridade Palestina, Hamas e Fatah poderiam argumentar que estariam dispostos a retomar as negociações. Como os partidos que sustentam Bibi no cargo jamais admitiriam encontros diretos com o Hamas, o líder israelense estaria diante de um dilema realmente sem saída aparente: aceitar dialogar com este novo modelo da AP decretaria o ponto final no apoio dos partidos de direita – e talvez até dos Trabalhistas – ao gabinete, causando o fim do governo. Se não aceitasse negociar, reforçaria sua imagem internacional de intransigente, provocando nova chuva de críticas e um período de isolamento israelense muito parecido ao que aconteceu após a abordagem às embarcações turcas.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Direita ultraconservadora também se manifesta na política americana

Na quarta-feira, escrevi sobre o extremismo de direita que tem conseguido ganhar força na Europa. O erro de interpretação pode levar a crer que tal fenômeno político se restringe aos países europeus. Infelizmente, pensar desta forma é um engano. Cada vez mais presente no cenário das nações mais desenvolvidas, a reatividade diante da crise também encontra sua expressão na maior potência mundial. Nos Estados Unidos, atende pelo nome de Tea Party.

É bom deixar claro que tais grupos não identificam apenas a crise econômica como o estopim para suas reivindicações. Os extremistas são também fatalistas e entendem que "tudo está errado". Esse discurso pretende gerar pânico entre os menos atentos. É tentador e, pelo menos de acordo com números de pesquisas recentes, parece eficaz. Na prática, todos os partidos de extrema-direita costumam seguir a mesma cartilha: há impostos demais, imigrantes demais, poucos empregos – culpa dos imigrantes, é claro, até para fechar o ciclo da "complexa" argumentação – e é preciso retornar aos "valores originais fundadores da pátria".

Nos EUA, o Tea Party é um fenômeno novíssimo. Ao contrário dos similares europeus, não se configura ainda como partido independente, mas representa a ala mais conservadora do já conservador Partido Republicano. O movimento nasceu em fevereiro de 2009 e conseguiu se popularizar entre eleitores que detestam política, mas que consideram que "tudo está errado" (de novo!) – generalizações de todas as formas costumam servir de terreno fértil para a proliferação do extremismo.

O nome – cuja tradução é "Festa do Chá" – remete a um episódio fundamental da história país quando, em 1773, colonos americanos se revoltaram contra as altas taxas cobradas pelos britânicos sobre o comércio de chá. Revoltados, invadiram embarcações repletas do produto e jogaram toda a mercadoria no mar. O episódio acabou por precipitar a independência dos EUA, ocorrida três anos mais tarde. Toda esta alegoria é muito bem colocada, já que atinge dois objetivos fundamentais do atual grupo conservador: questionar a carga tributária em vigor, além de reafirmar suas convicções a partir do retorno a um mito fundador da nação.

É bom estar atento a este projeto político que enfrenta um importante teste nas eleições do próximo dia 4 de novembro. Na ocasião, os americanos vão às urnas para escolher novos representantes para a Câmara e o Senado, além dos governadores de parte da federação.

Para quem ainda não conhece as propostas do Tea Party, vale mencionar algumas de suas muitas bandeiras polêmicas: privatização do seguro social, revisão de certos direitos civis, proibição de aborto mesmo em casos de estupro, oposição ao projeto de Obama de reforma da saúde, redução do papel do Estado em questões como educação, fortalecimento de medidas anti-imigração e objeção a qualquer interferência no mercado financeiro.

"Não se trata de um partido, mas de algo ainda mais potente: é uma forma de pensar o sistema político", escreve Daniel Henninger, analista do Wall Street Journal. Ainda é muito cedo para acontecer já nas próximas eleições, mas imaginem se o movimento conseguir chegar à Casa Branca?

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Brasil faz ainda mais pressão em discurso na ONU

"O mundo não pode se permitir o risco de um novo conflito como o do Iraque. Por isso, temos insistido junto ao governo do Irã para que mantenha uma atitude flexível e de abertura às negociações. Mas é preciso que todos os envolvidos revelem essa disposição". Este é um trecho do discurso do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, durante a abertura da 65ª Assembleia Geral da ONU. Como já havia discutido no texto de terça-feira, a posição brasileira era barbada.

A grande estratégia internacional do Itamaraty compreende também um posicionamento ainda mais crítico em relação às potências ocidentais estabelecidas. Por isso, as palavras usadas pelo representante brasileiro nesta quinta foram duras:

"O Conselho de Segurança deve ser reformado, de modo a incluir maior participação dos países em desenvolvimento, inclusive entre seus membros permanentes."

Não apenas o texto, mas os recentes acontecimentos durante a estadia de Amorim em Nova Iorque evidenciam a posição em curso. Ao encontrar-se com a americana presa durante 14 meses no Irã, a diplomacia brasileira fez questão de destacar o papel fundamental de Brasília em sua libertação. É mais uma tentativa de mostrar dois aspectos que este governo considera relevante: a capacidade brasileira de dialogar com o Irã, e a centralidade do Brasil como interlocutor de peso que pode atuar nas questões mais importantes e complexas.

Além de explicitar tais aspectos no discurso, as ações procuram preencher de legitimidade as reivindicações. Mesmo não sendo atendido até agora em seu objetivo maior de reformar o Conselho de Segurança, o Brasil continua a enfatizar tal necessidade em todos os fóruns internacionais de que participa. Além disso, conta com o cenário do próximo ano para transformar as sonhadas modificações em realidade inevitável, com as participações de Brasil, Rússia, Índia, China, Turquia e África do Sul. Se isso acontecer, será praticamente impossível continuar a ignorar a relevância deste grupo de países no sistema internacional.

Amorim decidiu usar todas as formas de pressão de que dispõe. Por isso, reuniu-se com os demais ministros das Relações Exteriores dos BRICs com a intenção de propor que a ONU censure qualquer país que decida aplicar sanções unilaterais que não tenham sido aprovadas pelo Conselho de Segurança. Esta é uma forma de não apenas punir EUA e União Europeia por terem ignorado o acordo costurado por Brasil e Turquia na questão nuclear iraniana, mas também mostrar às Nações Unidas que Brasília ainda considera a instituição como o principal palco de discussões internacionais.

Isso no momento em que – como já discutido nesta semana – muitos colocam em dúvida a relevância da ONU. Ao tomar tal atitude, Brasília reforça seu compromisso com a organização na esperança de que ela reconheça tal esforço – de preferência, apoiando abertamente as reivindicações brasileiras.

Para concluir, confesso que tenho lido com certo espanto comentários sobre a atitude raivosa de Ahmadinejad durante seus discursos. Muitos analistas diziam ter expectativa de que ele buscasse uma conciliação com os americanos em sua estadia em Nova Iorque. Ora, como o Irã é um dos principais entraves internacionais contemporâneos, o presidente do país exerce o papel que seus maiores aliados esperam dele. Brasil e Turquia pretendem mostrar que dialogar com Teerã é a única forma possível de interação. Já europeus e americanos aplicam sanções unilaterais de forma a pressionar a república islâmica.

Se Ahmadinejad adotasse discurso mais ameno, simplesmente premiaria os países que o puniram. Em busca de ainda mais relevância internacional, manter o presidente iraniano raivoso é tudo o que brasileiros e turcos mais querem. Assim, justificam a abordagem conciliatória pela qual têm optado. O Irã é um ponto fundamental para as aspirações brasileiras – pelo menos, assim pensam os arquitetos das estratégias do Itamaraty. Da mesma forma, Teerã percebe que isso pode valer como rota de fuga das sanções. Neste caso, uma mão lava a outra.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A nova onda da velha Europa

"A Onda" é um filme baseado nos relatos do professor americano Ron Jones, que, em 1967, criou um experimento com seus alunos em Palo Alto, na Califórnia, para mostrar, na prática, como Hiltler conseguiu ascender politicamente na Alemanha da década de 1930. Como o original é muito difícil de conseguir, vale assistir à refilmagem, de 2008, do diretor Dennis Gansel. Muito mais grave do que o exercício demonstrado no longa-metragem, é a nova onda política europeia. A alardeada guinada à direita ocorrida nas eleições suecas não é nada se comparada ao atual cenário do continente.

Em primeiro lugar, causou espanto o resultado obtido pelo partido de extrema-direita Democratas da Suécia por ele ter conseguido 20 cadeiras no parlamento de uma só vez. Isso representa somente 4% dos assentos, mas é um crescimento digno de nota quando se leva em consideração que o partido não tinha conseguido emplacar até agora qualquer representante. No entanto, é importante dizer que a situação será controlada por ora na medida em que o primeiro-ministro social democrata, Fredrik Reinfeldt, deve conseguir apresentar um novo governo no dia 4 de outubro.

Já no quadro político europeu mais amplo, a tendência de crescimento da extrema-direita é bastante preocupante. O Democratas da Suécia é o prolongamento das muitas variáveis continentais cujo discurso é baseado na busca por bodes expiatórios para as crises econômicas e identitárias: a Frente Nacional da França, o Vlaams Belang na Bélgica, a Liga Norte italiana, o Partido da Liberdade holandês e os similares em Dinamarca e Hungria. Todos têm em comum o forte apelo nacionalista e a identificação dos imigrantes – com mais força os muçulmanos – como os grandes culpados pelos problemas nacionais. Isso sem falar na expulsão recente dos ciganos promovida pelo presidente Nicolas Sarkozy.

Este fenômeno se deve à conjunção de alguns fatores: o fracasso dos partidos de esquerda e centro-esquerda em apresentar soluções novas, a fragilidade das comunidades de imigrantes, e a busca pelo retorno a um antigo modelo de identidade nacional diante do novo mundo que se apresenta. A grande contradição na opção pelo voto na extrema-direita é que ela não contribui com qualquer novidade, mas simplesmente rejeita a realidade que está posta. Na prática, os extremistas apenas repaginam velhas ideias preconceituosas com os novos culpados à disposição.

Antes de encerrar, acho válido citar a situação desastrosa que ronda a Alemanha, principal economia do continente e, ao lado de França e Grã-Bretanha, maior força política da União Europeia. Com o governo da chanceler Angela Merkel em franca decadência, pesquisa realizada pelo Instituto Emind identificou um "nicho de mercado" perigoso: 20% dos eleitores estão ansiosos para votar na direita. Recentemente, o político de Berlim René Stadtkewitz fundou o partido "Liberdade", que segue o modelo do homônimo neo-fascista já atuante na Holanda.

Ainda é importante relembrar o episódio envolvendo Thilo Sarrazin (foto), ex-diretor do Banco Central da Alemanha demitido por suas declarações sobre muçulmanos e judeus (ele disse acreditar que os imigrantes muçulmanos enfrentam dificuldades para entrar no mercado de trabalho devido à falta de disciplina e inteligência e chega a sugerir que tais características seriam genéticas; sobre os judeus, defendeu que o grupo compartilha um gene comum que torna seus membros diferentes das demais pessoas). Já desempregado, lançou o livro "A Alemanha se Desintegra" onde expõe todas as suas ideias.

Ao contrário do que poderia se imaginar, a obra se tornou best-seller; já vendeu 600 mil cópias em menos de um mês. Nova pesquisa, desta vez realizada pelo Instituto Forsa, mostra que 18% dos alemães votariam num novo partido de direita com princípios anti-imigratórios cujo líder fosse justamente Thilo Sarrazin. É essa a nova onda da velha Europa. Mais uma vez.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Por que o Brasil precisa fortalecer a ONU

Rapidamente, acho que ainda há espaço para discutir um dos temas mais interessantes abordados no texto desta segunda-feira: as expectativas brasileiras em relação à ONU. Há algumas armadilhas prontas para derrubar as aspirações do Itamaraty a uma vaga permanente no Conselho de Segurança. A maior delas, sem a menor dúvida, é o processo em curso de decidir as questões relevantes políticas e militares à margem das Nações Unidas.

Este é um caminho que vem sendo seguido desde o início deste século. O ponto alto foi a decisão americana de invadir o Iraque, em 2003, apesar das considerações contrárias dos demais países-membros. Atualmente, como pontuei no texto de ontem, mesmo a ONU procura se escorar em outras áreas para justificar sua relevância. No entanto, tenho notado que o discurso de superação da organização como fórum de debates tem sido repetido bastante. Vale examinar um artigo publicado pela Bloomberg que analisa a Assembleia Geral em curso:

"O primeiro-ministro britânico, David Cameron, e o presidente brasileiro, Lula – cujos países têm assento no Conselho de Segurança –, não estarão em Nova Iorque. São os casos também do presidente russo, Dmitri Medvedev, e do primeiro-ministro Vladimir Putin; o presidente chinês, Hu Jintao, estará de fora, deixando a responsabilidade para o premier Wen Jiabao", diz o texto.

Em primeiro lugar, é importante esclarecer que Lula não estará presente porque optou por ficar no Brasil e fazer campanha para Dilma. Quando o veículo americano cita parte das lideranças mundiais como negligentes ao encontro, a Bloomberg já acena com o palco que possivelmente substituiria as Nações Unidas: o G-20. Seguramente, a reunião das maiores economias do planeta é importante, mas, sem a menor dúvida, não é representativa. Até porque não atenderia aos temas em discussão de agora: alternativas para salvar as populações mais necessitadas. Não é preciso dizer que os mais pobres não vivem nos países que compõem o G-20.

Especificamente para o Brasil a tentativa de mudar o palco de discussões não é nem um pouco interessante. O Itamaraty já deixou bem claro que pretende modificar a estrutura do Conselho de Segurança da ONU – a mesma desde sua fundação, em 1945 –, não simplesmente acabar com ele. É exatamente isso que o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, irá defender no discurso que fará nesta quinta-feira diante da Assembleia Geral.

E este é um momento fundamental para o sonho brasileiro de se tornar um ator internacional ainda mais relevante – e com o aval de uma posição permanente no Conselho de Segurança. O Brasil participa desta semana de encontros em Nova Iorque podendo exibir o trabalho feito em casa que levou o país a atingir a maior parte das Metas do Milênio estabelecidas no ano 2000.

E Brasília aguarda com ansiedade o próximo ano. Em 2011, o cenário nas Nações Unidas será o melhor possível para o exercício de poder internacional brasileiro. Além de o Conselho contar com China e Rússia como membros permanentes, dentre os rotativos a Índia concorre a uma vaga (o que colocaria todos os países do BRIC no palco das decisões mundiais), assim como a África do Sul – aliada recente das posições brasileiras.

Não custa lembrar que a Turquia também permanecerá como ocupante de um assento. Por tudo isso, acabar com o prestígio da ONU justamente na hora em que o Brasil pretende comer o bolo seria a situação mais frustrante para a diplomacia do governo atual.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Metas do milênio da ONU: Brasil sai na frente

Mais uma vez, os países-membros das Nações Unidas estão reunidos em Nova Iorque. O encontro é motivado pela revisão das metas de desenvolvimento do milênio, estabelecidas em 2000. Como boa parte das boas intenções costuma se restringir a cerimônias lacrimosas e belos discursos, é muito pouco provável que as ambições de melhorar a vida da população mais pobre do planeta sejam alcançadas.

Os objetivos de dez anos atrás eram bastante louváveis: até 2015, a educação primária deveria ser universal, a diferença de gênero deixaria de ser fator de preconceito, a mortalidade infantil seria reduzida drasticamente e doenças como aids e malária sofreriam combate sério. Nada disso vai acontecer, como se pode imaginar. Em cinco anos, a África – continente mais atingido pelo descaso absoluto dos países desenvolvidos – estará ainda pior, como mostram as estatísticas; a população pobre deve subir de 35% para 40%. O crescimento econômico médio – que entre 2006 e 2008 chegou a 6% – já registrou declínio de quase quatro pontos no ano passado.

De fato, mesmo a ONU não está muito preocupada com isso. Pelo menos não da maneira altruísta que anuncia. Cada vez mais relegada a segundo plano em questões fundamentais à sua existência – como seu papel preponderante na resolução de conflitos internacionais e até mesmo em assuntos contemporâneos relevantes, como meio ambiente – a organização se agarra às metas do milênio num esforço para se reinventar ou ao menos continuar a justificar o orçamento anual com verniz de importância.

Na prática, o palanque onde líderes mundiais discursam se transformou numa espécie de palco de mutação de personalidades. É lá que Ahmadinejad clama por mais atenção aos pobres do planeta, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, defende a aplicação de um imposto sobre as transações financeiras para financiar a execução urgente das metas do milênio – as mesmas que os países europeus ignoraram durante os últimos dez anos.

Longe de qualquer patriotada, é válido dizer que o Brasil talvez seja um dos poucos que levaram a sério as propostas do ano 2000. Neste encontro da ONU, a ministra Márcia Lopes – da pasta do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – vai mostrar como os programas de transferência de renda conseguiram tirar 27,3 milhões de brasileiros da faixa da pobreza extrema. O número é o equivalente a duas vezes a população da Holanda.

Segundo a ONG ActionAid, que avalia o desempenho mundial no combate à pobreza, o Brasil conseguiu reduzir pela metade a fome no país. Isso já em 2006, nove anos antes do prazo estabelecido pela ONU.

Ainda de acordo com a instituição, o Brasil lidera pelo segundo ano consecutivo o ranking que mede o progresso de países em desenvolvimento na luta contra a pobreza. A partir disso tudo, o discurso da próxima quinta-feira do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, vai reivindicar mais uma vez que o país obtenha mais importância nas Nações Unidas – inclusive no Conselho de Segurança. São temas desconexos, mas que acabam por se complementar.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

OPEP celebra 50 anos: mundo em transformação pode dar fim ao cartel

O blog não poderia deixar essa importante data passar em branco. Mesmo não citando o fato no dia exato da efeméride, nunca é tarde para lembrar que no último dia 14, terça-feira, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) completou 50 anos de existência. Fundada inicialmente por Irã, Iraque, Kuwait, Arábia Saudita e Venezuela, o maior cartel do mundo conta hoje com 12 felizes membros.

Juntos, esses países estão sentados sobre 78% das reservas de óleo cru do planeta. O objetivo da organização continua o mesmo de meio século atrás: controlar o preço da mais importante matéria-prima do mundo e, com isso, influenciar as decisões políticas internacionais. Isso já foi feito em 1973, quando os Estados árabes do grupo impuseram um embargo de cinco meses na produção para impedir que o Ocidente apoiasse Israel durante a Guerra do Yom Kipur. Acho válido recordar este fato porque ele foi, até agora, a demonstração mais explícita das posições adotadas em conjunto.

No entanto, penso que uma atitude semelhante seria improvável nos dias de hoje. Simplesmente porque a situação geopolítica mudou e, por exemplo, a Arábia Saudita – maior exportador de óleo cru do planeta – se opõe aos projetos internacionais do Irã – que ocupa a segunda colocação no ranking das maiores reservas. De qualquer maneira, não se pode subestimar o poder da OPEP.

O que acho muito curioso é que sobram teorias conspiratórias sobre grupos secretos que manipulariam a mídia e as finanças (deixo claro que considero todas essas ideias simplistas demais e, geralmente, alardeadas por pessoas que exercitam muito pouco qualquer capacidade analítica). No entanto, nunca ouvi oposições à organização que declaradamente foi criada para controlar o petróleo. Acredito que, por defender abertamente tal intenção, a OPEP simplesmente não é fascinante o bastante para quem adora enxergar planos secretos em toda a parte.

T. Boone Pickens, fundador e presidente do fundo de investimento do capital da BP – para não deixar dúvidas, BP se refere a Boone Pickens, não British Petroleum – é um entusiasta da introdução da energia limpa nos Estados Unidos. É dele um artigo interessante que revela dados perturbadores: em 1957, três anos antes da fundação da OPEP, o preço do barril era de 3 dólares. Seguindo a proporção da inflação nos EUA, o valor hoje deveria ser de 23 dólares. No entanto, o cartel aniversariante estabeleceu a média de 80 dólares por barril.

Em artigo publicado no Wall Street Journal, James Woosley, ex-diretor da CIA, faz um cálculo ainda mais alarmante para mostrar como os 12 países do grupo são beneficiados pela especulação petrolífera que eles mesmos coordenam:

"Se o preço do barril de petróleo atingir novamente o valor de 125 dólares – como já aconteceu em 2008 –, então cerca de metade da riqueza do planeta seria controlada pelos membros da OPEP", diz.

Por conta de tudo isso e também das preocupações ambientais, a tendência é buscar novas fontes de energia. A opção preferida pelos EUA – o maior mercado do mundo – é o etanol. E adivinhem só quem é o maior produtor mundial? Se pensou Brasil, acertou.

Quando os americanos passarem a adaptar seus veículos para que eles se tornem flex – e o custo de tal operação é de apenas 70 dólares –, o Brasil terá de estar preparado para aproveitar esta enorme oportunidade. Tal evento promete bombear ainda mais polêmica às atuais disputas entre brasileiros e americanos na Organização Mundial de Comércio (OMC), mas também obrigará o futuro ocupante do Palácio do Planalto a rever suas opções de alianças internacionais. Afinal de contas, uma chance como esta pode mudar também o futuro do Brasil e não deve ser desperdiçada.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O Senhor das Armas mostra o estoque à Arábia Saudita

Para balançar de vez o coreto no Oriente Médio, os EUA esperam anunciar em breve uma venda de equipamentos militares bilionária para a Arábia Saudita. Estima-se algo em torno de 60 bilhões de dólares a 90 bilhões de dólares. Seja qual for a quantia, já se trata da maior negociação de todos os tempos. Durante a próxima década, os sauditas devem comprar 84 aviões de ataque F-15 (foto), 70 helicópteros Apache, 72 helicópteros Black Hawk, além de novas modelagens e atualizações para os 72 caças F-15 que já compõem sua frota aérea.

Antes de fechar o acordo, porém, o governo americano deve enviar uma formalização ao Congresso – que, por sua vez, terá 30 dias para aprovar os termos. Não acredito que os congressistas deverão bloquear a transação. Primeiro porque as relações estreitas entre sauditas e a Casa Branca são antigas; outro ponto importante, que comento com certa insistência por aqui, é levar em conta o papel central que o país árabe ocupa no eixo sunita, apoiado pelos EUA, no combate aos Estados xiitas comandados pelo Irã. Além de se tratar do maior país sunita, a Arábia Saudita é também o mais rico.

Outro aspecto importante é a política interna americana. Há bem pouco tempo, a Casa Branca revelou dados que apontam queda nas vendas de armamento. Em 2008, foram 38,1 bilhões de dólares; no ano seguinte, 22,6 bilhões. De uma vez só, os sauditas estão dispostos a encher os cofres públicos e privados nos EUA com pelo menos o dobro deste valor.

A revista Time revela informações interessantes sobre isso: de acordo com a Boeing, empresa responsável pela fabricação de aviões e helicópteros escolhidos pelo governo de Riad, a transação deve gerar 75 mil novos empregos em 44 diferentes Estados americanos. Vale registrar que o desemprego é citado como a principal preocupação dos eleitores. E, para completar, não custa dizer que as eleições legislativas acontecem daqui a dois meses nos EUA – o pleito é considerado um teste-chave para o governo Obama e poderá servir de termômetro para a corrida presidencial de 2012.

Curiosamente, o valor proposto por Riad é tão grande que faz parecer troco os 3 bilhões de dólares fornecidos por Washington a Israel. Aliás, usando um termo financeiro, a grana pode até amortizar o repasse em equipamentos militares destinado aos israelenses. Diante de tanto dinheiro, talvez os sauditas estejam até contribuindo para calar momentaneamente os críticos desta ajuda militar. E isso é bastante irônico.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Microsoft corre para apagar incêndio causado pelo governo russo

Não são raros os casos envolvendo a troca de favores entre empresas privadas e autoridades governamentais. Quando se trata de acesso a grandes mercados controlados por governos autoritários, a parceria costuma ser bastante frutífera. Não custa lembrar como a top of mind dos mecanismos de buscas acabou cedendo para poder se estabelecer na China. Adiantou muito pouco; a empresa ainda é lembrada pelo caso e hoje ocupa apenas o terceiro posto na preferência dos chineses.

O fato agora é um pouco diferente, mas não deixa de evidenciar algumas semelhanças. O governo da Rússia abusou do direito de capturar computadores de advogados, jornalistas descontentes com o regime de Putin-Medvedev e organizações não governamentais com posições contrárias ao Kremlin. A desculpa é ótima, do ponto de vista do senso de humor: todas as máquinas foram apreendidas por não possuírem as licenças oficiais dos produtos da Microsoft.

Pressionada e já deveras escolada pelos prejuízos de imagem sofridos pela concorrente, a empresa de Bill Gates decidiu tomar a iniciativa. Brad Smith, vice-presidente e conselheiro-geral, avisou que a Microsoft não concorda com as ações empreendidas por Moscou na medida em que elas apresentam um viés claramente político. Ou seja, jogou no ventilador as motivações antidemocráticas em jogo e, assim, conseguiu, ao menos por ora, evitar maiores estragos. Para completar, anunciou que os grupos independentes que têm sofrido as perseguições passarão a contar com licenças gratuitas, cortando pela raiz o principal argumento que levou à apreensão dos computadores.

O episódio se encerra de maneira distinta ao anterior: enquanto o líder das buscas baixou a cabeça e se tornou peça na engrenagem do jogo político internacional da China, a Microsoft optou por não aceitar se submeter às diretrizes deste governo russo cujo respeito aos direitos individuais e oposição são bastante questionáveis.

Num novo mundo onde empresas privadas são muitas vezes mais ricas e importantes que governos, cabe a elas também eleger seus princípios de política externa. Por falar nisso, as relações entre atores públicos e privados ainda não estão totalmente acomodadas. Ou seja, há episódios recentes que mostram a ausência de esclarecimento definitivo quanto aos papéis a serem exercidos. Vale lembrar os exemplos da Blackwater no Iraque e da BP no desastre ambiental no Golfo do México. O imbróglio entre Google e China ganhou um capítulo ainda mais interessante nesta semana.

A organização sem fins lucrativos Electronic Privacy Information Center entrou com uma ação apoiada na lei de liberdade de informação americana exigindo a liberação dos documentos relacionados a eventuais acordos entre o Google e a National Security Agency (Agência de Segurança Nacional). Tudo teria começado em janeiro, quando a empresa anunciou ter sofrido ataques cibernéticos chineses. No mês seguinte, veículos de imprensa passaram a relatar os contatos com a NSA, agência de espionagem responsável por defender as instituições militares americanas de invasões virtuais. Mas, como o Google é uma empresa privada, ficou estranho para todos os envolvidos.

Se desde o começo os executivos da companhia não tivessem cedido às exigências de censura do governo chinês, muito possivelmente uma boa parte de todo este constrangimento poderia ter sido evitada. Como a percepção vale mais do que a intenção, ponto para a Microsoft, que agiu de forma mais coerente com os princípios que diz defender.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Resultado de referendo na Turquia acrescenta ainda mais elementos à complexidade geopolítica

O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, foi vaiado por parte da torcida presente ao ginásio em Istambul, no domingo à noite. Em quadra, os 12 Gigantes - como são chamados os jogadores de basquete da seleção da Turquia - foram derrotados pelos EUA na final do campeonato mundial masculino. Mas o líder político do país dormiu bem. E pôde acordar muito feliz. Quase 58% dos eleitores apoiaram seu projeto de reforma constitucional. Restou a Barack Obama, vitorioso na quadra, mas receoso quanto aos planos do partido AKP (Justiça e Desenvolvimento), enaltecer a vibrante democracia do país – que, de forma impressionante, levou 77% dos turcos às urnas.

O referendo é polêmico por alguns motivos: o principal deles é a mudança que tira dos juízes a indicação de novos nomes para o sistema Judiciário. Agora, a partir da vitória do "sim", o presidente e o parlamento passam a participar deste processo. A controvérsia seria pouco relevante se o Judiciário e os militares do país não estivessem numa posição contrária ao governo.

Há acusações de todas as partes: as forças armadas e os principais juízes apontam Erdogan e seu partido como arquitetos de um plano maior de introduzir o islamismo nas decisões políticas – algo que mudaria por completo a natureza laica do Estado turco moderno fundado por Mustafa Kemal Ataturk, em 1923. Do ponto de vista do atual primeiro-ministro, sobra desconfiança. A cúpula de seu governo acusa juízes e militares de planejar mais um golpe contra um líder democraticamente eleito – foram quatro nos últimos 50 anos.

Este ponto, por sinal, era uma das principais preocupações da Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia que avalia a candidatura turca ao bloco. Agora, com o referendo aprovado, um dos maiores impedimentos à adesão de Ancara cai por terra. Como a constituição em vigor for forjada sob lei marcial, há 30 anos, a carta previa que oficiais das forças armadas usufruíssem de imunidade jurídica. Com a vitória do "sim", tal benefício passa a ser revogado, e as instituições civis exercerão um controle maior sobre os militares – pré-requisito considerado importantíssimo pelos demais países-membros da UE.

A aprovação das 26 mudanças constitucionais pode ser interpretada como uma vitória pessoal de Erdogan e do AKP. E possivelmente abre ainda mais o caminho rumo ao terceiro mandato do primeiro-ministro (as eleições parlamentares serão realizadas no ano que vem). Os EUA e seus aliados não concordam com as recentes decisões externas do atual governo de Ancara, que vem se aproximando de Irã e Síria e se distanciando de Israel, dos americanos e dos Estados sunitas moderados do Oriente Médio.


O curioso disso tudo é notar que as reformas propostas por Erdogan acabam por lhe abrir as portas da UE. Até porque, há muitas outras mudanças incluídas neste pacote, como maior respeito aos direitos individuais, promoção de igualdade entre os gêneros, direitos infantis, de idosos e deficientes, além do fortalecimento dos sindicatos. Se de fato a Turquia aderir à UE, será interessante analisar a movimentação de um grande país islâmico, cada vez mais aliado ao eixo xiita, interagindo politicamente com os demais Estados europeus, laicos e próximos aos EUA.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Fidel Castro busca relevância internacional

As recentes declarações de Fidel Castro repercutiram em todo mundo. E não era para menos mesmo. Doente desde 2006, ele decidiu fazer não apenas uma aparição, mas uma verdadeira catarse pública. Muito mais do que simplesmente rever posições, Fidel parece querer mudar a opinião de seus críticos, esclarecer o que pensa, expor convicções pessoais que superam o mito construído em torno de si.

Acho que não apenas o conteúdo da entrevista concedida é interessante. O episódio envolvendo o convite ao jornalista Jeffrey Goldberg, da revista americana Atlantic, também serve para mostrar a relação entre imprensa e política. Para quem não se lembra, Goldberg é o autor da reportagem sobre um possível ataque israelense ao Irã. Escrevi um post sobre o assunto, em 18 de agosto. Para quem quiser relembrar o caso, clique aqui.

Fidel leu a matéria que causou enorme polêmica nos Estados Unidos. Como se interessa pelo Oriente Médio, mandou convidar – através de Jorge Bolaños, encarregado da missão cubana em Washington – o repórter para uma exclusivíssima viagem a Cuba.

“Tenho uma mensagem de Fidel para você. Ele leu seu artigo sobre o Irã e Israel. Ele lhe convida para estar em Havana no domingo de forma a discutirem sua matéria”, disse.
Um ponto importante neste imbróglio é notar a simbiose entre política e imprensa. As declarações de Fidel sobre o Oriente Médio, antissemitismo e o futuro de Cuba podem influenciar decisões políticas relevantes. Mas, se eventualmente ocorrerem, só existirão por conta do artigo de Golberg publicado em meados de agosto passado. Aliás, já considero as matérias do jornalista como as mais importantes do ano.

Nesta nova série de reportagens, Fidel faz autocríticas em relação ao posicionamento de Cuba durante a Crise dos Mísseis, de 1962, seu pedido para os soviéticos bombardearem os EUA e mesmo sobre o futuro do regime na ilha. Também critica a constante negação do Holocausto pelo presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad.

Este último aspecto, no entanto, não leva a crer que Cuba passará a apoiar Israel, por exemplo. Pelo contrário. Acredito que Fidel pretende deixar claro que pode ser um ator legítimo no Oriente Médio uma vez que não é movido por um ódio insano contra os judeus. Da mesma maneira, ao criticar os propósitos nucleares de todos os envolvidos, tenta se colocar numa posição de imparcialidade e equilíbrio.

“O governo iraniano deve entender que os judeus foram expulsos de sua pátria, perseguidos e maltratados em todo o mundo como aqueles que mataram Deus. Em minha opinião, isso é o que aconteceu a eles: seleção reversa. O que é isso? Por mais de dois mil anos, foram submetidos a terríveis perseguições e pogroms (violência e execuções de incêndios criminosos contra as vilas judaicas que existiam na Europa central e oriental entre o final do século 19 e o início do 20). Muita gente poderia crer que isso os levaria ao desaparecimento; penso que sua cultura e religião os manteve unidos como uma nação”, disse.

Este tipo de leitura racional da história pretende mudar a imagem de Fidel. Não por acaso, discorre sobre um tema muito caro ao governo dos EUA capaz de repercutir em todo o mundo. O conflito do Oriente Médio permanece como o palco de ação mais disputado pelas lideranças mundiais que buscam relevância internacional. Não é diferente com o ex-presidente cubano, como explica Julia Zweig, especialista em América Latina que viajou junto com Goldberg a Havana.

“Assuntos de guerra, paz e segurança internacional são seu foco central. Proliferação nuclear, mudanças climáticas são as questões mais importantes para ele, que está apenas começando a usar plataformas potenciais de mídia para comunicar sua visão. Ele tem um tempo disponível agora que não esperava ter. Por isso, está revisando a grande história e sua própria história”, diz.
Vale a pena ler as reportagens e conhecer este perfil inusitado de um dos últimos mitos políticos vivos do século 20. Leia aqui.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Terremoto político se aproxima do Egito

O ex-presidente da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e Prêmio Nobel da Paz Mohamed ElBaradei (foto)retornou ao Egito em fevereiro deste ano. Desde então, tem mobilizado a incipiente oposição ao governo de Hosni Mubarak - que controla o país há 29 anos. Agora, ElBaradei fez sua aposta política mais alta ao convocar o boicote geral às eleições parlamentares de novembro próximo. Amplamente identificado com uma parcela significativa da juventude egípcia, o comunicado foi publicado em sua página do Twitter:

"O boicote total das eleições e a assinatura da petição são os primeiros passos para desmascarar a falsa democracia. A participação (no pleito) seria contrária ao interesse nacional", escreveu.
A petição ao que o post se refere exige mudanças na constituição do Egito, como a restrição legal a candidatos presidenciais independentes. ElBaradei pretende disputar as eleições presidenciais no ano que vem justamente como candidato independente.
Toda esta agitação política afeta o jogo geopolítico regional. Como se sabe, Mubarak é um dos principais aliados dos Estados Unidos no Oriente Médio - aliás, ao lado da parceria declarada com a Arábia Saudita, o apoio de Washington ao presidente Mubarak, acusado de fraudar sucessivas disputas eleitorais para permanecer no cargo, é um dos mais flagrantes "telhados de vidro" no discurso dos EUA de exportação da democracia.
O governo do Cairo também é uma importante peça do confronto entre sunitas - apoiados pelos EUA - e xiitas - comandados pelo Irã - que se avizinha. Bem ou mal, Mubarak segue o jogo da Casa Branca e é recompensado por isso com dinheiro e prestígio. Nunca é demais lembrar que foi na capital do país que o presidente Obama fez um dos mais importantes discursos conciliatórios com o mundo islâmico, em junho de 2009. Para completar, o governo egípico mantém um acordo de paz com Israel, além de coibir as ações de grupos radicais em seu território.
Por sinal, este é um aspecto importante. A Irmandade Muçulmana representa, no Egito, a mais ferrenha oposição ao governo Mubarak. Este mesmo grupo é a base de formação do Hamas, nos territórios palestinos. E é com a Fraternidade Muçulmana que ElBaradei não descarta se aliar para derrubar Mubarak. Ninguém sabe ainda se a relação entre eles é meramente pragmática para conseguir assumir o governo.

Mas, sem a menor dúvida, isso já causa um problema para a estratégia regional americana. Afinal, é bem provável que ElBaradei não concorde em seguir as diretrizes da Casa Branca num eventual governo seu. Aliás, qual seria o papel da Irmandade Muçulmana neste caso?

O que se sabe é que os EUA estarão numa tremenda sinuca: se ElBaradei de fato se transformar numa liderança política legítima no Egito, Washington não poderá ignorar as novas regras do jogo. O eixo sunita formado por Egito, Arábia Saudita, Jordânia e os Estados menores do Golfo Pérsico terá de ser revisto. Com a Irmandade Muçulmana na posição de situação, não é impossível imaginar que o Egito decida não facilitar movimentações militares ou ceder bases ou espaço aéreo num eventual ataque contras as instalações nucleares iranianas.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Avanços no processo de paz provocam movimentações geopolíticas no Oriente Médio

As negociações de paz avançaram. Não se pode duvidar disso. O acordo quanto à regularidade das conversas – que passarão a ocorrer a cada 15 dias – é digno de nota. Principalmente quando as partes envolvidas chegam a tal conclusão após 20 meses de distância e silêncio absoluto.

No entanto, não é muito difícil entender o outro lado da decisão comum de Abbas e Netanyahu. O primeiro-ministro israelense consegue, assim, sobreviver politicamente sem causar o desmoronamento de sua coalizão. Ao não se comprometer com qualquer medida mais prática, não provoca a ira dos colonos e dos partidos Shas e Israel Beiteinu. Ao mesmo tempo, não fornece a seus críticos material para que eles possam reafirmar o rótulo de intransigente.

O presidente palestino, Mahmoud Abbas, passa por problema semelhante; com o fantasma do Hamas a lhe importunar, sabe que não pode tomar decisões importantes que agravem ainda mais a posição do grupo radical – que supera militarmente, inclusive, a Autoridade Palestina. Ao concordar com novas negociações, recebe o apoio ao menos de EUA e da comunidade internacional. É mais uma maneira de reafirmar sua posição de líder nacional palestino.

Por causa disso, as negociações atuais me parecem mais interessantes. Talvez a fragilidade política dos envolvidos tenha lhes permitido analisar a situação por um viés mais pragmático. Na prática, Netanyahu e Abbas estão do mesmo lado. Ambos lutam pela manutenção de sua legitimidade. Netanyahu em busca de espaço de atuação apesar dos colonos e do caráter bastante ideológico de sua coalizão; Abbas e o Fatah lutam contra a influência do Hamas na Cisjordânia e almejam, eventualmente, a retomada de Gaza. Autoridades israelenses e palestinas também pretendem evitar a ascensão de Irã e Hezbollah como atores legítimos do Oriente Médio.

Aliás, este parece ser um ponto nevrálgico do momento. Enquanto as conversas acontecem em Washington, o Irã quer se fazer escutar. O presidente Ahmadinejad declarou hoje, mais uma vez, que os "sionistas são racistas hipócritas que tem operado sob o pretexto de seguir os preceitos do judaísmo". O ministro das Relações Exteriores iraniano, Manouchehr Mottaki, acusou de traição os líderes árabes que apoiam as negociações de paz. Vale lembrar que as palavras duras usadas por Teerã fazem parte do grande conflito em jogo entre os Estados sunitas e xiitas. Não por acaso, estão na capital americana o presidente egípicio, Hosni Mubarak, e o rei da Jordânia, Abdullah II – ambos assinaram acordos de paz com Israel.

O Irã tentará polarizar ainda mais as posições. Quanto mais radicalismo - no discurso e nas ações -, mais os iranianos acreditam que serão beneficiados. Afinal, quando a república islâmica se coloca na posição de antítese dos diálogos e dos supostos prejuízos que eles acarretariam aos palestinos, encontra, ao menos, um lugar para ocupar no jogo de poder regional. E, assim julgam as autoridades de Teerã, é preferível estar nesta situação a simplesmente ter de aceitar que o país se mantenha totalmente alheio às decisões tomadas pelos principais atores regionais.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Negociações de paz em Washington: vaidade dos líderes pode salvar o processo

A nova rodada de negociações entre israelenses e palestinos começou já em clima tenso. Se não bastasse a franca oposição do barulhento grupo de colonos judeus, será preciso reafirmar as intenções pacíficas em meio a mais uma possível onda de atentados cometidos pelo Hamas. O assassinato de quatro israelenses na Cisjordânia pelos radicais que comandam Gaza coloca em risco as negociações. Não deixa de ser curioso, mas também didático, perceber como os radicalismos conseguem evidenciar os objetivos que partilham.

Talvez a única semelhança entre Hamas e Yesha – a maior organização de assentados judeus na Cisjordânia – seja a vontade irresoluta de minar as tentativas de diálogo. Ambos precisam manter o atual estado de impasse para continuar a existir. Se israelenses e palestinos atingirem um acordo em Washington, ao menos a Cisjordânia dirigida pela Autoridade Palestina – formada em boa parte pelo Fatah, rival do Hamas – poderia conseguir ganhos práticos. Com os palestinos do território conseguindo desenvolvimento e um nível de vida aceitável a partir da convivência pacífica com Israel, os palestinos de Gaza poderiam reivindicar o mesmo. Seria o início do fim para o Hamas.

Também num acordo imaginário os colonos judeus teriam muito a perder. Seriam realocados para o interior das fronteiras definitivas de Israel – assim como aconteceu com os cerca de nove mil judeus retirados à força por Israel de Gaza, em 2005.

Mas talvez as semelhanças possam trazer algo de positivo. Por exemplo, Obama, Netanyahu e Abbas vivem momentos relativamente parecidos. Obama precisa de aprovação interna. Netanyhau e Abbas precisam lutar contra radicais que buscam minar seus governos. Um acordo favorável aos palestinos alcançado nos EUA poderia desestabilizar o Hamas e vislumbrar a retomada de Gaza pela Autoridade Palestina.

Do ponto de vista israelense, qualquer acordo derrubará Netanyahu, uma vez que a coalizão que sustenta seu governo é formada por partidos como Shas, Israel Beiteinu e Likud. Ao menos Shas e Israel Beiteinu se opõem ao fim das colônias na Cisjordânia como princípio.

Porém, se Bibi conseguir apresentar uma solução justa e definitiva para o conflito com os palestinos, poderia concorrer e vencer num eventual novo pleito. Com o amplo apoio da população israelense, uma nova coalizão de partidos levaria Netanyahu ao cargo. Por que não? Quem imaginaria, por exemplo, que o trabalhista Ehud Barak seria ministro da Defesa num governo do Likud?

Além disso, o próprio Netanyhu gostaria pessoalmente de incluir seu nome na história de Israel com um acordo. Seria o ponto mais alto de sua biografia e ele também se tornaria o mais importante membro de um dos mais tradicionais clãs políticos do país.

O presidente palestino, Mahmoud Abbas, superaria ou ao menos se igualaria a Arafat. Ao mesmo tempo, quebraria não apenas o Hamas, mas também as influências de Hezbollah e Irã na vida e nas decisões políticas palestinas. Sem falar em Obama, que poderia usar o trunfo nas eleições legislativas de novembro, ganhar a reeleição em 2012 e, ainda por cima, roubar o imaginário construído em torno de seu desafeto político Bill Clinton. Talvez, a vaidade dos três líderes envolvidos nesta rodada de negociações possa representar a grande vantagem deste momento que se pretende histórico.