O Brasil agora é alvo da Organização dos Estados Americanos (OEA). Para quem ainda não sabe, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ligada à entidade, solicitou formalmente a suspensão do projeto de construção da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. O governo brasileiro pode descumprir a requisição, mas, se isso acontecer – e não há nada que aponte qualquer recuo no empreendimento –, possivelmente a situação será levada para a Corte Interamericana da OEA. Neste caso, alguns especialistas em direito internacional concluem que a decisão seria vinculante.
Antes de qualquer preocupação maior, vale um comentário para aliviar os mais assustados: mesmo que descumpra a ordem, nenhuma força estrangeira invadirá o Brasil exigindo a demolição de Belo Monte. O máximo que pode acontecer é o Brasil ser expulso da OEA. E esta seria uma decisão tão extrema que, na prática, levaria muito tempo até ser tomada.
O comunicado da entidade multilateral é uma vitória de organizações indígenas contrárias à construção de Belo Monte. Elas argumentam que a usina prejudicará o meio-ambiente e causará o deslocamento de 40 mil nativos. O governo brasileiro contesta os números.
Por mais que as reivindicações indígenas sejam justas, genuínas e legítimas, a discussão sobre o projeto está inserida numa disputa geopolítica. Inocências a parte, só não enxerga quem não quer. É bom que se diga que seria natural que tal tipo de artifício fosse usado mesmo. Como costumo escrever quando trato do salto de qualidade brasileiro (muitas vezes refletido nas intenções internacionais do país), nem o Itamaraty, nem o Palácio do Planalto podem imaginar que o Brasil manterá parâmetros anteriores a partir do momento em que deixa claro ter pretensões mais ambiciosas. É ingenuidade acreditar que a diretriz política que sempre prezou pela unanimidade internacional pode ser levado adiante a partir de um cenário absolutamente distinto.
Se o Brasil não pode ser considerado uma potência mundial (muito embora os fatos levem a crer que isso deve mudar em pouco tempo), não se pode dizer o mesmo quando o foco é a América Latina. A liderança brasileira no continente é incontestável – e falo isso de maneira pragmática, sem qualquer resquício que poderia ser interpretado como patriotada.
Este é apenas o início da batalha sobre a construção de Belo Monte. E devo desculpas aos admiradores de teorias conspiratórias; a questão não se relaciona de nenhuma maneira a eventuais projetos estrangeiros de controle sobre a Amazônia. Tem mais a ver com a disputa de poder diante deste novo cenário político e econômico. Afinal, o projeto da hidrelétrica atende a importantes demandas da economia brasileira. Quando concluída, Belo Monte será a terceira maior hidrelétrica do mundo (atrás da chinesa Três Gargantas e de Itaipu, compartilhada por Brasil e Paraguai.
Como o Brasil cresce acima da média mundial, a necessidade de eletricidade aumenta bastante. Não apenas por conta deste novo mundo em que vivemos, mas também porque o país está num processo de inclusão populacional socioeconômica. A indústria celebra a classe C como realidade do ponto de vista do consumo, mas é importante lembrar que novos consumidores representam também novos focos de demanda energética. Hoje, cerca de 80% da eletricidade brasileira é fornecida por fontes que usam a água para produção. Mas é preciso produzir mais. E, como lembra a revista Forbes, os rios amazônicos permanecem inexplorados. E eles concentram 70% do potencial hidrelétrico do Brasil.
Na prática, a situação é até bastante óbvia. Impedir a construção de Belo Monte é uma maneira politicamente correta de frear o crescimento econômico e político brasileiro. Simples assim.
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