Costumo comparar o Oriente Médio a um conjunto de placas tectônicas em constante atividade. Há períodos de dormência e tranquilidade – como acontecia até bem pouco tempo no caso do conflito entre israelenses e palestinos – , há períodos de graves movimentações. As manifestações populares marcaram o início desta efervescência ainda em curso. Alguns dos países estão passando por um momento distinto: como depois de grandes terremotos, é preciso recomeçar a vida.
Esta é a situação do Egito. Após a queda de Mubarak, a tensão agora tem muitos outros motivos: reorganizar o país, buscar novas estruturas políticas, acalmar a população ansiosa por mudanças de verdade. No meio disso tudo, a política externa exerce função fundamental. E há sempre atores dispostos a apoiar mudanças geopolíticas regionais. Adivinhe quem?
Antes, uma lembrança do posicionamento egípcio durante as décadas de mandato do presidente deposto: o país era aliado dos EUA, mantinha um frio acordo de paz com Israel e se opunha ao Hamas em Gaza – isso porque o movimento era a representação palestina da Irmandade Muçulmana egípcia, grupo que, até as manifestações populares, era a voz da oposição interna a Mubarak. Num cenário um pouco mais amplo, o Egito era um importante pilar da aliança sunita que mantinha os governos de Jordânia e Arábia Saudita próximos aos americanos.
De volta à pergunta do segundo parágrafo, acertou quem respondeu Irã. Para a República Islâmica, quase toda mudança é encarada como oportunidade de diminuir o poder sunita e reforçar a percepção hegemônica regional iraniana. Por conta disso, partiu da própria imprensa estatal do país a notícia de que Egito e Irã estariam prontos para retomar relações diplomáticas após 30 anos de rompimento – para lembrar, o Irã deixou de se relacionar com o Egito a partir do momento em que o governo do Cairo reconheceu Israel diplomaticamente.
Algumas interpretações sobre o gesto político egípcio entendem que ele funcionaria como alerta principalmente aos EUA. Os egípcios estariam em busca de novos e poderosos mecanismos de influência para serem apresentados diante de americanos e israelenses. Isso pode incluir, por exemplo, papel mais ativo no processo de paz ou até a revisão da já significativa ajuda econômica fornecida anualmente por Washington. Não acho que esta leitura esteja equivocada. No entanto, acho que a interpretação pode ir mais além.
A origem do bem sucedido movimento popular egípcio era a insatisfação com o presidente Hosni Mubarak. Portanto, nada melhor do que alterar a percepção popular sobre a política externa. Isso não apenas serve para atender aos objetivos estratégicos de renegociação, mas também apresentam algo de novo à população. Flertar com o Irã é o tipo de ação óbvia capaz de ser compreendida facilmente pela massa egípcia. E, de quebra, satisfaz sem exigir grandes mudanças domésticas, como reformas políticas, eleitorais, de imprensa e emprego. É mudar sem mudar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário