Aparentemente, há indícios de que o impasse na Líbia se encaminha para algum tipo de solução. Se isto pode ser interpretado como um bom sinal, há tantos outros que mostram como a sangrenta tentativa de derrubada de Khadafi se transformou num caldeirão de múltiplas ambições políticas. Ao contrário de Iraque e Afeganistão, por exemplo, a Líbia é hoje componente tardio da disputa geopolítica. Ou melhor, tardio e inesperado.
Não há nenhuma peça natural nos conflitos regionais do Oriente Médio. Quero dizer com isso que, por mais histórica que seja a disputa entre Estados árabes e Israel, por exemplo, ela não representa de nenhuma maneira uma espécie de fato concretizado. É um importante ponto de atrito ainda sem solução, mas que pode ser resolvido a qualquer momento. Não é porque existe há mais tempo que deve ser encarado como algo dado. Na Líbia acontece da mesma maneira; uma diferença notável, no entanto, é que os eventos regionais recentes se sucederam tão rapidamente que mesmo os atores mais relevantes não estavam preparados para ele.
A situação ainda está distante de poder ser interpretada como estável. Mas Estados nacionais e distintos grupos políticos de Oriente Médio, Américas (que tem, por ora, nos EUA seu único representante (?) relevante), Europa e África já tiveram tempo de traçar estratégias para lidar com a realidade que transformou a Líbia em mais um palco de representação e exercício de seus interesses. E todos esses entes – posso nomeá-los assim – querem ter alguma participação na resolução deste conflito.
A Líbia é, neste momento, um espaço de experimentação. Infelizmente, perdoem-me os mais sensíveis, é assim que as potências e líderes regionais enxergam esta realidade. Como se sabe, não são poucos os interessados em atuar no país. As potências estabelecidas, as que querem mais espaço, as que pretendem se consolidar de fato e no imaginário internacional. E, para completar, há linhas de atuação e teóricas completamente distintas entre todos eles. Basicamente, é isso que, em boa parte, torna a solução do conflito tão difícil.
A Turquia quer se estabelecer regionalmente como uma espécie de representante legítima dos interesses políticos islâmicos. E, para isso, conta com seu privilegiado posicionamento geopolítico. Uma de suas maiores credenciais é ser membro da Otan, por exemplo. Isso não é pouco. Inclusive, Ancara recebeu a visita do novo ministro das Relações Exteriores de Khadafi e o país deve ser um dos articuladores da solução negociada para a crise. Alguém imaginaria há 15 anos que qualquer assunto regional hoje não poderia ser discutido ou decidido sem a chancela turca? Pois é, não há nada que dure para sempre em política internacional. O assunto é bem dinâmico mesmo.
Para finalizar as exemplificações, acho que vale mostrar também o momento americano. Todo mundo lembra como no início das manifestações em Tunísia e Egito a Casa Branca preferiu esperar. No caso líbio, Obama foi o principal articulador da aliança internacional que agiu em nome da defesa dos civis inocentes que se transformaram em alvo (e permanecem assim) e também dos interesses dos EUA (palavras do próprio presidente).
E ninguém poderia prever que hoje testemunhássemos uma situação bastante curiosa: no único conflito recente em que Washington agiu com o apoio de parte razoável da população dos países islâmicos e de líderes árabes (a Liga Árabe não consentiu com a intervenção, mas foi favorável à zona de exclusão aérea sobre o território líbio) a força militar de organismos ocidentais (Otan) não daria conta de encerrar o impasse.
E ninguém poderia prever que hoje testemunhássemos uma situação bastante curiosa: no único conflito recente em que Washington agiu com o apoio de parte razoável da população dos países islâmicos e de líderes árabes (a Liga Árabe não consentiu com a intervenção, mas foi favorável à zona de exclusão aérea sobre o território líbio) a força militar de organismos ocidentais (Otan) não daria conta de encerrar o impasse.
É bem possível que haja um clima de frustração em Washington. No fundo, a diplomacia americana quis transformar a situação na Líbia num primeiro passo real de uma eventual reaproximação prática entre os EUA e o mundo islâmico. Mas com a Otan errando a mira e alvejando comboios de rebeldes, é pouco provável que isso aconteça; mais ainda, à medida que o tempo passa e Khadafi permanece no poder, a percepção de que Washington surfou ao lado dos árabes em busca de justiça, liberdade e democracia fica mais distante.
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