Ontem escrevi sobre as circunstâncias altamente explosivas que cercam o julgamento do traficante Walid Makled Garcia. O relatório do IISS que acusa suposto relacionamento entre Venezuela, Equador e Farc é mais um elemento de pressão sobre Caracas. Por mais que a publicação das informações tivesse potencial para perturbar a aproximação entre os governos colombiano e venezuelano, autoridades dos dois países negam o clima de tensão. Não se trata somente de massagear egos presidenciais, mas de aplicar o velho realismo discutido por aqui. Basta dizer que o comércio bilateral caiu de 7 bilhões de dólares, em 2008, para somente 2 bilhões de dólares em 2010. E isso não é bom para ninguém. Nem mesmo para a revolução bolivariana conduzida por Hugo Chávez.
E agora vale examinar a posição americana. Por mais que há pouco o presidente Barack Obama tenha feito um giro seletivo pela América Latina, seu primeiro mandato vai terminar com a certeza de que, sob seu comando, os EUA ignoraram completamente a região. A única fonte de preocupação parece ser mesmo as aspirações político-ideológicas venezuelanas e a manutenção do relacionamento especial com a Colômbia. Até aí, nada diferente de Bush. Há promessas de aproximação e intercâmbio, como o próprio Obama deixou claro no discurso realizado no Rio de Janeiro.
E Washington não tem se feito de rogada na replicação das opções políticas para a América Latina. O Caso de Walid Makled Garcia é circunstancial. Como escrevi ontem, o traficante diz ter informação importante sobre a cúpula governamental venezuelana. E elas interessam demais aos EUA. Para se ter ideia, suas acusações a autoridades passam pelo general-chefe do país, o chefe do comando operacional, o comandante da guarda nacional e o diretor do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin). A segurança na corte de Justiça onde Garcia foi ouvido até esta quarta-feira foi reforçada (foto). Mas ele preferiu se manter em silêncio.
Suas acusações são gravíssimas e explicam por que os EUA fizeram de tudo para levá-lo. Em entrevista ao canal de TV espanhol Univisión, não deixou por menos e atirou sua metralhadora para todos os lados; segundo ele, autoridades da Venezuela facilitam o tráfico de drogas, disse que o país está envolvido na produção de cocaína junto com as Farc e afirmou que a milícia xiita libanesa Hezbollah atua livremente em território venezuelano e envia dinheiro aos correligionários no Oriente Médio. Garcia representa hoje nada menos do que o sonho de consumo americano para deslegitimar o governo de Hugo Chávez.
O traficante não é bobo. Se ele tem como provar as acusações é outra história. Mas fez tudo isso de forma a chamar ainda mais a atenção dos americanos porque sabe que estar preso nos EUA – com todos os privilégios de ser a principal arma viva contra Chávez – é muito melhor do que amargar um julgamento conduzido por parte do corpo oficial que acusa. Isso explica também porque optou por se manter em silêncio. O governo venezuelano, por sua vez, acusa o traficante de conspiração, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e assassinato do jornalista Orel Sambrano e do veterinário Francisco Larrazábal. Esses são detalhes de uma trama internacional que a grande imprensa brasileira preferiu ignorar.
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