segunda-feira, 2 de maio de 2011

Obama derrota Osama: e agora?

A morte de Osama Bin Laden é um desses eventos-chave da humanidade. Se o líder terrorista que inspirou, financiou e reivindicou a autoria intelectual e participação prática nos maiores atentados realizados em solo americano conseguiu ser encontrado e assassinado por agentes da CIA, sua imagem e ideologia já fazem parte da história humana. Talvez, seja um dos exemplos do mundo que involuntariamente ajudou a construir: ocidentais e orientais conhecem seu rosto e, mais importante, a grande maioria dos habitantes do planeta foi atingida, mesmo que minimamente, por seu discurso radical. Bin Laden é um fenômeno de massa que, ironicamente, valeu-se de uma realidade que condenava para se reproduzir. Se não fosse a imprensa e os meios de comunicação, a al-Qaeda não teria conseguido repercutir suas diretrizes fundamentalistas.

Foto: a última residência de Bin Laden

Nesses primeiros momentos após a sua morte, há muita confusão e desencontro de informações: houve participação de agentes paquistaneses na operação de assassinato? O que será da al-Qaeda sem sua principal figura? Este é um tempo breve e raro; vivemos neste instante a curva, o suspiro antes do realinhamento.

A participação de agentes paquistaneses é um dado importante. Como escrevi muitas vezes por aqui, a Inter-Services Intelligence (ISI) – a agência de segurança do Paquistão – funciona como um Estado dentro do Estado. Acusada de realizar jogo duplo, é uma pedra no sapato dos EUA. Washington ajuda financeiramente o Paquistão, importante aliado regional americano nos esforços de guerra no Afeganistão, mas parte dos recursos tem sido desviada pelas ISI – em cujas fileiras há admiradores da própria al-Qaeda e do Talibã. Esta é uma das principais contradições herdadas por Barack Obama de George W. Bush.

No contexto de sua política externa, a principal preocupação de Obama, agora e sempre, é reabilitar o governo paquistanês. Por isso em seu comunicado oficial o presidente americano fez questão de deixar claro que as autoridades do país foram fundamentais durante o trabalho de localização do terrorista. A participação de agentes paquistaneses, no entanto, é negada por oficiais americanos. De qualquer maneira, há indícios de que Bin Laden estaria há seis anos na propriedade em que foi encontrado. A proximidade do local à capital paquistanesa, Islamabad, expõe, por si só, uma tremenda falha – no mínimo – ou certa complacência por parte das autoridades do país.

O assassinato do fundador da al-Qaeda vem em boa hora para Obama. Justamente no décimo ano dos atentados de 11 de Setembro e menos de um ano antes das eleições presidenciais dos EUA. Se já era difícil encontrar opositor ao atual presidente, agora tudo ficará ainda mais difícil para o partido Republicano. Alguns comentaristas também sugerem que o dia de hoje marca o fim da Guerra ao Terror. Pode ser que isso seja usado na próxima campanha, mas este é um assunto delicado.

Como escrevo, um dos principais erros da política externa americana tem sido não estabelecer objetivos claros. Isso ocorre neste momento na ofensiva à Líbia e também vale na luta contra o terrorismo. O que é vitória neste caso? Matar Bin Laden, matar todos os terroristas da al-Qaeda, acabar com atos de terror? Como se sabe, dentre todos eles, apenas matar Bin Laden é um objetivo razoável, digamos assim. O problema é que ele não resolve todos os problemas de segurança, certamente não elimina o conceito de Jihad global e não soluciona as questões geopolíticas americanas no Oriente Médio.

É preciso dizer também que, mesmo antes do assassinato de seu líder, a al-Qaeda já passava por um período de baixa. E não por competência de Obama ou qualquer agente do governo americano, mas graças à própria população árabe. As manifestações populares ainda em curso conseguiram resultados práticos jamais alcançados por Bin Laden. Em sua maior parte, os movimentos descentralizados rejeitam o uso de métodos de violência e não têm como principais vilões EUA, Israel ou os infiéis ocidentais, mas os próprios ditadores que se apropriaram do poder. No Egito e na Tunísia, por exemplo, os manifestantes conseguiram a derrocada dos líderes corruptos e em nenhum momento recorreram ao discurso fundamentalista como alternativa. Todos querem eleições limpas, rotatividade de poder, pluralidade de representação política e liberdade de imprensa. Como se sabe, Bin Laden sempre se opôs a tudo isso.

Há especulações sobre o futuro da al-Qaeda sem seu líder. Para ser franco, a organização é hoje mais uma inspiração a outros movimentos radicais do que a principal força terrorista em atividade. Sem e menor dúvida, no entanto, a morte de Bin Laden causará algum impacto em seus seguidores, uma vez que são conhecidos os conflitos internos entre seus herdeiros no movimento. Somente Bin Laden era capaz de uni-los – muito por conta de seu carisma pessoal. Se seu “martírio” enfraquecerá os membros da al-Qaeda e aprofundará as divisões entre eles ou se será encarado como injeção de ânimo e superação de rivalidades, só mesmo o tempo dirá.

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