sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Nova teoria sobre os atentados

Ainda permanecem as dúvidas sobre os autores dos atentados na Índia e suas reais motivações. As especulações aumentam na mesma medida em que o tempo passa e os corpos aparecem. E uma das teorias menos maniqueístas talvez seja a que, até o momento, possa explicar melhor os conceitos ideológicos por trás da ação terrorista que ainda continua.

Como uma das principais plataformas internacionais do presidente eleito Barack Obama é justamente promover a aproximação entre Índia e Paquistão, o objetivo dos ataques seria causar o maior retrocesso possível no processo de pacificação da região. Segundo análise de Jane Perlez, do The New York Times, evitando a escalada de violência com a Índia, o governo paquistanês poderia se dedicar mais à luta contra militantes que usam o país como base para treinamento terrorista.

O problema, entretanto, é que promover relações normais com o histórico rival está longe de ser unanimidade mesmo entre as autoridades do alto escalão de Islamabad. O Serviço de Inteligência do Paquistão (ISI) é uma das principais instituições oficiais cuja maioria de seus membros é contrária à aproximação com a Índia. A jornalista americana cogita a possibilidade de indiretamente os terroristas terem contado com o apoio da agência em suprimentos e treinamento.

Em 2001, Nova Déli já havia acusado a ISI de ter participação no ataque ao parlamento indiano em que 12 pessoas foram mortas. Segundo Bruce Riedel, um dos assessores de Obama para assuntos relacionados ao Sudeste Asiático, Osama bin Laden teria criado um forte movimento jihadista - com apoio da Inteligência Paquistanesa - para desafiar o controle indiano na Cashemira.

Essa teoria me parece a que melhor explica a situação, uma vez que une as duas correntes de pensamento aparentemente dissociadas até então: se os ataques haviam sido planejados pela al-Qaeda ou se grupos muçulmanos descontentes da Cashemira eram os responsáveis por essa barbárie.
Acho que também vale uma observação: os seis judeus que eram mantidos reféns foram mortos pelos terroristas. A ministra das Relações Exteriores de Israel, Tzipi Livni, disse estar certa de que os judeus estavam dentre os alvos preferenciais dos ação. O ministro da defesa israelense, Ehud Barak, ofereceu às autoridades indianas ajuda humanitária, de defesa e segurança. Nova Déli, entretanto, recusou a oferta, embora oficiais da Inteligência de Israel já estejam em Mumbai.

PS: em entrevista na noite desta quinta-feira à rede de notícias CNN, o médico e escritor indiano Deepak Chopra culpou a política externa americana pelos atentados. Não há nada mais absurdo, repugnante e estúpido do que essa postura. Matar civis inocentes propositalmente e como "argumento" para qualquer reivindicação política é simplesmente condenável e injustificável. O mundo não deve e não pode relativizar o direito à vida.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Ninguém consegue explicar os ataques na Índia

Existe no momento uma grande confusão sobre a maneira correta de interpretar os atentados na Índia. O grupo Deccan Mujahideen é desconhecido internacionalmente, os métodos usados pelos terroristas são diferentes e mais próximos de um ataque de guerrilha, e os alvos preferenciais parecem ter sido britânicos, americanos e judeus, muito embora a maioria dos mortos até o momento seja de outras nacionalidades, além de indianos atingidos durante a troca de tiros. 

Este já é o maior atentado terrorista desde o 11 de Setembro. Porém, essa variada gama de elementos ainda não é suficiente para estabelecer qualquer conclusão sobre os reais autores das ações coordenadas ou mesmo sua motivação ideológica.

Há uma enorme divergência entre os analistas internacionais. Se por um lado a preferência pelo seqüestro de ocidentais e a complexidade dos ataques podem ser interpretados como característicos da al-Qaeda, por outro ninguém descarta o envolvimento de jihadistas da região da Cashemira. Uma das pistas que podem reforçar essa possibilidade foi o telefonema dado por um dos seqüestradores que se encontram no centro cultural e religioso judaico Chabad.

"Peça ao governo para falar conosco, e nós libertaremos os reféns. Você sabe quantas pessoas foram mortas na Cashemira? Você sabe quantos foram mortos nesta semana?" , disse a um canal de televisão local. 

Os efeitos políticos práticos já podem ser percebidos. Como a relação entre Índia e Paquistão nunca foi das melhores, o primeiro-ministro indiano declarou que não vai admitir que os vizinhos ofereçam abrigo seguro a terroristas que ataquem a Índia. Disse também que vai tomar todas as medidas possíveis para proteger seus cidadãos. 

Em meio à turbulência do grande volume de informações desencontradas, é interessante prestar atenção às declarações do editor internacional da revista Newsweek Fareed Zakaria. Nascido em Mumbai, ele não crê em conexões externas com outros grupos terroristas de maior porte, mas sim num ataque de muçulmanos indianos insatisfeitos. 

"Uma das histórias não contadas sobre a Índia é que a população muçulmana não foi beneficiada pelo boom (econômico) dos últimos dez anos. Ainda existe muito discriminação institucional (contra a população islâmica do país)", diz. 

Para ler a entrevista completa clique aqui.

Entretanto, algumas dúvidas permanecem se a premissa for mesmo a sustentada por Zakaria. Por que americanos e britânicos foram alvos preferenciais? Por que um centro cultural e religioso judaico foi tomado pelos terroristas? 

Vale a lembrança de que Mumbai é o distrito financeiro da Índia e que, além disso, as instituições  atacadas parecem ter sido escolhidas muito mais por seu caráter simbólico do que pelo número de mortos que os ataques poderiam causar. Exatamente como os atentados de 11 de Setembro. 

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Velhos hábitos talibãs no novo Afeganistão

No dia 12 de novembro, 15 mulheres foram atacadas em Kandahar, no Afeganistão, por terroristas do Talibã após deixarem a escola onde davam aulas e estudavam. Dois homens numa motocicleta jogaram ácido em seus rostos, provocando queimaduras graves. Pelo menos uma das vítimas terá de passar por uma cirurgia de reconstrução da face e do pescoço.

A banalidade do injustificável motivo para a realização do ataque torna o crime ainda mais perverso, revoltante e inadmissível: a ação faz parte de uma campanha conduzida há tempos pelo Talibã que pretende impedir mulheres de ter acesso à educação. Para tornar ainda mais clara a firme posição dos fundamentalistas a respeito do assunto, vale a informação de que até 2001 - quando os Estados Unidos expulsaram o governo Talibã do poder - as mulheres eram proibidas de freqüentar as escolas afegãs.

Nesta quinta-feira, dez homens foram presos acusados de participação no ataque. Para realizá-lo, os terroristas receberam cerca de 2 mil reais e usaram armas de brinquedo. Para complicar ainda mais os acontecimentos da região, os militantes são afegãos que vivem no Paquistão.

Ataques do Talibã a escolas do país não são incomuns. O objetivo é desencorajar a educação laica de todas as formas. Mesmo que para isso seja necessário assassinar estudantes, queimar escolas - como se tornou comum a partir de 2004 - ou, como no caso descrito, jogar ácido em mulheres.

Não importa. Para os fundamentalistas esclarecimento é um perigo tão grande que para evitá-lo é permitido qualquer sacrifício ético, moral ou mesmo religioso.

E a impunidade dos criminosos apenas alimenta a espiral da vingança. Uma professora de 23 anos de idade atingida no ataque pediu ao governo afegão que jogue ácido no rosto dos criminosos.

Clique aqui para ler o artigo do presidente afegão, Hamid Karzai, sobre o incidente. Ele lembra dos ganhos obtidos a partir da ofensiva americana de 2001, como a queda nos índices de mortalidade infantil, avanços na saúde e a existência de imprensa livre pela primeira vez na história do país.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

As entrelinhas da visita oficial de Medvedev ao Brasil

Definitivamente, a visita do presidente russo, Dmitry Medvedev, ao Brasil é repleta de significados. Mas, sob o ponto de vista da atual política externa de Moscou, o evento é apenas uma engrenagem de um grande motor cujos objetivos ainda não estão absolutamente claros para os demais países.

Oficialmente, Medvedev estará em solo brasileiro para buscar a assinatura de acordos comerciais nas áreas de defesa e cooperação militar. Como o Brasil busca renovar a frota de jatos da Força Aérea Brasileira (FAB), muita gente está interessada em visitar o país. Afinal, a venda de pelo menos uma centena de aviões desse tipo e de outros equipamentos envolve cifras que possivelmente chegarão à casa de bilhões de dólares.

Entretanto, os aviões de fabricação russa Sukhoi não estão incluídos na fase final de avaliação das autoridades brasileiras porque a Rússia enxerga o Brasil apenas como comprador, e não pretende transferir tecnologia militar ao país. "Estamos muito mais avançados em nossa parceria estratégica com os franceses", disse o ministro de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger. "Queremos importar tecnologia e inteligência, não trabalho bruto", complementou o ministro da Defesa, Nelson Jobim.

Seguramente Medvedev já conhece essa posição. Mas ele vem ao Brasil também para marcar posição num momento em que a Rússia está cada vez mais isolada politicamente. O grande acontecimento da estratégia de relações internacionais russa na América-latina seguramente não é a visita ao Brasil. Mas a chegada de uma frota de navios à Venezuela para a realização de exercícios militares conjuntos - Chávez anunciou em julho deste ano que pretende comprar 30 bilhões de dólares em armamentos de Moscou.

Muitos observadores acreditam que a aproxamiação com a América-latina é uma tentaiva de escapar das armadilhas que o próprio governo russo criou na Europa, uma vez que a Rússia hoje está "cercada" por ex-repúblicas soviéticas filiadas à OTAN.

A aliança com Venezuela, Cuba e Brasil pode ser uma maneira de chamar a atenção dos Estados Unidos e confrontar os norte-americanos em sua área de influência. Mas os termos usados agora estão obsoletos. Não apenas pela passagem do tempo, como também por uma significativa mudança na dinâmica internacional.

Por isso, é simplesmente impossível reviver o período e os conceitos da Guerra Fria, mesmo que Medvedev e o primeiro-ministro Putin sonhem com isso todas as noites. Por várias razões: os Estados Unidos já não têm como diretriz a divisão do mundo com a Rússia. Simplesmente, o governo norte-americano não pode e não quer retornar para o velho jogo de xadrez interplanetário.

Principalmente, a Rússia já não é uma superpotência há muito tempo; muito pelo contrário. Há novos atores internacionais que hoje influenciam as decisões estratégicas do planeta muito mais que a Rússia, como os grupos terroristas, as organizações multilaterais (como a União Européia, por exemplo) e a própria difusão instantânea de informação e comunicação.


***


Em tempo - A Rússia pretende abrir escritórios da Gazprom por aqui - a gigante de petróleo e gás russa. A empresa é uma das aliadas da política atual de Medvedev e do presidente Vladimir Putin, que, graças à grande reserva desses recursos, continua a ter o mínimo de diálogo com os países europeus. Mesmo que para realizar essas transações comerciais os países consumidores se vejam levados a fechar os olhos para abusos do Kremlin, como o assassinato de jornalistas - foram 13 mortos durante o período em que Putin foi presidente (leia mais sobre a morte de Anna Politkovskaya aqui).

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Os resultados das eleições venezuelanas na imprensa mundial

Mais interessante do que analisar os resultados das eleições regionais na Venezuela é ler as manchetes dos jornais de todo mundo e perceber como a cobertura da imprensa pode ser, digamos, criativa ao tratar de algo tão objetivo quanto os números finais de uma votação.

Antes, porém, de apresentar como a parte mais importante da imprensa mundial tratou desse assunto, é preciso dizer claramente que os candidatos aliados de Chávez venceram em 17 dos 22 estados venzuelanos. E vale também lembrar que, ao contrário daqui, na Venezuela o voto não é obrigatório. Na votação deste domingo, 65% dos 17 milhões de eleitores compareceram às urnas.

Com um discurso provocador, anti-americano, polêmico, assumidamente socialista e repleto de slogans, Chávez conseguiu atrair atenção mundial. Ah, além disso, ele não esconde de ninguém seu longo projeto de poder e também faz alianças com países de declarada oposição aos Estados Unidos.

Dito isso, não se pode absolutamente reclamar da extensa cobertura internacional das eleições venezuelanas. Foram editoriais de todos os tipos, além de matérias que fazem um balanço dos resultados de acordo com o olhar que mais convém a cada veículo.

Comecemos por aqui. O jornal O Globo publica a seguinte manchete: "partido de Chávez vence eleições em 17 estados da Venezuela". O texto, entretanto, lembra da vitória da oposição e explica como o presidente venezuelano perdeu em estados onde vivem 65% dos eleitores.

O grupo de comunicação britânico BBC é menos sutil: "oponentes de Chávez obtêm ganhos nas urnas". O subtítulo lembra, entretanto, que os aliados do presidente foram vitoriosos em 17 estados. Já o também britânico The Guardian opta por ressaltar a vitória do presidente venezuelano. "partido de Chávez domina eleições regionais" é a manchete do jornal que também publica a entrevista do cientista político local Luis Vicente Leon para quem os resultados foram sensacionais para a oposição.

O jornal mais importante do mundo, o The New York Times, deixa claro para qual lado pende - uma tendência do jornalismo norte-americano de honestamente admitir parcialidade. "oposição venezuelana ganha em votos", diz a manchete. A matéria recorda ainda que os resultados de domingo foram o que a publicação americana chama de a segunda derrota recente de Chávez após a população do país recusar, em dezembro de 2007, a mudança constitucional que acabaria com os limites para reeleições presidenciais. Também publica as análises de Luis Vicente Leon - o mesmo entrevistado pelo Guardian.

Já a rede de notícias CNN aborda o resultado de maneira diferente. "Chávez passa pelo teste dos votos", diz a manchete. O texto analisa os resultados, entrevista um cientista político que expõe as intenções de permanência do poder do presidente e também cita os ganhos da oposição.

Chávez talvez tenha conseguido mais do que simplesmente as sucessivas reeleições ou, em menor grau, os últimos resultados nas urnas. Hoje ele é um popstar de controvérsia capaz de atrair a atenção dos veículos de comunicação mais importantes do mundo. Muito possivelmente, isso o agrada bastante. Mais até do que os mandatos presidenciais.

domingo, 23 de novembro de 2008

A disputa com o Equador não interessa ao Brasil

O tom das discussões envolvendo as controvérsias entre Brasil e Equador vem sofrendo uma escalada crescente. Tanto que o governo brasileiro teve de tomar a medida clássica que sinaliza insatisfação nas relações internacionais: convocar o embaixador em Quito para consultas em Brasília.

O presidente Rafael Correa adota o discurso morde e assopra, tentando ganhar tempo até decidir se está disposto a arriscar as relações com o Brasil em nome da defesa do que considera direitos do povo equatoriano.

Neste sábado, a nota oficial emitida por Quito demonstra uma mensagem de Correa não apenas em relação ao caso Odebrecht, mas também direcionada à própria maneira do governo brasileiro de conduzir políticas públicas.

"O governo do Equador deplora a decisão adotada pelo governo do Brasil de chamar em consultas seu embaixador e reitera sua permanente disposição para continuar mantendo as relações bilaterais em alto nível de amizade e cooperação. (...) a disputa deve ser resolvida por canais jurídicos estabelecidos pelos dois países de acordo com convênios existentes entre o Equador e a companhia privada envolvida, sem que esta situação afete as relações existentes entre os povos e governos dos dois países".

O texto tenta distanciar as relações entre os dois Estados e a controvérsia com a Odebrecht. Dá a entender que o governo brasileiro não deveria se esforçar e se desgastar para defender uma empresa privada, como se esta disputa não interessasse aos próprios cidadão brasileiros.

O problema é que, se o Equador der calote na Odebrecht, perdem-se para sempre os 243 milhões de reais emprestados pelo BNDES - banco público brasileiro que trabalha com, dentre outros recursos, impostos arrecadados dos contribuintes do Brasil.

Além disso, um dos questionamentos de Correa quanto ao contrato diz respeito ao repasse de verbas. Como o crédito foi destinado diretamente à Odebrecht, o presidente equatoriano demonstra insatisfação com o fato de a dívida estar legalmente descrita como uma pendência financeira entre Equador e Brasil.

Ora, não faria sentido o BNDES enviar esta enorme quantia para o governo equatoriano se , depois disso, os 243 milhões de reais seriam repassados à própria construtora brasileira. O fato é que se a usina hidrelétrica San Francisco - obra que gerou toda essa discussão - é um patrimônio equatoriano, a dívida relativa ao dinheiro que a construiu também é. Simples assim.

Se, como afirmam as autoridades do Equador, a obra não supre as necessidades do país ou não fornece a quantidade de energia elétrica prevista em contrato, isso é uma questão a ser decidida entre as três partes interessadas: o governo equatoriano, o brasileiro - representando o BNDES - e a Odebrecht.

O questionamento do Palácio do Itamaraty - e a razão pela qual o embaixador Antonio Marques Porto foi convocado de volta - é que o governo brasileiro foi surpreendido por uma ação apresentada na Câmara de Comércio Internacional (CCI) sem qualquer consulta prévia.

Ao governo brasileiro, e ao presidente Lula em particular - cujos índices de aprovação permitem uma certa tranqüilidade em meio à confusão mundial -, não interessa um desgaste internacional num momento em que ninguém quer aparentar o mínimo de instabilidade diante dos mercados.

Apesar de possivelmente concordar ideologicamente com seus pares mais controversos na América Latina, Lula se esforça para manter distância segura da explosividade retórica de Chávez, Evo, Lugo e Correa. É uma decisão inteligente diante da impossibilidade de prever as conseqüências da crise financeira e, mais ainda, da insegurança dos investidores na estabilidade política da região.

Tudo o que Lula e nós não precisamos é chamar a atenção do planeta com disputas políticas levadas a cortes internacionais e, menos ainda, com controvérsias envolvendo perda de patrimônio financeiro do país.

Para piorar ainda mais a situação, as autoridades equatorianas revelam que esta ação contra o Brasil na CCI faz parte de uma séries de decisões que avaliam as possibilidades de Quito declarar moratória ao pagamento de juros da dívida externa contraídas com instituições financeiras internacionais.

sábado, 22 de novembro de 2008

Evidências de urânio são encontradas na Síria; Irã reprime supostos colaboradores de Israel

Em setembro de 2007, aviões da Força Aérea Israelense bombardearam um complexo sírio onde supostamente instalações nucleares estariam a ponto de serem construídas. O ataque aconteceu rapidamente, destruiu a infra-estrutura local e causou certa polêmica.

Pouco mais de um ano depois - para ser mais exato, nesta semana - inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) divulgaram as conclusões das amostras colhidas em solo sírio: foram encontrados traços de urânio que já haviam passado por alterações químicas.

Além de revelar a matéria-prima fundamental para pretensões nucleares, o relatório também informa que o grande número de bombas d'água do complexo sírio seriam suficientes para a construção de uma instalação nuclear próxima ao rio Eufrates.

O documento menciona ainda que as autoridades sírias têm negado o acesso dos funcionários da AIEA para a realização de novas inspeções no local do ataque, bem como a outros três pontos onde se acredita que um reator possa ser construído.

Curisamente, havia a possibilidade do início de negociações de paz indiretas entre israelenses e sírios - que com os fatos divulgados nesta semana devem perder força.

O relatório vem a público justamente no momento em aumentam as tensões entre Israel e Irã - cuja cooperação militar com a Síria torna ainda mais complicada a situação israelense na região.

Os acontecimentos desta semana deixam claro como o discurso iraniano anti-israelense está sendo aplicado na prática entre sua própria população.

O empresário de Teerã, Ali Ashtari, foi oficialmente enforcado - se é que se pode chamar assim - depois de "confessar" ter espionado para Israel. Segundo a IRNA, a agência de notícias oficial do Irã, Ashtari teria recebido um empréstimo de agentes israelenses no valor de 50 mil euros.

Hossein Derakhshan, blogueiro iraniano, também foi preso depois de visitar Israel, em 2007. Ele tem cidadania canadense e foi levado a interrogratório logo após chegar à capital iraniana. Segundo o site de notícias Jahan News, ele também "confessou" espionar para Israel.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Tendências para 2025

Relatório divulgado nesta sexta-feira pelo Conselho Nacional de Inteligência dos Estados Unidos aponta mudanças em pontos-chave da economia, relações internacionais e poderio militar no mundo. O estudo - cujo nome oficial é Tendências Globais 2025 - procura sugerir caminhos para que o governo americano esteja preparado para lidar com a alteração na dinâmica do eqüilíbrio de forças e também para o surgimento de novas potências planetárias.

Algumas conclusões da pesquisa estão longe de surpreender. É o caso, por exemplo, da decadência da economia americana - mais evidente do que nunca - e da possibilidade concreta de o mundo se tornar multipolarizado devido ao crescimento militar de países como Índia e China, e, até mesmo, de o Brasil ocupar um papel econômico importante num planeta que vai precisar se acostumar à escassez de recursos.

Por mais interessante que sejam essas previsões - aliás, a proximidade de dezembro parece detonar esse aparente instinto humano de tentar adivinhar o futuro, mesmo quando ele surge cercado de rigor científico, como é o caso desta pequisa -, sempre tendo a analisá-las com um certo ceticismo. Afinal, a humanidade é tão criativa, e as mudanças vêm acontecendo com tamanha rapidez, que previsível mesmo é que algum grande acontecimento pré- 2025 desmorone parte das tais tendências divulgadas pelo Conselho Nacional de Inteligência.

Isso já ocorreu antes, afinal esses estudos são realizados a cada cinco anos. E os enganos já foram muitos, como recorda o jornalista da BBC Paul Reynolds.

"Em 1980, Ronald Reagan disputava as eleições presidenciais com Jimmy Carter. Uma das bandeiras de campanha de Reagan era a necessidade de preparar os Estados Unidos, uma vez que o país estava próximo de ser ultrapassado por União Soviética e Japão. Naquela época, o Japão representava uma ameaça à liderança econômica americana semelhante à exercida hoje pela China", escreve.

Ninguém imaginava, entretanto, que numa garagem do subúrbio um jovem e desconhecido Bill Gates começava a revolucionar o planeta com o surgimento da nova e poderosa indústria dos computadores pessoais.

Voltando às previsões divulgadas nesta sexta-feira, o estudo também aponta a tendência da diminuição do poder da al-Qaeda. Segundo o relatório, isso deve acontecer por três importantes fatores: ideologia inflexível, objetivos estratégicos inatingíveis e dificuldade em se tornar um movimento de massa. De fato, é cada vez maior a impopularidade do grupo no mundo muçulmano.

Além de todos esses argumentos, a eleição de Barack Obama esfriou o discurso anti-americano - a principal luta da al-Qaeda, já que seus membros não admitem qualquer possibilidade de diálogo, acordo, deposição de armas etc. Em boa parte, a perda de popularidade entre os próprios muçulmanos explicaria o desespero da mensagem divulgada nesta semana atacando Obama ao chamá-lo de traidor da causa negra. Não deixa de ser uma tentativa de motivar os radicais ou mesmo radicalizar aqueles que se mostrariam favoráveis a um diálogo com Obama.

De qualquer forma, além das previsões óbvias, o estudo soa mais como um documento curioso para nos surpreendermos daqui a alguns anos quando pudermos checar quantas variáveis apareceram no meio do caminho até 2025. Mas é bem possível que ele sirva de diretriz para certas decisões ou abordagens políticas mais imediatas da Casa Branca.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A complexidade por trás do anúncio da Autoridade Palestina nos jornais israelenses

Num gesto sem precedentes nos conflitos do Oriente Médio, a Autoridade Palestina publicou nesta quinta-feira um anúncio de página inteira em quatro dos principais jornais israelenses. O texto, escrito em hebraico, busca promover o plano de paz da Liga Árabe apresentado a Israel em 2002.

"Cinqüenta e sete países árabes e muçulmanos irão estabelecer relações diplomáticas com Israel em troca de um acordo de paz completo e do fim da ocupação (dos territórios conquistados pelo Estado Judeu, em 1967)", diz o texto.

É uma jogada de mestre da AP, que busca assim conquistar a maior parte da opinião pública do Estado Judeu -bastante favorável a fim dos conflitos com os palestinos.

Mas, como tudo na região, a situação é bem mais complexa do que parece. Apesar de contar com o apoio de figuras importantes da política mundial, o plano ainda precisa de muitos ajustes. Ele, por exemplo, reivindica o retorno dos refugiados palestinos para o interior do Estado de Israel, não para as fronteiras do futuro Estado Palestino.

O maior empecilho a esta demanda é inerente à própria existência de Israel. A acomodação de 700 mil palestinos hoje dentro de Israel não é simplesmente uma complicação logística, mas, principalmente, inviabiliza o país em sua proposta mais fundamental: ser um Estado Judeu.

Esta nova população alteraria o eqüilíbrio demográfico de Israel e, em alguns anos, a maioria da população do país - devido ao histórico da taxa de natalidade entre a população muçulmana - não seria judia.

Na prática - mais do que questões consideradas fundamentais como o status de Jerusalém ou a devolução das das Colinas de Golan à Síria -, o destino dos refugiados palestinos é o fator que mais complica a assinatura de um acordo de paz.

Israel não pretende deixar de ser um Estado de maioria populacional judaica e, como alternativa, propõe uma compensação financeira a cada família que deixou a região nas Guerras de 1948 e 67. Além disso, argumenta que, da mesma forma que após sua independência recebeu 1 milhão de judeus expulsos dos países árabes e integrou-os à sociedade, os palestinos deveriam fazer o mesmo com aqueles que decidirem retornar para o futuro Estado Palestino.

Sobre a iniciativa da publicação do anúncio, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores israelense, Yigal Palmor, lembrou o controle exercido pela Autoridade Palestina sobre os veículos de imprensa. "Este é um gesto que nunca terá recíproca. Você pode imaginar palestinos permitindo que o governo israelense faça o mesmo?", disse.

Clique aqui para conhecer mais detalhes sobre o plano de paz apresentado pela Liga Árabe em 2002. O link oferece também análises sobre a iniciativa.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A guerra do mar

O ataque de um navio de guerra indiano a um cargueiro pirata no Golfo de Áden pode ser apenas o início de uma grande confusão militar e jurídica que coloca no centro das disputas internacionais dois universos diferentes: o dos amplamente beneficiados pelo processo de globalização - aí representados por grandes exportadores de petróleo - e os absolutamente excluídos deste sistema - no caso, os piratas da Somália. 

No foco da questão, o único fator que poderia levar as grandes potências mundiais a voltar seus olhos para um país africano em guerra ininterrupta há 17 anos cuja metade da população sofre com fome e desemprego: dinheiro. Para ser mais exato, os cerca de 70 milhões de dólares de prejuízo impostos a grandes empresas mundiais desde que, em janeiro deste ano, 91 cargueiros foram seqüestrados. 

E isso não deixa de ser interessante. Apesar de alguns analistas tentarem vincular as ações ao terrorismo internacional, não há nenhuma evidência de que haja qualquer ideologia por trás dos seqüestros de navios. Pelo contrário. Na prática, o objetivo desses piratas modernos é bastante simples: ganhar dinheiro com o pagamento do resgate das cargas. E eles têm obtido sucesso, já que as empresas têm menos prejuízo ao pagar a quantia pedida do que perdendo de vez o carregamento. 

Não é impossível, entretanto, que organizações terroristas como a al-Qaeda vejam nas ações piratas a possibilidade de conseguir dinheiro para financiar suas atividades. Na própria Somália, rebeldes islâmicos controlam o sul do país desde 2006.  Mas os piratas são democráticos nos seqüestros e não parecem estar dispostos a ideologizar o roubo de cargas. Tanto que a ação mais audaciosa aconteceu justamente contra seus irmãos de fé sauditas: o seqüestro do navio Sirius Star.

Além de seus 25 membros, os ladrões estão em poder de 2 milhões de barris de petróleo. O valor total da carga é estimado em impressionantes 100 milhões de dólares. 

Mesmo sem esse objetivo, as ações dos piratas serviram para pôr em foco a enorme distância a separar desenvolvidos e esquecidos da economia. Desde 1991, a Somália não tem um governo regular, a guerra civil devastou o país e simplesmente não há qualquer atividade produtiva capaz de gerar emprego. Aliás, por causa dessa baderna de ausência de instituições, os ladrões não são presos na Somália ou levados a julgamento. 

O seqüestro de navios e seus tripulantes é absolutamente injustificável, mas não deixa de ser irônico como um grupo de pessoas decidiu se empenhar com um sistema complexo de tecnologia e logística - os piratas monitoram os alvos com GPS, notebooks etc - para subverter e inviablizar um braço bastante importante do comércio mundial. 

Para ler o editorial do Los Angeles Times de hoje sobre a pirataria marítima, clique aqui.

Para conhecer mais sobre a miséria da Somália com dados completíssimos do The World Fact Book, da CIA, clique aqui

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Novidades no front iraquiano

Curiosamente, o presidente Bush pode estar ajudando o recém-eleito Barack Obama em pelo menos uma das tarefas mais complicadas do futuro governo democrata: a retirada das tropas do Iraque. 

O embaixador americano em Bagdá, Ryan Crocker, e o ministro das relações exteriores iraquiano, Hoshyar Zebari, assinaram um acordo que estabelece o dia 31 de dezembro de 2011 como a data-limite para a saída de todas as forças militares americanas do Iraque. 

Ainda é cedo para afirmar que em três anos a presença dos Estados Unidos no país será totalmente extinta, até porque o tratado ainda precisa ser aprovado pelo parlamento iraquiano. 

Mas é uma mudança radical na posição de Bush, que jamais concordara em estabelecer qualquer data para as tropas se retirarem. 

Além disso, consta do acordo um item de grande importância para a geopolítica mundial: o texto deixa claro que o território iraquiano não servirá de base para o lançamento de ataques dos EUA a outros países da região. 

Esta é uma mensagem clara ao Irã, que, por sinal, não se pronunciou sobre o acordo. 

Mais ainda, as autoridades iraquianas parecem estar satisfeitas com o tratado. Pelo seu conteúdo e também por suas próprias pretensões no governo do país, como descrito na edição eletrônica do The New York Times: 

"Em muitos casos, a aprovação (do texto) parece ser uma estratégia adotada pelos líderes do Iraque de forma a garantir sua sobrevivência política. Foram os Estados Unidos os responsáveis por alçar muitos dos atuais membros do governo (iraquiano) ao poder. E, devido à fragil situação de segurança, parte deles ainda vê a necessidade da presença militar americana no Iraque". 

Ao mesmo tempo, o Iraque parece cada dia mais estar voltando aos tempos de Saddam. Denúncias dão conta de que o primeiro-ministro, Nuri al-Maliki, vem sistematicamente demitindo inspetores cuja função era combater desvios de verba e corrupção nas esferas do governo. 

Em sessão no Congresso Americano, uma testemunha que ocupava o cargo de investigador chefe do governo iraquiano informou que 13 bilhões de dólares foram desviados dos Fundos de Reconstrução do Iraque mantidos pelos EUA. 

Para ler a matéria completa sobre os indícios de corrupção no Iraque, clique aqui

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

As notícias nada animadoras que chegam do Congo

O barril de pólvora em que se transformou o Congo dá sinais de que está prestes a ser detonado novamente. Neste domingo, voltaram a ocorrer combates entre as forças do governo e rebeldes leais ao General Laurent Nkunda. Os confrontos acontecem no momento em que havia a possibilidade do estabelecimento de um cessar-fogo. 

Como em todo o território africano, as tentativas de acordo são falhas muito por conta da visão eurocêntrica dos mediadores dos conflitos. O fato é que não estão absolutamente claros os motivos que deram início à atual escalada de violência, mas há sinais de que não são muito diferentes das razões por trás das demais guerras responsáveis pela morte de milhões de africanos: diferenças étnicas e interesses econômicos. 

É bem provável, entretanto, que o genocídio dos tutsis em Ruanda, em 1994, tenha motivado Nkunda a tomar medidas drásticas para oferecer proteção à etnia agora quando existe um temor de que haja novos enfrentamentos com os Hutus. Longe de ser o mocinho da história - os conflitos internacionais não permitem este maniqueísmo -, Nkunda é acusado de cometer crimes de guerra e contra a humanidade.

De fato, a paz nunca foi estabelecida entre as duas partes, mas, em 2006, a União Européia e a ONU já haviam chegado a uma solução que, do ponto de vista ocidental, soava bastante adequada: determinaram a realização de eleições no Congo. O grande erro é que ambos os organismos internacionais ignoraram que minoria tutsi iria perder nas urnas.

Assim, antes mesmo do pleito, o General Nkunda levou suas forças para a província de Kivu do Norte (palco da violência atual), e os rebeldes passaram a atacar a população civil não-tutsi. 

É triste notar como um erro estratégico dos mediadores pode ter sido responsável pela tragédia humana de hoje - um simples equívoco na maneira de examinar a balança de poderes  nada convencional dos países da África. 

Clique aqui para ler uma breve biografia de Laurent Nkunda publicada pela organização independente Human Rights Watch. O texto lista o histórico de seus crimes, que incluem estupros e assassinatos em massa. 

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O Hamas e os Estados Unidos

A edição eletrônica do jornal Haaretz traz uma notícia exclusiva bastante interessante: em 2006, o Hamas teria mandado uma carta  aos Estados Unidos acenando com a possibilidade de negociações diretas de paz e um cessar-fogo com Israel. 

A carta foi entregue ao diário por um professor americano que se encontrou com o líder do Hamas, Ismail Haniyeh, meses depois das eleições que levaram o grupo ao poder. A mensagem foi repassada pelo acadêmico a autoridades do governo e ela teria chegado ao conhecimento do presidente Bush. 

Entretanto, nunca houve resposta à oferta. A carta foi escrita durante o boicote dos Estados Unidos e União Européia ao governo do Hamas em Gaza - que ainda se mantém devido à recusa do grupo em abrir mão de realizar atentados terroristas e lançar foguetes contra Israel.

O conteúdo da mensagem é bastante genérico, mas mostra uma mínima disposição à negociação - um avanço, levando-se em consideração que os métodos utilizados pelo Hamas apenas reafirmam a posição de sua carta de criação: destruir o Estado de Israel e, sobre seus escombros, fundar uma Palestina islâmica mais ou menos nos moldes do atual Irã.  

O texto ditado em árabe por Haniyeh e traduzido para o inglês diz o seguinte: "somos um governo eleito num processo democrático. Estamos tão preocupados com a paz na região, que não nos importamos de termos um Estado palestino nas fronteiras de 1967. Oferecemos uma trégua por muitos anos. Conclamamos os EUA a negociarem diretamente com o governo eleito. O prolongamento desta situação (o boicote) vai encorajar o caos e a violência em toda a região". 

Seguramente, o Hamas não estava tão preocupado assim com a paz, muito menos com a estabilidade do Oriente Médio. E é importante notar que o texto não fala de um reconhecimento do Estado de Israel, apenas menciona uma trégua por "muitos anos". Mas esse teria sido o momento para o início de negociações. 

O Hamas, sem dúvida, não é o parceiro ideal para a paz. Mas Arafat, antes dos Acordos de Oslo, tampouco era. Assinar um tratado, estabelecer o mínimo de relacionamento e exigir o cumprimento do combinado é a forma pragmática e eficiente de, ao menos, desarmar o discurso e as ações de um grupo como o Hamas. 

Hoje o governo Bush está de saída e admite que não haverá mais tempo para a costura de um acordo mais amplo. A secretária de Estado Condolezza Rice esteve na região durante esses anos entre 19 e 22 vezes (há uma divergência entre a quantidade de visitas; 19, segundo jornalistas; 22, de acordo com a embaixada americana em Israel). Não conseguiu nada além de promessas vazias. 

E agora a situação está em suspenso por uma série de fatores: a fragilidade do cessar-fogo entre Israel e o próprio Hamas, a transição do governo nos Estados Unidos, as eleições em Israel, e o fim do mandato do presidente Mahmoud Abbas à frente da Autoridade Palestina. 

Notícia do jornal árabe publicado em Londres Al-Hayat informa que Obama teria mantido diálogos com membros do Hamas durante a campanha eleitoral. Segundo Ahmed Yusuf, conselheiro do líder do grupo terrorista, houve contatos entre as partes também após a vitória do democrata nas eleições americanas. 

Durante a corrida presidencial, Obama deixou claro que só aceitaria negociar com o Hamas se o grupo renunciasse ao terrorismo, reconhecesse o direito de existência de Israel e respeitasse acordos assinados no passado. 

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

O mapa da guerra


Ao lado, o mapa da próxima empreitada militar americana. Depois de Iraque e Afeganistão, as ações estão cada vez mais rumando para o leste. A imagem mostra a região de fronteira entre Paquistão e Afeganistão. 

A área tem forte presença de terroristas da al-Qaeda e do Talibã e vem sofrendo inúmeros atentados recentemente. 

Nesta quinta-feira, o adido comercial iraniano foi seqüestrado perto da cidade de Peshawar. 

Como se pode notar no mapa, a capital Islamabad é vizinha à região, que vem sendo atingida por uma escalada de violência incluindo atentados da al-Qaeda e Talibã, e bombardeios americanos destinados a acabar com a infra-estrutura terrorista local. 

Sem dúvida, a imagem acima será bastante conhecida daqui pra frente. Como escrevi no post abaixo, muito provavelmente este vai ser o novo teatro de operações dos Estados Unidos na caça à bin Laden e na tentativa de desmantelar a al-Qaeda. 

O mapa foi confeccionado pela BBC News. 


Mudança de foco

Artigo publicado no The Guardian pelo jornalista inglês Jonathan Freeland comenta as declarações feitas por Obama ao The Washington Post sobre seu compromisso de continuar em busca de Osama Bin Laden e seus aliados da al-Qaeda.

Enganaram-se completamente os que acharam que as críticas do presidente eleito à Guerra contra o Terror empreendida por Bush poderiam significar a relativização da posição dos Estados Unidos quanto ao terrorismo. Pelo contrário.

Um dos pontos fracos da campanha de Obama foi justamente a questão da segurança. Por isso, não é de se estranhar que o novo líder norte-americano comece a bater nesta tecla. Estrategicamente, a equipe de assessores que o cercam está empenhada no esforço de preencher qualquer vácuo que possa dar margens a críticas no início do próximo governo.

Freeland argumenta também que a eleição de Obama dificultou a argumentação anti-americana. Além do seu nome, da história de sua família e de suas origens, o democrata já declarou que pretende ordenar a retirada das tropas americanas do Iraque num processo gradativo a ocorrer num período de 16 meses.  

Entretanto, deixando o Iraque e tendo como objetivo máximo capturar Bin Laden e desmantelar a infra-estrutura da al-Qaeda, Obama já declarou que pretende realizar operações no Afeganistão e nas áreas tribais do Paquistão, onde se acredita que o líder da organização terrorista está escondido.

Ora, mudar o teatro de operações para o Paquistão é uma aposta arriscadíssima, ainda que tenha o objetivo concreto de capturar bin Laden. A notícia que vazou nesta semana dando conta de operações secretas dos EUA em diversos países – inclusive no maior aliado americano na região – apenas confirma as suspeitas do próprio governo paquistanês, cujo primeiro-ministro deixou claro que reprova a transgressão da soberania de seu país.

Não se sabe, todavia, se a equipe de transição do futuro governo já iniciou contatos com os países aliados. Entretanto, será bastante complexo convencer as autoridades paquistanesas a permitir a entrada de tropas americanas para combater terroristas da al-Qaeda e do Talibã em seu território. Muito porque seria admitir a ineficiência do Estado em controlar rebeldes e demais grupos que, recentemente, vem atacando o país com atentados em série.

Além do mais, do ponto de vista estratégico regional, o Paquistão precisa demonstrar força diante de seus rivais Índia e Irã. As declarações de Obama podem significar o início de um jogo bastante complexo de ser vencido.

Mas talvez seja aí que o capital de simpatia mundial do futuro presidente americano possa fazer a diferença para, graças a ele, convencer os demais líderes mundiais da nobreza de seus objetivos. 

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Primeira Guerra Mundial

O mundo lembra hoje o fim da Primeira Guerra Mundial. As datas cheias costumam ser recordadas repletas de eventos. Este é o caso também dos 90 anos do fim do conflito que marcou a Europa do início do século vinte tanto pelo devastador número de mortos - mais de 15 milhões em quatro anos -, quanto por suas conseqüências definitivas responsáveis pela formação das fronteiras do velho continente tal como as conhecemos hoje. 

A adequação da tecnologia aos objetivos militares passou a fazer parte dos empreendimentos de guerra; alguns muito importantes, como bombardeios aéreos e químicos. 

O dia 11 de novembro marca também a renúncia de Carlos 1 ao trono austríaco, dando fim há mais de 600 anos da dinastia dos Habsburgos e também ao próprio Império Austro-húngaro. 

A Polônia se tornou um Estado depois de 123 anos de dominação por três diferentes impérios: Rússia, Prússia e Áustria-Hungria. 

Mais ainda, a Guerra marca o fim definitivo dos impérios como atores principais das relações internacionais. E dos escombros do conflito, o Estado nacional emerge como representante ocidental da auto-determinação dos povos. 

Depois de 90 anos, os Estados hoje se vêem definitivamente ameaçados por um ator relativamente novo, com influência no jogo político internacional e com potencial altamente devastador. Os atentados de 11 de setembro acabaram por lançar luz sobre um componente subestimado e até então desimportante na tomada de decisões das potências ocidentais: o fundamentalismo islâmico e seu interlocutor armado, o terrorismo. 

Conflitos como a Primeira e a Segunda Guerra Mundial são ultrapassados não apenas por terem acontecido no século vinte. Creio que serão raras - senão inexistentes - as disputas militares entre países ocidentais. Ou simplesmente a chamada guerra "clássica" entre exércitos de dois Estados. 

As próximas guerras muito provavelmente envolverão um Estado formal em luta contra dezenas ou centenas de organizações terroristas que desprezam convenções de guerra, uniformes de identificação e, pior ainda, a própria vida. Sem dúvida, a situação hoje é bem mais complexa do que há 90 anos. 

Isolacionismo russo

Mesmo sem a aprovação da Lituânia - e portanto sem unânimidade entre os membros -, a União Européia decidiu retomar as conversações com a Rússia - interrompidas devido à intervenção militar na Geórgia, em agosto.

Os motivos para a decisão não apenas estão claros, como foram ditos textualmente pelos governos de Suécia e Reino Unido, dois dos países mais críticos à guerra na Ossétia do Sul.

"as negociações são a maneira mais pragmática de irmos em busca de nossos interesses numa variada gama de questões importantes, como energia, mudanças climáticas e comércio", diz o comunicado.

O caso ilustra bem como, apesar da clara desconfiança em relação à política externa atual do Kremlin, os Estados europeus se vêem sem alternativa e força de pressão sobre a dupla Putin-Medvedev que - para sorte deles e azar de todos os demais, inclusive da própria população russa - estão sentados sobre a maior reserva de gás da Europa.

Como já escrevi em outro texto, o rigoroso inverno europeu se aproxima e nenhum dos líderes dos países ocidentais teria como justificar internamente um boicote ao gás russo devido à discordância por conta do jogo das relações internacionais.

Entretanto, se não fosse pelas reservas que possui, a Rússia estaria ainda mais isolada. A eleição de Obama foi um duro golpe nos países que tinham o contraponto aos Estados Unidos como estratégia única na formação de alianças - caso da atual política externa russa.

Estados que nos últimos anos se mostravam absolutamente desinteressados de qualquer tipo de relacionamento com os EUA acenaram - mesmo que discretamente - com a possibilidade de diálogo com o novo governo americano. Foi o caso de Venezuela, Síria e até do Irã.

As vozes de oposição em Moscou já começam a se manifestar. Em breve, alguns trechos de uma análise bastante interessante da maneira como pensa a elite política e econômica russa.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Militares americanos teriam atuado secretamente no exterior em busca de terroristas da al-Qaeda

Ainda na esteira do fim da Era Bush, a edição desta segunda-feira do The New York Times traz uma matéria que promete causar grande repercussão em todo o mundo.  Segundo fontes anônimas ouvidas pelo jornal, as Forças de Operações Especiais realizaram, desde 2004, cerca de uma dezena de ataques a alvos da al-Qaeda em países que não estavam em guerra com os EUA, como Síria, Paquistão e outros. 

No caso do Paquistão, a situação é ainda mais grave porque o país é considerado um aliado americano na região. 

O sinal verde para as operações secretas no exterior teria sido dado em caráter de sigilo absoluto pelo então secretário de defesa Donald Rumsfeld e contava com aprovação do presidente Bush. A diretriz previa o ataque a alvos da al-Qaeda em qualquer parte do mundo. 

O vazamento desta informação seria a explicação mais plausível para as recentes incursões americanas na Síria e no Paquistão. Para relembrar os dois casos, clique aqui e aqui

A reportagem do Times identifica ainda de 15 a 20 países que serviriam de abrigo para terroristas da al-Qaeda - Síria, Iêmen, Arábia Saudita e outros Estados do Golfo Pérsico. 

Não chega a ser novidade a descoberta de informações às vésperas do fim de um governo. Aliás, é até natural que as fontes comecem a contar o que sabem. Muitos buscam prestígio ou até mesmo valorizar o trabalho realizado durante o período em que permaneceram em cargos nem sempre de alto escalão e, por conseqüência, sem grande visibilidade. 

Aliás, não seria estranho imaginar que o próprio governo teria feito vista grossa ou mesmo colaborado indiretamente para que a informação chegasse à imprensa. 

Em baixa com a população - e não por acaso a notícia é publicada em Nova Iorque, onde Bush tem grande rejeição -, dar a entender que o governo fez de tudo o que podia para encontrar bin Laden e seus comparsas serviria para diminuir as críticas sobre a falta de empenho de Washington em prender ou matar o maior agressor dos Estados Unidos em todos os tempos. 

Para ler a reportagem do The New York Times, clique aqui


sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Bush X McCain

Depois da indiscutível vitória Democrata em todos os aspectos eleitorais, o presidente Bush deixará a Casa Branca ainda sob o impacto de alguns números altamento negativos: além do azar da crise econômica ter dado um nocaute justamente no último round de seu governo, passa para a História como o líder americano a quase bater o recorde de desaprovação interna ostentado por Harry Truman em 1952 (somente 22% de americanos satisfeitos). 

Muito por causa da crise, em setembro deste ano a administração Bush chegou bem perto do último limite de impopularidade; somente 27% dos americanos disseram ao Instituto Gallup apoiarem suas decisões. Foi o pior índice registrado desde que chegou à presidência e fez Bush se unir a Truman e Richard Nixon como os únicos que obtiveram percentual igual ou inferior aos tais 27% de aprovação popular. 

Certamente o recado dado pelas urnas e os índices das pesquisas de popularidade desagradam ao presidente. Mas não necessariamente a derrota de McCain foi pessoalmente ruim para Bush. 

Como deixou claro ao longo de toda a campanha, McCain fez um enorme esforço para desvincular sua imagem à do presidente. E não apenas pela óbvia insatisfação popular com assuntos como crise financeira e guerra do Iraque. 

A biografia política de McCain é marcada por confrontos com Bush que chegaram ao auge em 2004. Além de ter recebido uma proposta direta para mudar de partido, McCain foi sondado por John Kerry para ser seu vice nas eleições presidenciais daquele ano. McCain seria o vice do candidato democrata, algo inédito na política americana. Do outro lado da disputa e que mais tarde seria reeleita, a chapa Bush-Cheney. 

Seguramente, Bush não está rompendo em lágrimas pela derrota de McCain. 

No vídeo abaixo, George W. Bush discursa e dá os cumprimentos oficiais ao presidente eleito e menciona os serviços prestados por John McCain ao país. Também aproveita para dar uma leve alfinetada no slogan de campanha de Obama e para reafirmar sua própria agenda política ao longo desses dois mandatos - o forte investimento em segurança. 

"A longa campanha terminou e agora seguimos em frente como uma única nação.  Estamos começando um período de mudanças em Washington, embora sempre haverá valores que nós nunca vamos mudar. O governo dos Estados Unidos vai permanecer alerta em sua responsabilidade mais importante: proteger o povo americano". 

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

A vitória de Obama

O candidato democrata venceu, o mundo comemorou, a Era Bush está prestes a terminar. Obama conta com a simpatia do planeta. Recebeu congratulações até de Rússia e Venezuela - Chávez escreveu que quer voltar a ter boas relações com os Estados Unidos. 

Além do apoio externo - à exceção da Al-Qaeda, que preferia McCain -, dentro de casa o resultado das eleições também foi bastante positivo. No placar final, o fenômeno Obama transferiu sua enorme popularidade a seu partido. Na Câmara e no Senado, os democratas são maioria (56 a 40 e 251 a 172), algo que não acontecia desde 1995, quando Bill Clinton ainda era presidente. 

Depois de oito anos de governo republicano, a rotatividade do poder é bastante natural - para não dizer, esperada. Mas a mudança foi, sem dúvida, acelerada pelo carisma e poder de oratória de Obama, que chacoalhou o cenário mundial apresentando sua candidatura como um fato novo no marasmo da política americana. Com uma carreira meteórica, chega vitorioso nas duas primeiras batalhas que enfrentou: a dura - e muitas vezes desleal - disputa com McCain e o embate contra o sentimento anti-americano no exterior.

Depois de muito tempo, bandeiras dos Estados Unidos foram agitadas nas ruas das capitais européias e não foram queimadas. 

Obama tem agora um cenário altamente favorável para realizar as mudanças que seu slgoan de campanha prometeu e - mais ainda - que o mundo espera dele. Leia aqui a análise do The New York Times sobre a vitória do senador. 

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

A vida dura do próximo presidente americano

É difícil mesmo entender porque a disputa pela Presidência americana é tão acirrada. Ou melhor, qual o sentido de ambicionar ao cargo mais importante do planeta neste exato momento histórico.

Seja quem for o eleito, o próximo presidente vai receber de bandeja uma dívida federal de 1 trilhão de dólares. As últimas notícias mostram a queda de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) no pior resultado desde o índice negativo de 1,4% no terceiro trimestre de 2001, depois dos atentados de 11 de setembro.

O próximo governante americano terá em suas mãos a situação econômica mais grave dos Estados Unidos em 80 anos. O preço da gasolina caiu, mas esta não é uma novidade a ser comemorada. Ocorre devido à queda no consumo, e as rodovias registraram redução no tráfego de 3,6% em relação ao ano passado.

No campo das relações externas, os desafios são enormes. Por menos piores que tenham sido as últimas estatísticas de baixas americanas no Iraque, o efetivo militar dos Estados Unidos enfrenta grande dificuldade para controlar a situação no Afeganistão. No total, até o final do dia 3 de novembro, 4.775 soldados americanos perderam suas vidas nas duas ofensivas.

Além disso, a diplomacia e os serviços de segurança dos Estados Unidos terão de lidar com a possibilidade de um Irã nuclear, a retomada das sensíveis relações com a Rússia, a crescente onda de terrorismo na Índia e no Paquistão, a ameaça econômica e militar da China, a provável sucessão na Coréia do Norte, além de encontrar uma maneira de frear a influência de Chávez na América Latina e suas alianças com Síria, Irã e Rússia. E, é claro, a tentativa de costurar um acordo de paz definitivo entre israelenses e palestinos.

Curiosamente, esses dilemas podem ser colocados diante de Obama, cujo perfil internacionalista se contrapõe ao do atual presidente George W. Bush. Vale lembrar, entretanto, que foram os atentados de 11 de setembro os responsáveis por forçar este último a se aventurar além das fronteiras. Para refrescar a memória, Bush não tinha qualquer interesse de se tornar um grande estadista ou fazer um governo marcado pela política externa - como de fato ocorreu.

Apesar disso tudo, a Presidência americana é disputadíssima. Até porque, a oportunidade de mostrar trabalho é enorme. Portanto, quem conseguir resolver metade das complexas questões que o momento apresenta, terá feito seguramente um ótimo governo e poderá terminar este primeiro mandato com um índice de popularidade semelhante ao de Bill Clinton, que, em 2001, deixou a Casa Branca respaldado por uma taxa de aprovação de 67%.

domingo, 2 de novembro de 2008

O continente que não existe

Cerca de um milhão de pessoas foram deslocadas de suas casas na República Democrática do Congo. Não é a primeira vez que grandes populações africanas estão prester a sofrer massacres. E não será a última seguramente.

A África é o maior continente do planeta. Mas poderia ser o menor. Talvez seja mesmo. A morte de milhões de seus habitantes não é, não foi e aparentemente nunca vai ser uma preocupação dos governos dos países mais poderosos do mundo.

A atual crise da República Democrática do Congo - que já foi Congo Belga, Zaire e voltou a ser Congo - mereceu uma certa preocupação da ONU. Para proteger a população civil, a instituição cujo objetivo era garantir a paz no planeta deslocou para o país um efetivo de 17 mil soldados. É deles a missão de impedir mais uma tragédia humanitária.

Irã, Rússia, China, dentre outros nove países, continuam a fornecer armas para a milícia árabe Janjaweed, organização responsável pela morte - até o momento - de cerca de 300 mil negros não-muçulmanos desde 2003 em Darfur, no Sudão. Segundo a ONG britânica Oxfam, mil pessoas são forçadas a abandonar suas casas a cada mês. Mesmo assim, dos 26 mil soldados das forças de paz da ONU previstos para combater a violência na região, apenas um terço foi enviado.

E nenhum país se opõe de fato ao massacre diário em Darfur. Pelo contrário. Afinal, ninguém quer deixar de comerciar com a China ou abre mão de estreitar laços com o Irã. Os discursos são sempre vazios quando se trata de evitar mais um massacre no continente. A cada dia, fica claro que o mundo se lembra da África apenas quando se trata de admirar rostos tristes e sofridos na capa da National Geographic. Biafra, Somália, Ruanda, Serra Leoa, Sudão, Congo e tantos outros são simplesmente nomes de tragédias que o mundo fez muito pouco para evitar.

Abaixo, a reportagem mostra que muitos civis têm atacado os comboios da ONU demonstrando revolta pelo que consideram descaso das Nações Unidas com o genocídio iminente. A ONU argumenta que o papel das Forças de Paz é apenas o de tentar proteger civis, e não se envolver em conflitos diretos com os rebeldes.