Notícia publicada hoje no The New York Times informa que cinco soldados da Blackwater aceitaram se render às autoridades americanas. Eles são acusados pela morte de 17 civis iraquianos, num tiroteio em Bagdá, em 2007. Tudo isso pode parecer muito estranho. E é mesmo.
Nem todo mundo sabe o que é a Blackwater. Portanto, vale uma breve descrição. Trata-se de uma empresa privada - propriedade de Erik Prince, ex-fuzileiro naval dos Estados Unidos - contratada para prestar serviços de segurança no Iraque e no Afeganistão. Pode também parecer estranho - e novamente, é mesmo -, mas é um exército privado. E, mais curioso ainda, ela não é a única força militar particular a atuar especificamente no Iraque: DynCorp International e Triple Canopy, americanas, e Aegis, britânica, também não são parte do corpo estatal dos dois países. Além delas, outras 25 firmas de segurança particulares estão presentes no Iraque.
A Blackwater, entretanto, é a maior delas. É difícil precisar quantos soldados-funcionários a empresa mantém, mas, segundo relatório do Serviço de Pesquisa do Congresso Americano (CSA, em inglês), é possível que o total de empregados trabalhando sob contratos firmados com o governo dos EUA chegue a 180 mil pessoas.
As acusações que pesam sobre a empresa são graves, até porque, durante o episódio que causou a morte dos 17 iraquianos, os soldados teriam atirado uma granada num colégio para meninas.
O caso, entretanto, é ainda mais controverso porque envolve um grande debate sobre o controle governamental de tropas particulares. Por exemplo, até outubro do ano passado, os funcionários da Blackwater eram privilegiados com imunidade no Iraque. Em casos de crimes como o que está sendo julgado agora, simplesmente retornavam para os Estados Unidos com a certeza da impunidade.
Somente em agosto deste ano, o ex-combatente José Luis Nazario Jr. foi o primeiro membro da empresa a ser julgado pelo assassinato de prisioneiros na cidade de Fallujah, em 2004. Diante de um tribunal civil de Riverside, na Califórnia - ele não podia ser julgado como um militar americano, afinal de contas não era parte das forças oficiais dos Estados Unidos -, foi absolvido de todas as acusações.
Além disso, a atuação dessas empresas na Guerra contra o Terror levanta novo debate acerca dos contratos firmados entre o governo Bush e parceiros da iniciativa privada. No caso específico da Blackwater, que atua no Oriente Médio desde o início da empreitada americana em 2001, a parceria foi renovada por mais um ano no último mês de abril.
A questão é tão polêmica que nem para o corpo governamental americano está claro se o Estado deve ou não confiar nas empresas de segurança privadas. O FBI é o responsável pela investigação dos assassinatos cometidos pelos soldados-funcionários. O próprio Congresso americano criou um comitê específico para investigar os contratos firmados pelo presidente Bush para atuação de empresas americanas no exterior, e, especificamente, sua relação com a Blackwater.
As conclusões são reveladoras. Alguns números importantes: a empresa esteve envolvida em pelo menos 195 episódios violentos no Iraque desde 2005; um soldado da Blackwater custa ao Estado 1.222 dólares por dia, e o valor anual chega a 445 mil dólares - mais de seis vezes o custo de um soldado regular do exército americano; de 2001 a 2006, a Blackwater recebeu mais de 1 bilhão de dólares em contratos federais, inclusive mais de 832 milhões de dólares em dois contratos com o Departamento de Estado.
A relação entre a administração Bush e a empresa é bastante próxima, como mostra o estudo: a primeira parceria entre o governo e Erik Prince rendeu aos cofres da Blackwater, em 2001, pouco mais de 736 mil dólares. Num crescimento absurdo, o contrato assinado entre as partes, em 2006, chegou à casa de 1 bilhão de dólares. Em um período de somente cinco anos, a empresa teve um aumento no valor dos contratos firmado com a Casa Branca superior a 80 mil porcento.
A amizade entre a família Bush e os Prince talvez explique de certa maneira os benefícios concedidos à Blackwater. O estudo do Congresso chega a essa conclusão:
"No final dos anos 1980, Erik Prince foi estagiário da Casa Branca durante a gestão de George H.W. Bush (o pai do atual presidente). O pai de Prince era um proeminente homem de negócios de Michigan e um doador (de dinheiro) para causas conservadoras. A irmã de Prince, Betsy DeVos, foi negociadora do Partido Republicano de Michigan e ganhou o título de "pioneira" da campanha da chapa Bush-Cheney por angariar 100 mil dólares em fundos para a campanha presidencial de George W. Bush em 2004. Seu marido, Richard DeVos, é um ex-CEO da Amway e, em 2006, foi o candidato do Partido Republicano ao governo de Michigan. O próprio Erik Prince é doador financeiro do partido - foram 225 mil dólares em doações de dinheiro, sendo mais de 160 mil dólares para o Comitê Nacional Republicano e para o Comitê Nacional do Congresso Republicano".
Para ler o relatório completo, clique aqui
segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
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